A
inclusão dos estados na reforma da Previdência precisa se estender a todos os
Poderes e não ficar limitada apenas ao Executivo. A ideia é defendida pelos
governadores e tem a simpatia da equipe econômica. Isso porque, ao englobar
Judiciário, Legislativo, Ministério Público, Tribunal de Contas e Defensoria
Pública, a reforma ajudará a acabar com uma situação perversa que hoje limita a
realização de investimentos e a aplicação de recursos em áreas importantes,
como segurança pública e transportes.
Em vários
estados, inclusive no Rio de Janeiro, o Executivo assumiu o pagamento de
inativos e pensionistas de todos os Poderes. Segundo o especialista em finanças
públicas Raul Velloso, isso reduz os recursos livres dos governadores:
—
Inativos e pensionistas viraram uma conta a mais que ninguém quer pagar. Eles
são empurrados para o Executivo. Existe uma disputa interna nos estados pelos
recursos do Orçamento e para saber em cima de quem a conta vai incorrer.
A pedido
do GLOBO, Velloso e o consultor da Comissão de Orçamento da Câmara e
ex-secretário de Previdência Leonardo Rolim fizeram um levantamento sobre a
situação do Rio. No estado, as despesas com inativos e pensionistas de todo os
Poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público) chegou a R$
13,345 bilhões em 2015. Desse total, R$ 2,24 bilhões (16%) corresponderam aos
órgãos autônomos. Segundo Velloso, isso demonstra que a reforma precisa
englobar todas as esferas:
— Os
Poderes têm de ser solidários no ajuste.
Ele
lembra que os órgãos autônomos têm direito a uma fatia do Orçamento estadual.
Ela é usada para pagar salários dos funcionários que estão na ativa. Nesse
período, os reajustes salariais e ganhos de remuneração, que costumam ser mais
generosos no Legislativo e no Judiciário, acabam impactando as aposentadorias
no futuro e a conta do Executivo. Velloso ressalta que a situação das despesas
com saúde e educação também limita a ação dos governadores. Essas duas áreas
têm vinculações obrigatórias, mas também não usam esses recursos para pagamento
de aposentados.
No Rio,
os dados levantados por Velloso e Rolim mostram que o déficit com o pagamento
de aposentados do Tribunal de Justiça saltou 80% entre o segundo trimestre de
2012 e o deste ano, chegando a R$ 177 milhões. Nesse mesmo período, o rombo do
Executivo cresceu 48,5%, a R$ 1,487 bilhão. No caso da Alerj, a alta foi de
15,7%, para um déficit de R$ 49,2 milhões. No Tribunal de Contas Estadual, o
aumento foi de 38%, para R$ 47 milhões.
Paralelamente,
estudo do economista José Roberto Afonso, da Fundação Getulio Vargas (FGV) e do
Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), mostra que o Rio é o estado com
a segunda menor proporção de gasto com o funcionalismo responsável por saúde,
segurança, educação e administração. São 33,7% da receita destinada a essa
despesa no Rio. No Espírito Santo, a parcela é de 31,3%, e em São Paulo, de
34,5%. O maior gasto é no Tocantins: 60,3%. Dessa conta, estão excluídos
inativos e outros poderes, como Judiciário e Legislativo.
— Há três
hipóteses para o rombo do estado: gasta muito com inativo, com outros poderes
ou arrecada mal. O problema é que a variável de ajuste é justamente onde se
gasta menos — afirma Afonso.
Quando se
incluem os órgãos autônomos, a situação se inverte. O gasto com pessoal nesses
outros poderes é, em média, de 8,9% da receita. No Rio, sobe a 10%, ressalta
Afonso:
— Se o
estado já gasta relativamente pouco com sua folha de pessoal ativo, recomenda o
bom senso que não se concentre o ajuste ali, mas sim em outros desvios de
gastos ou até de receitas. Quando mais se adia esse diagnóstico, mais sofrerá a
sociedade com a crescente desestruturação dos serviços públicos e do próprio
governo.
Para Afonso,
a previdência dos servidores do Rio precisa ser reformada “em caráter
emergencial”:
— Em
dezembro, o Rio deve superar o limite de 60% da receita com gasto com pessoal.
Isso vai obrigar o estado a fazer corte de cargos comissionados, depois de
servidores que não têm estabilidade e, por último, dos estáveis.
Uma
análise feita por Velloso com base nas despesas dos três estados em pior
situação financeira — Rio, Minas Gerais e Rio Grande do Sul — mostra quão
limitada é a margem de manobra dos governantes. Segundo ele, em média, os
órgãos autônomos desses locais respondem por 13% da receita corrente líquida
(RCL); a educação, por 17,8%; e a saúde, por 10%. As demais vinculações ficam
com 5,7% da RCL, e o serviço da dívida, com 13%. Somadas, essas fatias chegam a
59,6% da receita.
A
proposta de reforma da Previdência obriga todos os estados e municípios a
criarem um sistema de previdência complementar (uma espécie de fundo de pensão)
para seus servidores, em até dois anos. A exigência valerá para os entes que
têm regimes próprios de aposentadoria e englobará todos os poderes e seus
respectivos órgãos, num fundo único. Com isso, os novos funcionários que se
aposentarem terão um benefício limitado ao teto do INSS (hoje em R$ 5.189), e o
que extrapolar será complementado por esse fundo, em regime de capitalização.
Ainda pela proposta, quem não tiver condições para montar uma entidade própria
poderá aderir ao fundo dos servidores do Executivo federal, o Funpresp.
O
objetivo da medida é é reduzir as despesas dos estados com aposentadorias no
futuro. Atualmente, a média dos benefícios no Legislativo, Judiciário e demais
órgãos (Ministério Público, Tribunal de Contas e Defensoria Pública) é muito
superior aos valores pagos pelos Executivos em todas as esferas. Com a criação
de fundos de previdência complementar, a tendência é que, dentro de duas
décadas, o valor médio das aposentadorias nas carreiras mais privilegiadas
caia, explicou um interlocutor.
Segundo
dados do Ministério do Planejamento, no Executivo federal, uma aposentadoria é,
em média, de R$ 7,458 mil. No Ministério Público Federal, chega a R$ 17,904
mil. No Judiciário, a R$ 25,7 mil, e no Legislativo, a R$ 28,587 mil. Essa
discrepância, dizem os técnicos, se repete nos estados.
G1