BC
deveria parar de reduzir os juros
Selic atual
parece ser condizente com a trajetória da inflação rumo às metas.
A
mais recente decisão do BC de reduzir a taxa Selic para 4,5% foi totalmente
antecipada.
A surpresa veio na mensagem. O comitê ressaltou que o atual estágio
do ciclo econômico recomenda cautela, sendo os próximos passos da política
monetária definidos pela evolução do cenário futuro.
No
entanto, houve a avaliação de que os últimos dados de atividade e a maior
eficiência do mercado de crédito podem resultar em uma redução da ociosidade
mais rápida do que o antevisto e, com isso, produzir pressão inflacionária.
A
comunicação provocou forte ajuste no mercado de juros, com a diminuição nas
apostas em novos cortes.
A recuperação cíclica parece ganhar tração.
O
desemprego está elevado, mas há um aumento considerável no ritmo de criação de
vagas formais, estimulando trabalhadores desalentados a voltar ao mercado de trabalho.
O desempenho do comércio e do setor de serviços vem surpreendendo
positivamente.
O PIB deve crescer perto de 1,1% neste ano,
com a demanda interna privada avançando 2,5%.
Para 2020, esses números devem
ser, respectivamente, 2,5% e 3,0%. Isso ocorre porque o PIB está sendo puxado
pelo consumo privado e pelo investimento.
Os números só não são melhores porque
um quinto do PIB, o consumo do governo, deve cair 0,5% neste ano e se manter
estável em 2020.
Dois
fenômenos estão acontecendo no mercado de crédito e devem ser o foco do BC no
curto prazo.
O primeiro é a maior participação do crédito com recursos livres,
em detrimento do crédito direcionado.
O
direcionado possui taxas de juros subsidiadas para alguns setores da economia,
enquanto o livre trabalha com as taxas de mercado, balizadas pela Selic.
Esse
fenômeno aumenta a potência da política monetária, justamente quando o grau de
estímulo não encontra comparativos na história.
O
segundo é o começo da desintermediação financeira, com o desenvolvimento do
mercado de capitais.
A
diminuição dos empréstimos do BNDES impulsionou a busca por financiamento via
emissão de dívida. Paralelamente, o mercado de fintechs de crédito e bancos digitais tem
evoluído rapidamente, fomentando uma competição saudável com o mercado bancário
tradicional.
O BC
não deu pistas claras de qual seria sua próxima decisão, deixando as portas
abertas tanto para o fim do ciclo quanto para um corte mais cauteloso. Há
razões para isso.
Quando
o ciclo de política monetária está no seu início, fica mais fácil descrever com
detalhes a previsão mais provável das futuras decisões.
No entanto, ao chegar
perto do fim do ciclo, a autoridade monetária geralmente faz uma política de
sintonia fina, não encontrando o grau de certeza suficiente para deixar os
próximos passos explícitos.
A
taxa de juros está estimulativa, e seus efeitos possuem defasagens. O BC não
deve ficar adicionando estímulos até a inflação desviar da meta. A calibragem
final exige muita arte e um certo sangue-frio.
Por
fim, nossas metas de inflação estão em processo de queda. A última,
estabelecida para 2022, é de 3,5%, mas é desejável que possa ser reduzida
gradualmente para 3%.
Neste
estágio do ciclo, a Selic atual parece ser condizente com a trajetória da
inflação rumo às metas no horizonte da política monetária.
O BC cumpre o seu
papel de colocar a inflação no objetivo estabelecido, com a recuperação cíclica
diminuindo nossa capacidade ociosa.
Os
desafios do crescimento sustentável ficam a cargo do ajuste fiscal ainda a ser
consolidado e da busca por uma maior produtividade da economia.
Solange Srour - Economista-chefe da gestora ARX Investimentos.