Em sua coluna, o
jornalista Elio Gaspari diz que a Terra dos Papagaios se tornou desinteressante
para quem está aqui.
À primeira vista, o braço brasileiro da empresa americana RR Donnelley decidiu falir,
prejudicando o cronograma da impressão das provas do Enem. Se esse fosse o problema, seria
pontual. É mais que isso.
Essa multinacional
fatura US$ 6,8 bilhões e opera em 28 países. O silêncio de seus executivos, a
intimidade que ela tinha com os educatecas do MEC y otras cositas más deixam no
ar perguntas para que se saiba como funcionava essa operação, mas o fato é
que ela quer ir embora.
A primeira vítima
da falência será o chão da fábrica, onde estão os direitos trabalhistas de seus
mil empregados. A falência teve o beneplácito da matriz americana, que
certamente terá algo a dizer sobre o assunto. Nos Estados Unidos, ela não se
comportaria como se comportou no Brasil.
Antes da Donnelley, a Ford fechou sua fábrica de São Bernardo, a
CVS (maior rede de farmácias dos Estados Unidos) fez as malas, a rede francesa
de livrarias Fnac pagou para sair do Brasil,
o Citibank vendeu-se ao Itaú e o HSBC vendeu-se ao Bradesco. Isso tudo não
aconteceu de uma hora para outra, mas o movimento começou em 2015.
Em muitos casos as
empresas foram embora porque vieram com falsas expectativas e em outros porque
suas operações foram mal administradas. Em dois deles, o da RR Donnelley e da CVS,
porque também se enroscaram em litígios judiciais. Em quase todos, não
conseguiram operar pelas regras e costumes do capitalismo mambembe brasileiro.
Numa época em que
as economias no mundo se integram, a Terra dos Papagaios não só perdeu
atrativos para quem investe na produção como tornou-se desinteressante para
quem está aqui. Para a turma do papelório eletrônico, continua a ser um
paraíso.
Desde que os
franceses vieram pegar pau brasil e papagaios na costa da Terra de
Santa Cruz o ufanismo nacional cultiva a ideia segundo a qual os
estrangeiros querem vir para cá. Às vezes querem, mas há épocas em que preferem
sair.
Faz tempo, quando
se falava em abrir o mercado nacional, importadoras de carros abriram filiais
brasileiras. A Aston Martin (o carro de James Bond) veio e houve um ano em que
vendeu apenas duas peças. Azar o delas, mas algumas tentaram
construir fábricas e desistiram.
Enquanto a
discussão ficava em torno do vem-não-vem, ela era uma. Quando quem veio se
vai, ela deve ser outra.
FOLHA DE SÃO PAULO