Enquanto o debate sobre
uma reforma do sistema de previdência social no País não aponta um desenho
claro, as empresas patrocinadoras de planos previdenciários fechados, em
especial aquelas com estrutura multinacional, aproveitam o momento para
discutir os modelos de planos que adotaram nos anos 80, sua funcionalidade e eficiência.
A discussão sobre longevidade e as mudanças na realidade da população jovem
ganha espaço cada vez maior. De modo geral, a conclusão é de que esses planos,
assim como os novos que vierem a ser patrocinados, precisam passar por uma
revisão profunda em seus conceitos. Um olhar mais abrangente e inovação estão
na ordem do dia, ao lado da expectativa que existe no sentido de que a
implantação do mecanismo da “adesão automática”, já em análise no Conselho
Nacional de Previdência Complementar, (CNPC) aconteça logo.
A oferta de planos
previdenciários precisa ser vista por todos, a começar pelo regulador, como um
mecanismo de formação de patrimônio para os trabalhadores. “Essa é uma
discussão que temos visto crescer na atual conjuntura brasileira, as empresas já
identificam a importância de rever conceitos de modo a tornar seus planos
atrativos para as novas gerações de trabalhadores”, explica o consultor de
Previdência da Mercer, Mauro Machado Pereira. Caso nada seja feito, a conta não
vai fechar para essas patrocinadoras porque elas perderão os participantes mais
jovens.
Baixa aderência - A nova
configuração dos planos fechados é um tema mais relevante hoje no
Brasil para as empresas e aqueles que percebem a importância para o País da
formação de uma robusta poupança previdenciária do que os eventuais impactos de
uma mudança no sistema público de previdência, diz o consultor, até porque a
maior parte das entidades já não tem mais relação direta com os benefícios
pagos pelo INSS. Nas discussões que tem promovido com as empresas, a
consultoria detecta forte demanda por mudanças, até porque num cenário de crise
econômica, a questão do funding para custear os planos fica mais complexa.
“Estamos fazendo um
check-up dos planos criados lá atrás para avaliar sua aderência à atual
realidade e saber se eles levam em conta as questões demográficas”. A
primeira conclusão é a de que essa aderência é fraca em relação à nova
realidade de benefícios demandados pela população. “E quanto mais as gerações
avançam, menos aderentes somos”, aponta Mauro.
A preocupação com a
inovação e o fomento do sistema está clara inclusive no Planejamento
Estratégico elaborado pelo sistema ABRAPP/SINDAPP/ICSS/UNIABRAPP para o período
de 2017/2019. O trabalho reuniu dirigentes das quatro entidades no início de
2017 durante debate que apontou os caminhos a serem trilhados para ampliar a
aderência dos planos oferecidos à nova realidade brasileira. Na base desse
esforço, está o estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre)
da Fundação Getúlio Vargas, que trouxe um diagnóstico detahado da previdência
complementar e do mercado de trabalho brasileiro. Sua principal diretriz aponta
a necessidade de ter um sistema que ajude o país a poupar mais e melhor para o
futuro, conforme explica o economista que coordenou o estudo, o professor José
Roberto Affonso.
Na avaliação do presidente
da Abrapp, Luís Ricardo Marcondes Martins, o sistema precisa se reinventar
frente aos novos desafios colocados pelo mercado. "Para isso, será
fundamental o engajamento de todos os agentes envolvidos com a previdência
complementar fechada em relação ao fomento". As discussões que resultaram
no Planejamento Estratégico, diz o presidente, deixaram clara a importância
desse engajamento e do compromisso de todos com o fomento. Ele lembra que as
entidades têm características bastante diversificadas, com diferentes portes e
graus de complexidade mas, mesmo nesse ambiente heterogêneo, a capacidade de
ativismo e o engajamento das lideranças tem avançado de modo surpreendente.
Para o presidente do
Conselho Deliberativo da Abrapp, Gueitiro Matsuo Genso, é essencial o trabalho
que a Associação vem desenvolvendo junto aos poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, assim como à sociedade civil, para divulgar a importância da previdência
complementar fechada para o desenvolvimento do país e a necessidade de
empreender ações que levem ao seu fortalecimento. No momento em que se debate o
modelo da previdência brasileira, "será fundamental que o sistema
complementar fechado integre essa discussão com a profundidade e a amplitude
que o assunto requer", afirma o presidente do Conselho.
Saúde em foco - Dos anos 80 para cá, a
corrida do sistema de previdência complementar fechada para a modelagem de
Contribuição Definida, ao compartilhar o risco com os empregados, produziu uma
situação em que os participantes com menor estrutura para decidir sobre temas
financeiros e previdenciários poderão vir a ter alguma dificuldade no futuro.
Questões ligadas à maior expectativa de vida e ao custeio da assistência à
saúde lideram as preocupações nesse sentido. A propósito, não é outra razão
pela qual a Abrapp vem insistindo na proposta do que muitos chamam de
“Prev-Saúde”, um plano administrado à parte pelas entidades no intuito de
acumular poupança que irá servir lá na frente para custear o plano de saúde.

O diagnóstico indica que
dentro de quinze anos, quando a população idosa brasileira superar a faixa
etária mais jovem, o país entrará no padrão demográfico próximo ao europeu.
“Daqui até lá, entretanto, não há sinais de mudanças na estrutura de renda da
população, nem tampouco solução para as lacunas educacionais que afetam a
colocação dos brasileiros no mercado de trabalho”, diz Mauro Pereira. Como
resultado, observa o consultor, corremos o risco de ser apenas “europeus
pobres” no que diz respeito à previdência e à saúde.
As soluções passam por
mecanismos intermediários entre várias saídas possíveis. “As empresas ainda não
viram a luz no fim do túnel da crise, mas talvez estejam um pouco menos
pessimistas em relação à conjuntura, então o momento é de grande discussão sobre
o produto previdência”. O objetivo é estar à frente dessa transformação e ir
além das avaliações de curtíssimo prazo.
Olhar abrangente - Entre as principais
dificuldades das empresas nesse sentido está a complexidade da regulação, ou
seja, seria necessário contar com regras mais ágeis inclusive para a abertura
dos planos. O compartilhamento de riscos com as seguradoras é outro
aspecto central na nova configuração. “É preciso avançar nesse
sentido, criar uma renda para garantir que a classe média tenha melhores
condições de vida no futuro e não use sua aposentadoria apenas para pagar os
gastos com saúde”, diz o consultor. “Está na hora de ter uma discussão franca
sobre o papel dos planos fechados porque usá-los apenas para pagar a
assistência médica não foi o objetivo a que as empresas patrocinadoras se
propuseram lá atrás”.
Também será essencial
criar um novo desenho que abra a possibilidade de resgates parciais sobre as
contribuições adicionais feitas pelos participantes. “Os trabalhadores de
trinta anos de idade não pensam que irão envelhecer um dia, eles são bons na
análise financeira e nos resultados a curto prazo de suas aplicações”. Será
preciso também adotar uma política de investimentos mais arrojada para os mais
jovens, para essas pessoas não faz sentido dizer que um plano que aplica 30% em
renda variável é “arrojado”, essa lógica é incompreensível para eles”, observa
o consultor.
O que significa que o
governo precisará ter um olhar mais macro para as normas do sistema fechado de
previdência, que tem uma enorma capacidade de geração de poupança interna, e
permitir modelos que estimulem os jovens a fazer poupança previdenciária. “Nos
EUA, o conceito ligado à previdência já é muito mais de patrimônio do que de
aposentadoria uma vez que, para as gerações mais novas, a capacidade de
capitalização é mais importante do que o benefício em si”. Com essa
transformação de conceitos, a previdência fechada passará a ser compreendida
como uma ferramenta mais robusta de poupança do que as pessoas encontram
no sistema bancário, até porque o sistema fechado tem altíssimo nível de
governança.
Volta à prancheta – A ideia é fazer da
previdência privada fechada uma efetiva ferramenta complementar de
capitalização. “Estamos de volta à prancheta para rever o que foi desenhado nos
anos 80, melhorar o que já está andando e criar novas possibilidades. Temos
observado que as empresas já estão fazendo ajustes”. O resgate parcial é
um elemento vital nessa mudança, ate porque os trabalhadores jovens não
conseguem imaginar ficar dez anos sem poder resgatar seus recursos.
Como exemplo, Machado cita
uma patrocinadora dos EUA que mantém plano para seus funcionários no Brasil. A
empresa criou um modelo de contribuições adicionais ligadas à remuneração
variável de seus empregados e ela também contribui com um percentual sobre esses
recursos. As regras de resgate são mais flexíveis para esses recursos,
restritas porém às exigências normativas, e o acesso a esse dinheiro é dosado
ao longo do tempo, desacelerando gradualmente de modo a desestimular saques
muito cedo. “Seria interessante que as regras de resgate fossem flexibilizadas
para todos, até porque esse mecanismo não descapitaliza o plano mas, ao
contrário, ajuda a atrair jovens trabalhadores”.
Para as patrocinadoras, é importante também rever aspectos de governança
de modo a definir quem paga a estrutura do plano e quais os resultados trazidos
pelas despesas administrativas. “Além disso, há também muito interesse por
novas fórmulas de comunicação, o custo das diversas ferramentas de tecnologia e
seus benefícios. “As empresas querem aproveitar o atual momento para descobrir
se a estrutura que está sendo montada vai ajuda-las a perenizar os benefícios
oferecidos”
Diário dos Fundos de Pensão