Baixas taxas de gestão, independência
e déficits inexistentes: esse é o estilo de investimento dos fundos de pensão
canadenses. Tamanho sucesso é o que almejam muitos fundos públicos americanos.
O modelo faz com que os maiores fundos
canadenses se afastem da dívida pública em busca por maiores retornos. A
estratégia os levou a assumir uma posição de liderança em negociações
empresariais globais, infraestrutura e ativos imobiliários dos mais variados
tipos.
O Canadá permite que os fundos de
pensão invistam da forma como acharem mais adequada. Normalmente, as entidades
encontram-se livres da interferência política e de sindicatos. Elas tendem a
olhar para horizontes de longuíssimo prazo. Os salários dos dirigentes de
fundos de pensão, por sua vez, assemelham-se ao de banqueiros ao invés de
burocratas. Mas o que mais chama a atenção é a maneira como os fundos de pensão
veem a si mesmos.
“Não somos um plano de pensão”, afirma
Mark Wiseman, presidente e CEO do Canada
Pension Plan Investment Board, plano público de filiação obrigatória que
gerencia ativos da ordem de 234 bilhões de dólares canadenses. “Somos uma
empresa de gestão de ativos, uma firma de investimento.”
No mês passado, um grupo liderado pelo
braço imobiliário do Caisse de Dépôt et
Placement du Québec, entidade responsável pela gestão de benefícios dos
servidores públicos daquela província, comprou uma torre de escritórios em
Manhattan do Blackstone Group numa
negociação privada que envolveu US$ 2,25 bilhões. O fundo já havia pago US$280
milhões por dois prédios comerciais na cidade americana de Seattle.
Há apenas um ano, Wiseman conduziu uma
negociação bem sucedida de US$ 6 bilhões que levou à compra das lojas de
departamento de luxo Neiman Marcus e Bergdorf Goodman. O hotel Fairmont Banff Springs, em Alberta, é de
propriedade do Omers, o plano de pensão dos funcionários públicos de Ontário.
Trata-se de uma abordagem que vem
gerando retornos sólidos. O Ontario
Teachers’ Pension Plan, fundo que gerencia CAN$140 bilhões em investimentos
e ao qual se atribui o desenho do modelo canadense de investir, possui um
superávit de 5 bilhões. O fundo vem obtendo retornos anuais médios de 10,2% nos
últimos 24 anos.
“Os professores, a província, o
presidente do conselho e o CEO concordaram em administrar o fundo como se fosse
um negócio”, explica Ron Mock, presidente do “Teachers”, como o plano é conhecido. “Fomos feitos para o sucesso.”
Segundo Mock, em 2014, os investimentos do Teachers
contribuirão com 76 centavos para cada dólar depositado no fundo; os 24
centavos restantes foram divididos entre governo e participantes.
Embora haja consenso acerca do sucesso
do modelo canadense de investimentos diretos, a sua introdução em outros países
pode ser tarefa difícil. Em 2011, o prefeito de Nova York, Michael R.
Bloomberg, foi impedido de unir cinco fundos de pensão de professores
justamente na tentativa de implantar, no município, um sistema ao estilo
canadense.
Keith Ambachtsheer, que no ano passado
se aposentou como diretor do Rotman
International Centre for Pension Management da Universidade de Toronto, fez
parte de um grupo formado pelo governo de Ontário, no final da década de 80,
para reformar os planos de pensão dos professores. A chave para fazer com que o
novo sistema funcionasse, afirma Ambachtsheer, foi o seguinte acordo: os
candidatos à diretoria do plano seriam indicados pelos sindicatos da categoria
e governo, mas escolhidos com base em seus conhecimentos sobre finanças.
A prática continua. “Não somos uma
organização com um conselho formado por leigos”, ressalta o presidente Mock.
“Não temos amadores no colegiado.”
Outro fator preponderante para o
sucesso do fundo foi a decisão de evitar gastos desnecessários com a
terceirização de investimentos para as chamadas “boutiques” de private equity ou hedge funds, por exemplo. Como resultado, o “Teachers” acabou acumulando expertise internamente. Isso, por outro
lado, significa que o fundo deve estar disposto a dispender milhões de dólares
na remuneração de seus executivos.
Ashby Monk, diretor executivo do
Centro de Projetos Globais da Universidade de Stanford, fiz que os salários
pagos por muitos fundos fora do Canadá são limitados por lei. “Eles fixam
valores baixos para os salários dos empregados e ignoram que aqueles mesmos
empregados acabaram de assinar um cheque de US$ 100 milhões para um gestor de Wall Street.”
Wiseman estima que os custos anuais
com a terceirização de um investimento em infraestrutura de $10 bilhões, por
exemplo, é de pelo menos $200 milhões. Em contrapartida, afirma, a equipe
interna de infraestrutura do Canada
Pension Plan, que possui escritórios espalhados pelo mundo, pode cumprir a
tarefa por $51 milhões.
Num país onde os salários do setor
público são monitorados de perto, a ideia de gestores de fundos de pensão com
altos salários não foi bem aceita inicialmente. Mas o sucesso do “Teachers” fez com que o assunto deixasse
de ser um problema para os seguidores do modelo.
A fim de atrair novos talentos, a
maioria dos fundos canadenses oferece salários superiores àqueles ofertados
pelas firmas de investimento de Wall
Street. No entanto, a prática não se mantém para os executivos sênior. No
ano passado, Jim Leech, que se aposentou como presidente e CEO do Teachers, recebeu um total de CAN$8,5
milhões. Apesar de se tratar de um valor estratosférico para os padrões das
empresas públicas canadenses, o montante representa apenas uma pequena parte da
renda anual dos executivos sênior, em especial dos fundos de private equity, de Wall Street.
Wiseman afirma que o Canada Pension Plan Investment Board e outros
fundos canadenses possuem outros atrativos. Ao trabalhar para o fundo, os
principais executivos ficam livres da disputa por capital, focando-se
exclusivamente nos investimentos. O tamanho e alcance global do fundo são
bastante sedutores, advoga.
Wiseman diz que o que mais o
surpreendeu foi a proposta do fundo: pagar benefícios previdenciários para
cidadãos canadenses que não residam na província de Quebec (cuja
responsabilidade pelo provimento de pensões recai sobre a Caisse). “Eles têm orgulho de investir e fazer dinheiro com vistas
a um propósito nobre, não apenas para um acionista ‘sem nome’ ou para um
investidor, que já é rico, ficar ainda mais rico. Para a maioria dos
investidores, o trabalho é meio vazio.”
Com exceção da Caisse, que tem como missão desenvolver a economia de Quebec e
gerar retornos, nenhum dos grandes fundos de pensão canadenses é utilizado como
engrenagem econômica, realizando a maior parte dos seus investimentos em terras
estrangeiras.
“Os
fundos canadenses têm horror a essa ideia (de investir internamente)”, declara
Monk, que já foi consultor da Alberta
Investment Management Corp. Embora isso traga a vantagem de minimizar os
investimentos que sofrem influência política, argumenta, tal comportamento por
vezes impede que as entidades aproveitem boas oportunidades no país. Os fundos
que investem em projetos de desenvolvimento na África do Sul e Cingapura têm,
na maioria das vezes, obtido um desempenho superior aos demais.
Wiseman e Mock reconhecem que
encontrar investimentos num mundo onde há dinheiro de sobra é tarefa cada vez
mais difícil. Mas eles também admitem que o seu horizonte de longo prazo
(alguns fundos canadenses enxergam na infraestrutura prazos de 50 a 70 anos) e
magnitude lhes conferem algumas vantagens competitivas. “Em áreas como
infraestrutura, de fato há mais competição por contratos
de $1 bilhão”, revela Wiseman. “Mas nós temos capacidade para fechar acordos de
3 bilhões.”
Política e história, afirma
Ambachtsheer, tornam mais difícil a tarefa de adotar um sistema previdenciário
parecido com o canadense, a exemplo do que vem fazendo a Noruega. No Canadá,
alerta o especialista, o maior risco é o excesso de complacência em função do
sucesso do sistema. “Não podemos nos tornar exageradamente presunçosos; afinal,
qualquer estratégia pode falhar em determinado momento.”
Fonte: The New York Times
The New York Times