Cultura
estatal é origem da atual crise do IRB, afirmam especialistas
Papéis da resseguradora caíram 16,17%
nesta quinta, maior queda do Ibovespa.
A
falta de transparência e a inabilidade na relação com investidores foram os
fatores que geraram a crise reputacional pela qual o IRB passa atualmente,
afirmam analistas.
Segundo
eles, tais questões se assemelham uma cultura estatal, inerente a empresas que
eram controladas pelo governo e que não melhoraram suas práticas durante o processo de abertura de capital.
Só
nesta quinta-feira (5), foram a maior queda do Ibovespa, com recuo de
16,17%, cotada em R$ 15,97. No ano, as ações registram retração de 59%.
Um executivo do mercado de capitais afirmou que o
mercado ficou negativamente impressionado com a empresa desde o começo de
fevereiro.
Na época, a gestora Squadra publicou duas cartas
afirmando que o IRB estaria publicando, em seus resultados, lucros recorrentes
inferiores aos contábeis.
Pouco tempo depois, no final do mês, o então
presidente do conselho de administração da resseguradora, Ivan Monteiro,
renunciou ao cargo.
A desconfiança do mercado aumentou quando, na
semana passada, saiu notícia no mercado de que o presidente e o vice-presidente
financeiro do IRB supostamente teriam passado informações erradas para a
imprensa e para analistas de que a Berkshire Hathaway, holding de investimentos
do megainvestidor Warren Buffet, teria triplicado sua posição na resseguradora.
A oscilação nos papéis decorrente dessa notícia,
fizeram com que a própria holding soltasse um comunicado negando a participação
no IRB. Como consequência, as ações do IRB derreteram.
O executivo do mercado de capitais afirmou, ainda,
que grande parte da percepção dos investidores foi de que, apesar da venda da
participação majoritária do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal no ano
passado, o IRB ainda tem uma cultura estatal, e isso teria levado à crise que a
companhia enfrenta desde fevereiro.
Caixa vendeu a sua fatia de 8,9% em fevereiro de
2019 e o Banco do Brasil se desfez da sua, de 15,2%, em julho.
Segundo o analista da Guide Investimentos Henrique
Esteter, existem estatais com gestões eficientes e é difícil generalizar, mas
as más escolhas do IRB foram sentidas pelo mercado.
“Não é nem uma falta de transparência, mas é uma
falta de verdade”, afirma.
Mesmo entre os próprios funcionários da resseguradora,
a percepção é que os bancos públicos continuam sendo o veículo de controle
estatal na empresa, que foi privatizada em 2013.
"A privatização nós mesmos às vezes colocamos
entre aspas", diz o presidente do Sintres (Sindicato dos Trabalhadores em
Resseguros do Estado do Rio de Janeiro), Carlos Alberto Cruz.
Ele ressalta que, embora os maiores acionistas seja
bancos privados, o governo federal sempre manteve influência por meio da
escolha de executivos e membros do conselho de administração.
Para substituir Ivan Monteiro, egresso do Banco do
Brasil, na presidência do conselho – ele deixou o cargo em fevereiro alegando
questões de saúde –, foi escolhido o presidente da Caixa, Pedro Guimarães.
No lugar de José Carlos Cardoso, então presidente
da companhia, e de Fernando Passos, vice-presidente financeiro, está Werner Süffert,
da BB Seguridade.
Cardoso e Passos renunciaram nesta quarta (4) após
as notícias de que teriam passado informações erradas sobre a participação da
Berkshire Hathaway no IRB.
O novo comando do IRB anunciou nesta quinta-feira
(5) que não descarta
revisar as projeções da companhia para 2020 e que acabou com os
bônus por valorização da ação a executivos.
Afirmou também que vai investigar
as circunstâncias exatas da divulgação de informações relativas à sua base
acionária pela companhia.
Para Esteter, da Guide, a escolha dos executivos
está mais ligada ao nome de peso que carregam no mercado segurador do que
necessariamente relacionada à empresa de onde vieram.
“Para que a confiança na empresa volte, são
necessários nomes conhecidos pelo mercado, que tenham passado por grandes
empresas e que se demonstrem fidedignas ao cargo.
E o conselho sabe disso. Será
preciso alguém capacitado para a retomada dos papéis do IRB”, disse.
O analista da Planner Corretora Victor Martins,
afirma que, de qualquer forma, a empresa foi penalizada pela sua falta de
transparência.
“Se a mensagem [da teleconferência desta
quinta-feira] foi passada, ou ela não foi plenamente entendida pelo mercado ou
ainda há uma desconfiança inerente dos últimos acontecimentos.
IRB ainda
precisa recuperar a credibilidade e não é algo que será fácil ou rápido”,
afirma.
FOLHA DE SÃO PAULO