Na
avaliação feita pelo especialista em finanças públicas e professor do Ibre-FGV,
José Roberto Afonso, a decisão dos fundos de pensão alocarem recursos em
infraestrutura passará necessariamente, no curto prazo, pela redução dos juros
reais e, no longo prazo, pelo estímulo do governo a uma poupança domiciliar
sólida que passe a ser feita por meio da previdência complementar.
Os
investimentos em projetos de infraestrutura, que tradicionalmente estão
alinhados aos interesses de longo prazo dos fundos de pensão em todo o mundo,
perderam espaço no atual cenário brasileiro. Por conta de uma série de
problemas macroeconômicos, questões regulatórias e de governança, esses
projetos estão menos relevantes nas carteiras dos fundos de pensão.
Na
avaliação feita pelo especialista em finanças públicas e professor do Ibre-FGV,
José Roberto Afonso, a decisão dos fundos de pensão alocarem recursos em
infraestrutura passará necessariamente, no curto prazo, pela redução dos juros
reais e, no longo prazo, pelo estímulo do governo a uma poupança domiciliar
sólida que passe a ser feita por meio da previdência complementar. “Esta
precisa assumir muito do papel que hoje é concentrado e sobrecarrega bancos
estatais e, desse modo, certamente poderá investir em projetos longos como os
de infraestrutura”.
O
consultor Paulo Vales concorda com essa avaliação mas alerta para o fato de
que, com a tendência de maior maturidade do sistema, as Entidades Fechadas de
Previdência Complementar caminharão cada vez mais para a alocação de seus
patrimônios num horizonte de curto prazo. “Este fenômeno já acontece atualmente
e tende a se acelerar nestes próximos anos, a Abrapp vem estudando a situação
e, em breve, trará uma série de reflexões e sugestões à sociedade brasileira,
em especial ao próprio sistema e às autoridades”, diz Vales.
Liquidez
essencial
A queda
do juro, embora seja um direcionador essencial para reduzir a concentração de ativos
atualmente alocados em títulos públicos, precisará ser complementada por uma
série de outras medidas. O que não significa que as fundações ocuparão a
liderança de um novo ciclo de investimento em infraestrutura. “Os fundos de
pensão foram e ainda continuam sendo atores coadjuvantes importantes em
empresas que exploram concessões em infraestrutura. Eles não comandam o
negócio, nem esse nem outros, mas por certo, com juros menores, poderão
investir mais nesses projetos”, pondera José Roberto Afonso.
A questão
da crescente necessidade de liquidez nos investimentos é um fator fundamental,
reforça Paulo Vales: “Nesse sentido, se torna primordial o surgimento e a
consolidação de mercados de liquidez, em especial para títulos de renda fixa,
com montantes transacionados que sejam compatíveis com as necessidades de
funding para os projetos de infraestrutura”, sublinha o consultor. O primeiro
passo, portanto, é interromper a atual trajetória de aumento real dos juros
que, considerada a projeção futura da inflação, ainda segue com viés altista.
“Além disso, será preciso criar um mercado secundário de dívidas privadas no
país”, concorda Afonso.
A
criação de oportunidades de investimento será fundamental, ressalta o diretor
de Investimentos e Patrimônio da Funcesp, Jorge Simino. Ele lembra que há um
projeto interessante sendo discutido entre o governo brasileiro e o Banco
Mundial. “A ideia é criar uma estrutura que mitigue o risco na fase da
implementação dos projetos, é um desenho complexo mas que pode ajudar porque dá
uma proteção a mais em relação ao risco da execução dos projetos, que é um
aspecto bem delicado”. A Funcesp, que mantém apenas uma pequena alocação em
infraestrutura por meio de debêntures, prefere entrar nesse tipo de
investimento apenas como credora e não como acionista, ou seja, enxerga
infraestrutura apenas como instrumento de dívida e não tem interesse em
investir via equities por conta do nível de risco.
Na
avaliação de Afonso e Vales, caberá ao governo também fazer um esforço para
melhorar a supervisão financeira e estimular a autorregulação do sistema, de
modo a favorecer para mais investimentos das EFPCs em infraestrutura: “O
afastamento dos fundos de pensão desse tipo de investimento poderá produzir, no
campo macroeconômico, a recessão e, no lado micro, a má governança
corporativa”.
Longo
prazo
Aumentar
o apetite dos fundos de pensão por esse tipo de investimento, entretanto, é uma
tarefa que exigirá a conjugação de diversos fatores. Além da perspectiva de uma
forte queda da taxa de juros seria preciso que o País voltasse a conviver com a
perspectiva de crescimento econômico, com a existência de recursos para serem
alocados no longo prazo e um ambiente de estabilidade regulatória. Será
fundamental também que haja credibilidade dos veículos utilizados para
investimento em projetos de longo prazo.
A maior
parte do patrimônio dos fundos de pensão está alocado nos antigos planos BD, já
fechados, que pagam mais benefícios do que recebem de contribuição e seu prazo
médio de pagamento de benefícios está em 12 anos. Desse modo, se nada for feito
para fomentar o surgimento de novos planos, o patrimônio desses BD poderá ser
reduzido à metade ao longo dos próximos 12 anos. O que significará que grande
parte dos recursos alocados a longo prazo pelos atuais planos BD precisará se
tornar líquida. Já nos planos CD, que poderão receber recursos novos, uma
dificuldade a ser contornada é a marcação a mercado de seus ativos, o que
aumenta a volatilidade das cotas e pode tornar menos atraente a alocação em
infraestrutura a longo prazo.
“Um dos argumentos para os fundos de pensão
investirem em projetos de longo prazo sempre foi o de estarem bem
alinhados à natureza de longo prazo dos seus passivos, ou seja, os planos
tinham um horizonte longo para pagar seus benefícios, mas a verdade é que para
alguns fundos de pensão brasileiros, como a Funcesp, que tem 47 anos de idade,
o longo prazo já chegou”, observa Simino. Nesse caso, ele lembra que é preciso
estar atento não a uma classe de ativo em si mas às eventuais boas oportunidades,
com um horizonte de liquidez adequado: “Porque o essencial para um fundo de
pensão é administrar investimentos que sejam suficientes para pagar seus
benefícios e os ativos, portanto, devem ser olhados sob esse ângulo”.
Diário dos Fundos de Pensão