Mais perdido que leitor de jornal


O título bem que poderia ser a atualização do velho dito “mais perdido que cego em tiroteio”. A desorientação é a característica comum e o sinal de que já estamos vivendo o que pode ser definido como “guerra da informação”.

Cada vez mais os conflitos modernos tendem a ser decididos por quem maneja a informação, uma arma mais eficiente, ampla e duradoura que os mísseis ou balas.

A desorientação é o estágio inicial e obrigatório da “guerra da informação” porque gera insegurança, que por sua vez alimenta a irritação, as catarses e os confrontos. A guerra da informação não tem fronts porque a desorientação nos leva a confundir quem são os aliados ou os adversários.

 

Na maioria dos casos, a identificação é equivocada dando origem a atritos desnecessários ou injustificados.

Os conflitos gerados por desorientação informativa podem surgir em qualquer lugar ou grupo social porque são alimentados por percepções diferentes e pela ausência de compreensão mútua. Mas a causa principal está no nosso desconhecimento sobre como captar e passar adiante os dados que recebemos.

 

Nisto é fundamental distinguir o dado bruto da informação processada. Dado bruto são os números, fatos, eventos e notícias que recebemos pela imprensa, redes sociais, parentes, amigos e conhecidos. Há duas atitudes diante de um dado: ele nos ajuda a ter uma compreensão básica de quem o enviou, quando é necessário distinguir os elementos objetivos dos subjetivos. Numa notícia de jornal, o elemento objetivo pode ser o anúncio da alta da gasolina.

A parte subjetiva, ou oculta, fica por conta da conjuntura do anúncio e da relevância ou não atribuída pelo jornal ao fato objetivo, por exemplo.

Informação é o dado recebido, processado por uma pessoa e passado adiante.

Ela incorpora o contexto cultural, social, político e econômico de quem a transmite. Quando lemos um jornal ou assistimos a um telejornal recebemos dados, mas quando comentamos a notícia estamos transmitindo uma informação. Um mesmo fato pode ser dado ou informação, dependendo da posição do indivíduo, como receptor ou transmissor.

 

A diferença é sutil e pode parecer supérflua, mas é importante porque nos ajuda a reduzir os efeitos da desorientação noticiosa, provocada pela imprensa, redes sociais e formadores de opinião. Ao lermos uma noticia de jornal como dado, priorizamos o que ela tem de concreto, real e objetivo.

É como se recebêssemos uma conta de luz. Ali estão um valor e uma data.

A conta só terá algum significado depois que compararmos o valor com o de meses anteriores e situarmos a data em nosso orçamento doméstico. Aí a conta vira informação porque vai orientar nossas ações futuras.

Quando não separamos dados e informações podemos reagir irritados a um aumento da conta antes de avaliarmos se ele é ou não justificado.

A diferença entre dado e informação nos ajuda a separar fatos de emoções.

 

Há um fato objetivo que é a desorientação provocada pela avalancha de versões jornalísticas diferentes sobre um mesmo fato, publicadas na imprensa e nas redes sociais. Trata-se de um fenômeno com o qual teremos que conviver durante algum tempo, até que sejam desenvolvidos sistemas de triagem mais eficientes e rápidos para lidar com a avalancha informativa.

 

A “guerra de informação” é alimentada pela desorientação, mas deflagrada pela manipulação de percepções e emoções. Quando deixamos de examinar um dado com a frieza que a sua natureza objetiva impõe, acabamos misturando a realidade com o que gostaríamos que fosse real. Esta mistura gera inconformismo e revolta.

O leitor recebe notícias como dados, mas o jornal as publica como informação, ou seja, incorpora a ela os significados e contextos conforme os interesses e a conjuntura empresarial. Assim, a imprensa transmite a sua visão, o que não necessariamente significa que esteja reproduzindo a realidade. Só que o leitor não foi educado para distinguir um dado de uma informação. A imprensa paga o preço dessa incompreensão; e, se não orientar o público levando em conta as percepções de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas, manterá o tiroteio noticioso e será corresponsável pela “guerra da informação”

 

Carlos Castilho – jornalista, professor, autor.

Fonte: site Observatório da Imprensa
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