A desconfiança que nos une é a causa da nossa
divisão.
Soma
da desconfiança pública com a privada resulta num combo difícil de ser
enfrentado.
Somos 190 milhões de desconfiados no Brasil.
Não é
a solidariedade, a compaixão, a cordialidade, nem mesmo a insegurança: o
sentimento que mais nos une é a desconfiança. Será possível construir uma Nação
com esse nível de desconfiança?
Pesquisa mundial do Instituto Ipsos aponta o Brasil
como a Nação que apresenta a população com o maior grau de desconfiança no
mundo: só 11% dizem confiar no próximo.
A média entre os 30 países pesquisados
é de 30%.
A China, por sua vez, aparece em primeiro lugar, com quase 60% da
população afirmando sentir essa confiança mútua, seguidas por Holanda, Suécia e
Austrália.
A desconfiança brasileira foi lapidada no tempo, e
para desarmá-la será preciso entender algumas de suas motivações.
Há razões para a desconfiança na coisa pública. A
política —salvo exceções— não está entregando acesso a serviços de qualidade e
nem qualidade de vida para as pessoas.
A grande maioria da população brasileira leva uma
vida sofrida há muitos anos.
É possível reverter essa situação, mas há que se
ter um grau de radicalidade, onde não se façam concessões frente aos temas que
dão dignidade à população como saúde, educação, habitação, mobilidade e
saneamento.
Se o Executivo
só pensa na manutenção do poder, no Congresso não é diferente, dominado por
grupos que trabalham por interesses próprios e privados, mas não públicos.
As
nada transparentes emendas de relator são um exemplo do jogo de interesses ali
estabelecidos, enquanto as recentes trocas de partido evidenciam a supremacia
do interesse imediato em detrimento do compromisso com os programas
partidários.
Dá para
confiar?
A soma da
desconfiança pública com a privada resulta num combo difícil de ser enfrentado.
A recuperação passa por entregas, cumprimento de promessas e, sobretudo, a
prevalência do interesse comum frente ao privado.
A construção de confiança tem a ver com
pertencimento, cuidado, empatia, comprometimento, entre outros sentimentos.
Embora no Brasil tenhamos queimado as pontes que nos aproximam, é tempo ainda
de reverter esta situação. Resta estimular a confiança nas pessoas, antes de
desconfiar.
A criação de um ambiente favorável e confiável é
base para o avanço da sociedade e dos negócios. As empresas têm
responsabilidade neste processo: ir além dos interesses de curto prazo.
Na
política, um caminho é a criação de espaços de participação que aproximem a
política da sociedade.
Outro indica as eleições deste ano, que se configuram como
mais uma oportunidade para transformação.
Mesmo que seja difícil confiar, o caminho da
política é fundamental para enfrentar os desafios que temos.
Cabe a cada um de
nós identificar nossos nomes de confiança. Eles existem, acreditem.
Só que,
para achá-los, temos que estar dispostos a pesquisar, ouvir e avaliar
criticamente.
Será pelo aprimoramento da democracia que iremos recuperar a
confiança perdida.
FOLHA DE SÃO PAULO