Investe em fundos imobiliários? Prepare-se para um
teste de fogo
Muitas
das dívidas contraídas por FIIs na última boa janela de captação serão cobradas
a partir deste ano.
Pode parecer uma eternidade —o que muito se deve a
termos passado por uma pandemia—, mas há dois anos vivíamos com uma taxa básica de juros (Selic) de 2%
ao ano. Foi em março de 2021 que começou a escalada para os atuais 13,75%.
E sabe o que aconteceu quando o dinheiro estava
"barato"?
Quem tinha planos para tirar projetos do papel foi lá e
fez. Com isso, tivemos a chamada "janela de IPOs", em 2020 e 2021, com o aumento de
empresas que abriram seu capital em Bolsa.
Mas não foram só elas. Os fundos imobiliários (FIIs) também tiveram
sua fase de ouro da captação neste período.
Hoje, temos cerca de 430 fundos imobiliários listados
em Bolsa. Quase 15% desses fizeram o IPO (a primeira oferta pública na Bolsa)
naqueles dois anos.
Com dinheiro "barato", foi fácil captar
investidores. Com grana no bolso, as gestoras foram às compras de imóveis.
Galpões logísticos, lajes comerciais e shoppings entraram na
dança das grandes negociações.
E, ao contrário do que se recomenda no orçamento
doméstico, no mundo dos FIIs é comum (muitas vezes, recomendável) que se
aproveite a época de bonança para pegar mais crédito, contrair novas dívidas e
aumentar o portfólio de imóveis do fundo — a chamada alavancagem.
Isso porque os investidores que compram FIIs, em sua grande
maioria, escolhem de acordo com os dividendos pagos por cada fundo (o indicador
para ver isso chama-se Dividend Yield), provenientes dos aluguéis recebidos.
Assim, para tornar seus FIIs mais atraentes, os gestores correm
para aumentar a quantidade de imóveis e, consequentemente, de aluguéis a
receber.
Acontece que muitas das dívidas contraídas por FIIs na última
boa janela de captação, tinham carência de dois anos. Fazendo as contas, serão
cobradas a partir deste ano.
Em alguns casos, são parcelas mensais, que começarão a corroer o
caixa dos fundos. Em outros, o FII será obrigado a pagar a primeira chamada
"parcela balão" — união de parcelas acumuladas por um período
(normalmente, um ano).
Em resumo: agora vai ficar claro para o investidor
quem se alavancou (contraiu dívidas) com planejamento e quem só pegou dinheiro
porque estava na mesa, mas não se preocupou com o futuro.
Com os altíssimos juros atuais (Selic em
13,75%), emitir novos títulos de dívida para pagar a anterior parece um mau negócio.
Fazer uma nova emissão de cotas também não é uma boa ideia, já que estamos
longe de uma boa janela de captação.
O que sobra, então, é vender imóveis ou,
como se diz no mercado, mudar o portfólio do fundo.
Com dívidas batendo à porta, os fundos que não se
planejaram bem terão que vender imóveis a preço de promoção, já que têm pressa,
penalizando os investidores que confiaram em seus gestores.
Ao mesmo tempo,
aqueles gestores que souberam onde pisar, verão uma onda de ofertas de imóveis
abaixo do preço de mercado.
Para o investidor, será hora do teste de fogo para
quem só olhou para o dividend yield na hora de escolher onde investir.
Agora é
hora de dar um passo além e entender o que os gestores estão fazendo com o seu
dinheiro. Vender um imóvel às pressas é sinônimo de mau negócio, em qualquer
mercado.
MARCOS DE VASCONCELLOS - jornalista, assessor de
investimentos e fundador do Monitor do Mercado