A pandemia já acabou?
Essa mania de
tratar tudo como 8 ou 80 continua atrapalhando.
O planeta já
convive com a Covid-19 há 27 meses. Só no Brasil, já são dois anos de pandemia.
E mesmo assim parece que ainda não aprendemos algumas coisas básicas.
Talvez a
principal delas seja que, diferentemente da estupidez política que hoje ergue
um muro entre as pessoas no Brasil, a pandemia não vive de respostas
definitivas, que não se modificam com o tempo.
Essa mania de tratar tudo como 8
ou 80 continua atrapalhando.
Tomemos por exemplo
a polêmica sobre o uso de máscaras.
Discutir a retirada da obrigatoriedade de
uso de máscaras em ambientes abertos é relevante
agora, mas não era oportuno nos primeiros meses da pandemia. Por que a mudança?
Lá no início, ainda estávamos desvendando as formas de contágio, a curva de
casos e óbitos era ascendente e precisávamos, por questões pedagógicas,
habituar à população ao uso das máscaras.
Hoje, vivemos um novo momento e não
vejo como absurda a retirada da obrigatoriedade em ambientes abertos: na
Califórnia, onde residi por 6 meses, não há obrigatoriedade de uso das máscaras
em ambientes abertos já há um bom tempo.
Quando falamos em
vacinas, é mais ou menos a mesma coisa.
Com exceção de alguns lunáticos que
seguem chamando a vacina de experimental e torcendo para que as pessoas
vacinadas tenham efeitos adversos, não existe mais polêmica sobre a importância
da vacina.
No entanto, é nos detalhes que estamos errando.
A insistência em
contar as doses facilita a disseminação do falso discurso de que a vacina não
está funcionando.
Além disso, a falsa percepção de que a pandemia já acabou faz
com que algumas pessoas baixem a guarda e deixem de tomar as doses necessárias
para manter a proteção contra a Covid-19.
Por isso, o título
da pandemia de hoje é: "A pandemia já acabou?"
Inicialmente,
preciso dizer que, pessoalmente, eu adoraria dizer que sim. Todas as pessoas
que eu conheço e amo estão cansadas, querendo voltar a sua vida normal.
No
entanto, profissionalmente, eu tenho a obrigação de dizer a verdade. E a
verdade é que a pandemia não acabou, nem no Brasil e muito menos no mundo.
Alguns países ainda enfrentam barreiras à ampla vacinação da população e o
surgimento recorrente de novas variantes adia seguidamente o final da pandemia.
A pandemia não terminará porque os políticos
assim o querem para alimentarem seus projetos de poder.
E, infelizmente, já
descobrimos que não podemos contar com eles para nos protegerem nesse momento
em que a prioridade são as eleições de 2022.
Portanto, cabe a nós mantermos a
responsabilidade para evitar que a situação piore e para que o fim da pandemia
chegue logo.
Precisamos derrubar os muros e falar
responsavelmente sobre o estágio atual da pandemia.
Nesse estágio, a
recomendação não é para que as pessoas fiquem em casa.
A recomendação é para
que as pessoas se mantenham em dia com a vacinação, mantenham o uso de máscaras em ambientes fechados e mantenham suas medidas de higiene
—especialmente mantendo as mãos limpas.
PEDRO HALLAL - epidemiologista,
professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de
Pelotas e coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre
coronavírus no Brasil.
FOLHA DE SÃO PAULO