O PERIGO DOS INVESTIMENTOS PÚBLICOS


Os bancos centrais tomaram as rédeas da elaboração das políticas públicas. Cabe a essas instituições reduzir as taxas de juros e mantê-las em patamares baixos, preservar a estabilidade dos mercados e comprar montantes elevados de dívida pública a fim de ajudar os países a se recuperarem da recessão. Agora, parece que se tornaram importantes, também, para a compra de estoques de ações a fim de compensar os baixos retornos obtidos pelas enormes reservas adquiridas em moeda estrangeira.

O problema é que os bancos centrais podem estar exagerando na dose. Jens Weidmann, presidente do alemão Bundesbank, comenta a necessidade das instituições “abrirem mão do papel de tomadores de decisão para voltar às suas atividades normais”. Em sua opinião, isso ajudaria a preservar a sua independência, condição primordial manter a estabilidade dos preços em longo prazo.

As reservas em moeda estrangeira dos bancos centrais cresceram rapidamente nos últimos anos, especialmente nos países em desenvolvimento. As mesmas autoridades responsáveis pela manutenção da estabilidade fiscal são frequentemente donas de fundos volumosos, além de responsáveis pelo aumento da liquidez de muitos mercados, aumentando, assim, o risco de superaquecimento dos preços dos ativos.

Dados sobre a compra de ações por bancos centrais e outros investidores da esfera pública foram levantados por uma ampla pesquisa realizada pelo Fórum de Instituições Financeiras e Monetárias Oficiais (Official Monetary and Financial Institutions Forum - OMFIF). Lançada em 17 de junho, a pesquisa Global Public Investor (GPI) 2014 é a primeira a abranger aproximadamente US$29,1 trilhões em investimentos realizados por 400 instituições públicas em 162 países, incluindo 157 bancos centrais, 156 fundos de pensão públicos e 87 fundos soberanos, que juntos detém ativos equivalentes a 40% da produção mundial. 

Os ativos desses investidores totalizam US$13,2 trilhões (incluindo ouro) mantidos por bancos centrais; US$9,4 trilhões por fundos de pensão públicos e US$6,5 trilhões por fundos soberanos.

Após a crise financeira mundial, fundos de pensão públicos e fundos soberanos tornaram-se grandes detentores de ações de empresas em mercados internacionais. O exemplo mais conhecido é o do fundo soberano norueguês, o Norges Bank Investment Management (NBIM), com US$ 880 bilhões sob gestão. Desse total, mais de 60% são investidos em ações. O fundo possui, em média, 1,3% de cada companhia listada no mundo.

Outro investidor de magnitude comparável é o China's State Administration of Foreign Exchange (SAFE), braço do Banco Popular Chinês e o maior investidor público do mundo, com US$ 3,9 trilhões sob gestão, superando o Banco do Japão e o fundo de pensão do governo japonês (Japan's Government Pension Investment Fund - GPIF), cada qual com US$1,3 trilhões em patrimônio.

Outro grande detentor de ações da esfera pública é o Banco Nacional da Suíça (Swiss National Bank), com US$ 480 bilhões sob gestão. No final de 2013, o banco suíço possuía 15% dos seus ativos estrangeiros - ou US$ 72 bilhões - em ações.

Os bancos centrais vêm tentando compensar as perdas acarretadas pela drástica redução das taxas de juros promovida por órgãos oficiais para reparar os danos da crise financeira. De acordo com os cálculos do OMFIF, em anos recentes, os bancos centrais ao redor do mundo perderam entre US$ 200 bi e US$ 250 bi em função da queda da rentabilidade dos títulos públicos. Nesse contexto, os investidores públicos acumularam investimentos em ações listadas em bolsa que chegam a US$ 1 trilhão, evidenciando, assim, uma tendência aparentemente irreversível.  

Essas mudanças têm implicações importantes para a gestão pública de ativos. Embora os fundos soberanos tenham adotado os chamados ‘Princípios de Santiago’, que privilegiam a transparência, os bancos centrais ainda não aderiram a nenhum código dessa natureza.

Edwin ‘Ted’ Truman, ex-assessor sênior do Federal Reserve Bank estadunidense e atual pesquisador do Peterson Institute for International Economics, faz a seguinte observação no relatório GPI 2014: “Uma das atribuições mais importantes do governo é a gestão dos ativos internacionais do país. Reformas urgentes se fazem necessárias a fim de se garantir a transparência e a devida atribuição de responsabilidades nas esfera nacional e internacional no que diz respeito ao exercício dessa atividade a fim de que se tenha uma economia mundial com melhor funcionamento.”

O presente artigo foi escrito por David Marsh, diretor gerente e fundador do Fórum  de Instituições Monetárias e Financeiras Oficiais, com sede em Londres.



USA today
Tel: 11 5044-4774/11 5531-2118 | suporte@suporteconsult.com.br