'Na nova era do conhecimento, bilhões são gerados
sem a criação de um único emprego', diz economista.
Para
o professor da PUC-SP Ladislau Dowbor, sistema financeiro aliado a algoritmos
cada vez mais precisos minou o setor produtivo.
O economista Ladislau Dowbor se surpreendeu com o
drama financeiro enfrenado por uma amiga.
Intelectual, com curso de mestrado,
ela pegou R$ 4.000 emprestados de um grande banco de varejo. Até agora, pagou
R$ 5.000. Mas ainda está devendo R$ 8.000.
O que poderia ser considerado mais um caso de juros abusivos no mercado brasileiro é,
na verdade, um indicativo do quão poderoso se tornou o sistema financeiro
mundial.
Aliado à tecnologia proporcionada por algoritmos mais precisos e
velozes, o mundo das finanças minou o setor
produtivo e, consequentemente, o trabalho e a renda, diz Dowbor, professor
titular de pós-graduação da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo).
O que vem agravando a situação do trabalho no mundo
é a economia intangível, baseada no conhecimento.
“Antes, o enriquecimento dos grandes grupos na
indústria ou nos serviços dependia da geração de empregos”, afirma o
economista, que já atuou como consultor de diversas agências das Nações Unidas,
governos e municípios, além de várias organizações do sistema “S” no Brasil.
Recentemente, suas pesquisas giram em torno das dinâmicas do sistema financeiro
nacional e internacional.
Para fazer sapatos, por exemplo, diz ele, o
empresário contratava gente, gerava o produto para a sociedade e pagava
impostos ao governo, ficando com o lucro da operação.
“Mas na economia imaterial, o enriquecimento
não é de quem produz, mas de quem intermedeia o processo”, diz. “O dinheiro que
movimenta a economia hoje não é de papel, virou um sinal magnético.
Apenas 3%
da liquidez vêm das células. Sobre cada operação, existe uma tarifa de 2,5% a
5% paga por todos nós, do rico ao favelado."
Dowbor, cita como exemplo grandes bancos no Brasil
que, entre o segundo trimestre de 2020 e o segundo trimestre de 2021,
aumentaram seus lucros em mais de 100%. “Isso com a economia parada”.
Ele vai além e destaca os 42 brasileiros que entraram na lista de bilionários
da revista Forbes, que tem 315 nomes.
“Entre 18 de março e 12 de
julho de 2020, um período em que a economia estava em crise profunda com a
pandemia, estas pessoas acumularam uma fortuna pessoal de US$ 34 bilhões [R$
180,5 bilhões].
Com isso, seria possível pagar seis anos de Bolsa Família a 50
milhões de pessoas."
São fortunas que se geram sem empregos, com lucros
e dividendos que não pagam impostos, diz o economista.
A exceção são os
empregados do mercado financeiro voltados à gestão de grandes fortunas que, com
a ajuda da tecnologia, fazem girar este sistema.
FOLHA DE SÃO PAULO