Prates e a barbeiragem na
comunicação da Petrobras.
Fala aos investidores gerou um efeito de expectativas em cadeia
Os tuítes disparados na semana
passada por Jean Paul Prates na rede social X (antigo Twitter), declarando que
a orientação para reter os dividendos extraordinários
da Petrobras partiu do governo Lula, soam
como uma tentativa de tirar a sua responsabilidade da crise de credibilidade na
maior empresa petrolífera da América Latina.
"É legítimo que o CA se
posicione orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares
diretos que são os ministros.
Foi exatamente isso o que ocorreu em relação à
decisão sobre os dividendos extraordinários", escreveu na noite da quarta-feira
passada (13).
No dia seguinte, diante de mais
repercussão negativa que colocou o imbróglio em novo patamar, o presidente da
Petrobras usou a mesma rede social: "não há recuo algum nas minhas falas
desta semana".
A barbeiragem na comunicação da
diretoria em torno do pagamento dos dividendos extraordinários começou no Deep
Dive, encontro realizado em Nova York, no dia 30 de janeiro, para aproximar a
companhia dos investidores internacionais e aumentar a transparência junto ao
mercado.
Na página 99 da extensa apresentação em inglês, a empresa
escreveu que a "remuneração dos acionistas segue o mesmo quadro de decisão
desde 2021".
A fala aos investidores gerou um
efeito de expectativas em cadeia.
Prates prometeu o que não
poderia. A governança da estatal, prevista no artigo 29 do estatuto da empresa,
diz que cabe ao CA (Conselho de Administração) a definição sobre as políticas
globais de gestão de riscos, de investimentos, divulgação de informações e
distribuição de dividendos.
O posicionamento do comando da
empresa foi decisivo para criar uma falsa expectativa entre os investidores
sobre o pagamento dos dividendos extraordinários.
Quase um mês depois, no final de
fevereiro, Prates acenou, em entrevista à agência
Bloomberg, que a estatal deverá ser mais cautelosa quanto à distribuição de
dividendos aos acionistas.
Segundo ele informou na ocasião, isso se daria por
causa dos investimentos da companhia em transição energética visando se tornar
uma empresa de energia além do petróleo, tendo como atividade também as
fontes renováveis.
Ponto central na crise, que não é só política, mas de
comunicação, é a avaliação das condições para a definição da margem de risco
para pagar os dividendos num equilíbrio entre dívida e caixa da empresa para
que o investimento programado não fosse represado por restrição orçamentária.
Detalhe importante: o parâmetro
do grau de confiança para o risco de pagar 100% dos dividendos extras em 2022
foi apresentada ao Tribunal de Contas da União.
Antes da definição do futuro
sobre os dividendos retidos, é provável que a corte seja consultada.
No comando da gigante
brasileira, o presidente da Petrobras deveria saber que a comunicação da
companhia não pode ser feita de forma amadora pelas redes sociais —prática que,
infelizmente, é cada vez mais seguida pelas autoridades e políticos brasileiros.
A diferença, no caso da Petrobras, é que Prates não é mais senador da
República.
A divulgação da ata da polêmica
decisão do CA da Petrobras vai ajudar a clarear a verdade dos fatos.
ADRINA
FERNANDES - FSP
FOLHA DE SÃO PAULO