A reforma da Previdência é bom começo, mas
não suficiente sanar todo o desequilíbrio nas contas
A proposta de reforma da
Previdência apresentada pelo ministro Paulo Guedes com o firme aval
do presidente Bolsonaro, é um bom começo para a indispensável reconstrução da
higidez fiscal do Brasil, sem a qual a volta ao desenvolvimento robusto é
impossível. Apesar de absolutamente necessária, não será suficiente.
Entretanto, se aprovada no Congresso sem excessiva amputação, dará estímulo
para acelerar o programa de libertar a criatividade do brasileiro do furor
estatal regulatório que o constrange.
Foi bom antecipar-se
as críticas de sempre: 1) disposições para aumentar a recuperação dos créditos
do INSS; 2) operação
“pente-fino” para controlar fraudes e 3) um “mea-culpa” do
presidente por tê-la combatido no passado por sua “ignorância do problema”.
Prevendo a reação da esquerda infantil, ele disse: quando meu conhecimento
muda, eu mudo. E vocês? Faltaram duas vacinas: 4) a remessa da parte relativa
às Forças
Armadas e 5) medidas fiscais já maduras para aliviar a carga
tributária sobre o trabalho e aumentá-la sobre o capital.
Para se ter uma ideia
do desequilíbrio a que chegamos, basta olhar o que aconteceu em 2018.
Previdência e Assistência consumiram R$ 712 bilhões de todos os gastos. Na
Saúde, foram R$ 119 bilhões, e na Educação, R$ 74 bilhões. Ou seja, gastou-se,
respectivamente, 6 e 9,6 vezes menos em saúde e educação do que em Previdência
e Assistência: é o assassinato do futuro! Pior, o que é hoje o maior dos nossos
problemas imediatos, a segurança, não chegou a 1% do gasto total.
Essa situação não é
acidental. Foi sendo construída lentamente nos últimos 30 anos pelo laxismo do
Poder Executivo em cômodas “transações” com os poderes Legislativo e
Judiciário, que a Constituição quer “independentes e harmônicos”, isto é, que
respeitem a “caixa”, comum! Ela proíbe qualquer gasto que não indique,
claramente, de onde virá a receita para cobri-lo. O problema é que o
Legislativo (com truques baratos) e o Judiciário (sob pressão moral), não a
levam a sério em suas decisões.
Nenhuma reforma da
Previdência poderá satisfazer a todos os gostos, mas a de
Bolsonaro-Guedes vai à raiz dos problemas. Escancarou a escandalosa
desigualdade embutida nas aposentadorias precoces e o criminoso desrespeito aos
tetos salariais constitucionais, do qual se salvam, apenas, o Executivo e o
STF.
Agora o Congresso vai
analisá-la. Esperamos que não a desidrate nem reduza o
“aggiornamento” que propõe a curetagem das limitações constitucionais que
tornam o Brasil inadministrável pela excessiva judicialização dos atos do
Executivo e Legislativo e a consequente politização do Judiciário.
Antonio Delfim Netto