Na elite do mercado financeiro brasileiro, a gestora Tarpon é um bicho um tanto
diferente. Fundada há 14 anos por um grupo de jovens liderados pelo administrador
de empresas Zeca Magalhães, a Tarpon foi, aos poucos, criando um modelo de
investimentos único no país. Com o dinheiro que levanta, a gestora faz grandes
apostas em poucas empresas e busca influenciar diretamente na gestão.
Enquanto outros fundos investem em ações de dez ou 15 companhias,
a Tarpon costuma concentrar o dinheiro em três ou quatro. Foi uma estratégia de
inegável sucesso, a ponto de permitir à gestora levantar dinheiro com
investidores de longuíssimo prazo dispostos a esperar mais de uma década para
receber o dinheiro de volta.
Não ter de se preocupar tanto com prazos é um luxo nesse mercado.
Hoje, a Tarpon administra 8 bilhões de reais. Mas esse jeitão, tão
bem-sucedido, enfrenta agora seu maior teste. Fazer apostas pesadas é uma ótima
ideia, desde que essas apostas deem certo.
E, nos últimos anos, na esteira da recessão que abateu a economia
brasileira, tem sido difícil para a Tarpon repetir o sucesso de investimentos
anteriores. Nada menos que 60% do dinheiro da Tarpon está investido em ações da
BRF, a gigante de alimentos que é dona das marcas Sadia e Perdigão. A empresa é
presidida desde 2015 por um dos sócios da gestora, Pedro Faria.
A outra grande aposta da Tarpon, a empresa de educação Somos, vem
sofrendo. Esta é presidida por outro sócio da gestora, Eduardo Mufarej. E, no
ano passado, a Tarpon perdeu 1 bilhão de reais num investimento em ações da
siderúrgica Gerdau. Essa combinação de fatores aumentou o nível de estresse
interno. Dois sócios deixaram a Tarpon em 2016.
Em 2015, sem lucro nos investimentos, a gestora não conseguiu
cobrar taxas de performance — o que deve se repetir neste ano. De 2010 a 2013,
faturou mais de 100 milhões de reais por ano em taxas de performance. A outra
fonte de receita da Tarpon é a taxa de administração que cobra dos cotistas,
que oscila em razão do valor que a gestora administra.
De dezembro de 2015 a junho de 2016, esse total caiu 17%. Uma
tentativa recente de levantar mais dinheiro teve de ser abortada por falta de
demanda. De longe, o maior desafio da Tarpon é fazer a BRF dar certo. O futuro
da gestora nunca dependeu tanto de um único investimento.
Há três anos, a participação na BRF representava 30% do total
investido pela gestora — um patamar que seria considerado alto por muita gente,
mas que era tido como adequado pela Tarpon. Mas ter 60% de seus fundos alocados
num só papel é demais para qualquer um.
Faria e Magalhães lideram um grupo de investidores que inclui o
empresário Abilio Diniz, o GIC, fundo soberano de Singapura, e fundos de pensão,
que pretendia fazer uma revolução na companhia. Os resultados da empresa vinham
bem até meados de 2015, mas desde o final do ano passado começaram a
decepcionar.
No primeiro semestre deste ano, a empresa lucrou apenas 70 milhões
de reais, 92% menos do que no mesmo período de 2015. As ações, que chegaram a
70 reais em setembro, caíram 30% de lá para cá, enquanto o Ibovespa valorizou
30%.
Os analistas apontam como grandes culpados a recessão brasileira,
que reduziu o consumo, e o fato de o preço do milho ter dobrado no primeiro
semestre — esse é um dos grandes custos da companhia, já que o milho é usado em
rações de animais.
O problema é que a BRF vendeu aos investidores a tese de que
estava construindo um negócio concentrado em alimentos processados, menos vulnerável
às oscilações das commodities e, portanto, com mais capacidade de resistir a
eventuais crises. Diante do impacto das oscilações do preço do milho em seu resultado recente,
foi aberto espaço para que a gestão da empresa começasse a ser questionada.
Em reuniões com investidores, os sócios da Tarpon alegam que é
preciso considerar que o comportamento de preços dos grãos neste ano não tem
precedentes históricos. Alguns fundos que investem na empresa ouvidos por EXAME
já questionam se Faria, por ter mais experiência nas finanças do que no varejo,
seria a pessoa mais indicada para comandar a BRF.
Em agosto de 2013, o então presidente, José Antonio Fay, foi
substituído por Cláudio Galeazzi e, no fim do ano passado, o comando foi
passado para Faria, que havia sido testado, com êxito, no comando da área
internacional.
Para os analistas do banco Bradesco, a BRF tem sido vítima de aspectos
cíclicos do negócio e também de “desafios de execução”. “A empresa é
negativamente afetada por constantes trocas de comando”, escreveram num
relatório recente. Em fevereiro, Faria demitiu Flávia Faugéres, que havia sido
contratada um ano e meio antes para tocar toda a operação brasileira.
Exame