Dar graças pelas coisas boas da vida é dar ao cérebro uma chance
de lembrar tudo que tem dado certo.
De
todos os feriados, o de Ação de Graças norte-americano é meu favorito: um dia
para reunir a família ao redor de um enorme jantar e lembrar de todas as
pessoas, coisas e oportunidades pelas quais somos gratos. Ainda por cima, é um
feriado não religioso e não comercial (ainda que dê início à temporada de
compras natalinas).
Muito apropriadamente, o site TED.com publicou no feriado a
palestra do monge Beneditino David Steindl-Rast, que vem divulgando uma
mensagem de gratidão.
Em voz deliciosamente serena porém firme e sem qualquer apoio
audiovisual, o monge nos lembra que todos nós, de qualquer cultura, etnia,
credo ou profissão, temos algo profundo em comum: o desejo de ser feliz. E ousa
dar uma receita: o caminho mais fácil e imediato para a felicidade é a
gratidão.
É uma mensagem simples e poderosa --e a neurociência assina
embaixo. David nos lembra do que é dar graças: é parar por um instante para
olhar ao redor e reconhecer as oportunidades que temos e lembrar que, mesmo se
algo dá errado, a vida nos dá a oportunidade de tentar de novo. Na pior das
hipóteses, podemos ser gratos só por essa oportunidade de seguir adiante.
Fui assuntar na literatura científica sobre o que é a gratidão
para o cérebro e me deparei com um belo estudo do americano Jordan Grafman com
o brasileiro Jorge Moll sobre emoções morais.
Apoiados na filosofia de David Hume, eles supõem que essas
emoções dependem da noção de agência, ou seja, de responsabilidade pessoal
pelos acontecimentos. Quando algo de bom acontece como resultado das nossas
ações, ficamos orgulhosos; mas, quando algo de bom acontece por ação alheia,
ficamos... gratos. A equipe mostra que, nos dois casos, de fato há ativação do
sistema de recompensa do cérebro, que nos deixa instantaneamente felizes e
satisfeitos.
Parar para olhar ao redor e dar graças pelas coisas boas da vida
é, portanto, dar ao cérebro uma oportunidade de lembrar de tudo o que tem dado
certo e ficar genuinamente feliz com tudo isso que não depende de nós. Assim, a
gratidão é, por definição, um sentimento de felicidade --mas um que podemos
escolher ter a cada instante.
É só fazer uma pausa, dar graças (à vida, aos céus, a Deus, ao
acaso, às pessoas boas que você conhece, não importa) e instantaneamente seu
cérebro encontrará um momento de felicidade.
Suzana Herculano-Houzel - neurocientista, professora
da UFRJ e apresentadora do programa "Cerebrando" (cerebrando.net)
Fonte: www.suzanaherculanohouzel.com