José Roberto Ferreira,
diretor-superintendente, diz que melhora da economia e recuperação da Bolsa
deve reverter o quadro dos fundos de pensão em 2017.
Supervisionar os 307
fundos de pensão do país é a tarefa do economista José Roberto Ferreira, chefe
da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). Com um
deficit acumulado de R$ 73,2 bilhões até o 1º trimestre de 2016, as entidades
fechadas de previdência devem manter o resultado negativo até dezembro. Apesar
disso, ele avalia que a melhora das expectativas do mercado e a valorização dos
ativos na Bolsa de Valores de São Paulo têm potencial para reverter esse quadro
no próximo ano, caso o governo ajuste as contas públicas.
Em meio aos desafios para
reduzir os resultados negativos, Ferreira avalia que os participantes precisam
ficar atentos a tudo que acontece nos fundos. “Eles não precisam se preocupar
de maneira demasiada, mas não podem entrar em zona de conforto, tendo em vista
que são os principais interessado no assunto”, comentou, em entrevista
concedida na sede da Previc, em Brasília.
Para ele, quem contribui
mensalmente para complementar a renda no momento da aposentadoria deve buscar
informações nas fundações para saber o que levou ao eventual resultado
negativo. “Transparência é um direito do participante e uma obrigação da
entidade. Ela precisa prestar as informações. Os atos em geral, embora de
natureza privada, têm que ser públicos”, destacou.
O chefe da Previc alertou
que tem acompanhado com lupa as mudanças nas entidades patrocinadas por
estatais. E afirmou que a autarquia pode ser acionada pelos beneficiários
quando qualquer problema acontecer.
Os participantes dos
fundos de pensão devem se preocupar com a possibilidade de novos deficits?
Eles precisam ficar
atentos. Não precisam se preocupar de maneira demasiada, mas não podem entrar
em zona de conforto, tendo em vista que são os principais interessados no
assunto.
Os resultados dos fundos
de pensão apresentaram alguma melhora após o deficit de R$ 78,8 bilhões
acumulado em 2015?
No primeiro trimestre de
2016, houve sinais de melhoria. Houve uma redução de 10% no número de planos em
equilíbrio e aumento de 13% no de superavitários. O superavit consolidado
passou de R$ 13,8 bilhões para R$ 15,2 bilhões. Já o total de planos deficitários
cresceu em escala menor, de 5,3%. E o deficit acumulado caiu para R$ 73,2
bilhões.
O momento político tem
influenciado os mercados, com a valorização dos ativos financeiros. Isso tem
favorecido os fundos?
Sim. Apesar do cenário
desafiador, quando traçamos uma curva de tendência, é possível ver um início de
inflexão. Nos últimos três exercícios, os resultados dos fundos foram
negativos; agora, é o primeiro momento em que se percebe uma mudança nessa
curva.
De maneira prática, 2016
ainda será um ano de deficits e o próximo tende a ser melhor?
Há elementos para esse
cenário se confirmar. Nosso grande desafio é bater a meta atuarial, sob o
aspecto financeiro, e ter um controle sobre longevidade. Quanto à longevidade,
isso já é feito no dia a dia por meio da busca pelas aderências adequadas em
cada um dos planos de benefícios. Sobre o aspecto financeiro, há uma tendência
de redução brusca da inflação no próximo exercício. Em termos de juros, o
mercado vê perspectiva de voltarmos a trabalhar com taxas de um dígito no fim
de 2017.
Com a mudança de governo,
houve troca no comando de estatais e, consequentemente, nos fundos de pensão.
Mas alguns problemas têm ocorrido durante esse processo. Como a Previc atuará
nesses casos?
O acompanhamento tem sido
estreito, próximo e objetivo. Neste momento (a entrevista foi concedida na
tarde da última quarta-feira), o diretor de Fiscalização participa de uma
reunião do conselho deliberativo de uma entidade para tratar de uma eventual
revisão na composição da diretoria executiva. O ajuste que ocorreu há alguns
dias, na nossa visão, foi equivocado e precisamos retificar esse entendimento.
Alterações na direção de estatal, por vezes, provoca influência na diretoria
executiva dos fundos. Mas quem referenda ou não essa troca é o conselho
deliberativo, que tem estabilidade, mandato e autonomia.
E como o participante deve
participar desse processo?
Ele deve buscar os
interesses dele. Transparência não é só um direito do participante, é uma
obrigação da entidade. Os atos em geral, embora de natureza privada, têm que
ser públicos para o participante. Claro que a operações em curso, por questão
de sigilo e interesse da entidade, não cabe dar publicidade. Mas, tão logo seja
concluída uma operação, é necessário que o participante tenha acesso aos dados.
Os fundos têm obrigação de prestar informações. Se houver dificuldade, a Previc
pode ser acionada. Nosso papel é o de proteger o interesse do participante.
"A qualificação da
governança é importante.
Quanto mais profissionais
qualificados no conselho e na diretoria, melhor”
O Congresso Nacional
discute mudanças na legislação dos fundos de pensão. O que o texto traz de
positivo?
A qualificação da
governança é importante. Algumas associações — de participantes e de entidades
— têm questionado a figura de um agente externo nos conselhos ou na diretoria
executiva dos fundos. Para elas, deve ser preservada a representação dos
participantes e patrocinadores. Em nossa opinião, todo processo que possa
trazer maior qualificação é positivo. Quanto mais profissionais qualificados no
conselho e na diretoria, melhor. Essa é a essência. Após garantir a
qualificação, se houver a possibilidade de esse profissional qualificado ser um
participante do plano ou indicado pelo patrocinador, ótimo. Mas, se ele não
tiver os atributos de qualificação, não julgamos adequado.
E como seria esse processo
de recrutamento de profissionais?
O texto menciona um
processo público. Não se pode confundir com concurso público, que não se aplica
a uma entidade privada. Deve ser um processo de recrutamento amplo para
qualquer representante dos participantes, dos empregados e do patrocinador.
Quais são os pontos
preocupantes do projeto de lei?
A tentativa de que o
comitê de investimentos e a auditoria externa sejam alçados a órgãos
estatutários. Pela lei, teriam o mesmo destaque que o conselho deliberativo, o
conselho fiscal e a diretoria executiva. A estrutura estatutária seria
ampliada. Nossa preocupação é em relação a quesitos de responsabilidade. Pode
haver uma área sombra e conflito de competências. Eles têm um caráter de
assessoria, tendo em vista que quem responde pela gestão é a diretoria
executiva. Em relação à auditoria externa, é preciso delimitar melhor o seu
papel, até porque já existe um conselho fiscal.
Algumas normas podem
afetar a Previc?
O projeto fala em
estabelecer mandato para os diretores da Previc. No nosso ponto de vista, tudo
que vier para aperfeiçoar o modelo de governança das entidades de supervisão é
bem-vindo. Só ressaltamos que, desde sua criação, a Previc trabalha como órgão
de Estado. Variáveis de natureza política não têm tido influência. Pela
autonomia administrativa e financeira conferida por lei, não existe a
possibilidade de um ato administrativo da Previc ser reformado por qualquer
autoridade.
O projeto blindará as
entidades de ingerências políticas?
No nosso ponto de vista,
sim. Há dois pontos. O primeiro trata da eventual vinculação político-partidária
de dirigentes e oferece um prazo de desvinculação de dois anos. E a mesma coisa
para cargos de confiança exercidos no patrocinador.
O governo também enviou ao
Congresso uma proposta para que a Funpresp seja autorizada a administrar planos
de benefícios para estados e municípios. A medida é interessante?
Ela é interessante,
relevante e fundamental para as discussões em curso, já que pode ser inserida
em uma estratégia de reforma da Previdência. Seja por uma espécie de efeito
compensação, seja por necessidade de transição entre regimes, o fato é que os
desafios do regime geral não são menores do que o dos regimes próprios dos
servidores públicos. A ideia de ter uma entidade única que administre vários
planos é convergente do ponto de vista de escala. Nem todos os estados e
municípios têm condições de administrar seu próprio fundo de pensão.
Correio Braziliense