Reforma da Previdência é alvo de pleitos por quem
busca regalias. Qual a sua Constituição favorita, leitor?
Eu me divido entre a de 1891, a única
verdadeiramente laica, e a de 1934. Meu flerte com a Carta varguista, confesso,
não tem a mais nobre das motivações. É que ela trazia, entre os direitos e
garantias individuais (art. 113), um dispositivo que concedia imunidade
tributária para jornalistas.
Sim, é isso mesmo
que você leu. O lobby dos jornalistas conseguiu inscrever na Constituição que
representantes da classe não precisariam pagar impostos diretos.
O mecanismo
desaparece na Carta de 1937, mas volta na de 1946. A festa só acabou de verdade
em 1964, quando o governo militar fez aprovar uma emenda constitucional que
reintroduziu o IR para escribas.
Tudo isso foi para
dizer que um bom lobby é essencial para quem pretende andar de carona (“free
ride”) à custa da sociedade. Categorias poderosas, como os advogados,
insuperáveis nessa matéria, conseguem meter na legislação dispositivos que
obrigam o cidadão a utilizar seus serviços mesmo que não desejem. Quem acaba
pagando o preço são os grupos mais pobres, menos organizados e que não
conseguem inspirar compaixão pública.
Faço essas
reflexões porque vivemos um momento em que os lobbies estão a toda,
tentando cavar uma regaliazinha na reforma da Previdência, que entra em fase final na Câmara. Não digo que todos os pleitos são
injustos. Muitos deles parecem razoáveis, se considerarmos as dificuldades
enfrentadas por diversos segmentos sociais.
O problema é que
não podemos raciocinar aqui pela lógica das partes. Precisamos pensar antes no
todo. A reforma da Previdência extrai sua justificativa moral do fato de propor regras universais, que
idealmente igualariam todos os cidadãos, do mais humilde celetista ao mais
abonado servidor público. Cada diferenciação que os parlamentares introduzirem,
mesmo que isoladamente justa, torna a reforma menos defensável.
FOLHA DE SÃO PAULO