Depois de estabelecido um teto para expansão dos gastos
públicos – o que ainda depende de aprovação do Senado, em duas votações,
previstas para dezembro – a etapa seguinte do ajuste fiscal terá de ser
necessariamente uma reforma na previdência, porque há um desequilíbrio
ameaçador nessas contas. Para aprovar a reforma o governo terá de convencer o
Congresso a restabelecer o princípio que norteia todo sistema previdenciário
desde que o chanceler alemão Otto von Bismarck o concebeu no século XIX,
preocupado com a velhice dos trabalhadores braçais: aqueles que trabalham se
solidarizam com os que perdem a capacidade de trabalhar.
Na previdência social, pelo modelo que o Brasil adota
(repartição dos recursos arrecadados), ninguém poupa para si mesmo, e esse princípio
é difícil de ser compreendido, pois todo mundo acha que tem direito assegurado
a benefícios exatamente por haver contribuído durante anos a fio. Infelizmente
não é assim que o sistema funciona. Quem trabalha contribui apenas para
terceiros. E terá que esperar que outros venham a contribuir em seu em favor
quando se aposentar.
É preciso então que haja uma relação equilibrada entre o
número dos que contribuem e os que recebem benefícios (aposentados e
pensionistas). Em vários estados, por exemplo, o número de beneficiados
equivale hoje ao de contribuintes. Ficou impossível fechar a conta usando-se os
percentuais de contribuição vigentes. E mesmo no regime geral (INSS), há cada
vez menos contribuintes para cada aposentado e/ou pensionista.
Como é que se ajeita essa equação? O percentual de
contribuição de empregados e empregadores teria de ser aumentado em dois pontos
percentuais, pelo menos. E isso apenas no curto prazo. No médio prazo, só
voltando ao princípio que inspirou o sistema, com mais gente contribuindo para
aqueles que efetivamente perderam a capacidade de trabalhar. A não ser por
motivo sério de saúde, ninguém perde a capacidade laboral na faixa dos 50 anos,
admitindo-se exceções nas categorias profissionais expostas à insalubridade e
outros perigos, além de atividades fisicamente exaustivas. Magistério não é
atividade insalubre, a não ser que se considere como tal o ambiente que se
dissemina nas escolas de áreas urbanas degradadas.
A aposentadoria por idade, respeitando-se um certo período
mínimo de contribuições (40 a 45 anos), é a que melhor se encaixa nesse
princípio. Nos tempos atuais, considerando-se a crescente longevidade da
população, é razoável definir a idade de 65 anos, para homens e mulheres,
indistintamente, para se requerer a aposentadoria. Alguma fórmula de transição
terá de ser considerada para aquelas já passaram dos 50 anos. Isso porque as
atuais regras do mercado de trabalho não são amigáveis para quem chega aos 60
anos. Muita gente pode ficar fora simplesmente por falta de opção, por não
arranjar emprego e nem ocupação. É um problema que não atinge os servidores
públicos, que só perdem emprego em situação de hecatombe financeira (como a que
se aproxima, sem a reforma).
A previdência complementar tem crescido exatamente porque é
um sistema pelo qual as pessoas poupam para si mesmos. Mas para tal, há que se
ter alguma capacidade de poupança, um enorme desafio para quem em renda média
mensal inferior a R$ 2 mil.
O Globo