LEITURA PARA FINAL DE SEMANA


É hora de criar um cargo executivo dedicado à requalificação dos funcionários

Embora os líderes corporativos discutam as lacunas de habilidades há anos, a ampliação da automação e da inteligência artificial está forçando algumas das grandes empresas como Amazon, JPMorgan Chase, SAP, Walmart e AT&T – para citar algumas – a agirem, não por meio de pequenos projetos-piloto, mas com planos completos para reter amplos segmentos da sua força de trabalho. 

Esses programas sinalizam que o “futuro do trabalho” não é mais um fato no horizonte distante. Ele já está aqui.

Nossa mais recente pesquisa mostra que o mix ocupacional da economia já está mudando, e  irá se acelerar ao longo da próxima década. 

Embora calculemos que somente 5% de todas as ocupações possam ser totalmente automatizadas, as atividades em quase todas as funções irão evoluir. 

À medida que as máquinas substituam algumas tarefas cognitivas físicas, repetitivas e básicas, o trabalho restante envolverá habilidades, tanto técnicas como digitais e mais interação pessoal, criatividade e  avaliações. 

A crescente  valorização de  tais habilidades significa que as empresas nem sempre terão condições de contratar o talento de que precisam para colocar em prática as estratégias para o crescimento. 

É cada vez mais necessário que o talento venha de dentro da empresa. Essa abordagem auxilia as organizações a ganharem novas capacitações internamente, preservando ao mesmo tempo o conhecimento funcional, a experiência e o entendimento sobre a cultura da empresa.

O desafio é muito maior do que elaborar módulos únicos de treinamento ou ajudar as pessoas a usar um tipo de software específico. 

Um foco limitado nas tarefas específicas necessárias hoje pode deixar sua empresa despreparada para ser ágil no futuro. 

Numa era de rápidas mudanças em tecnologia e inovações industriais, as empresas precisam aprender a aprender continuamente – não só hoje, mas de maneira constante.

E como fazer isso? As empresas precisam criar a nova função corporativa – a requalificação. 

Essa capacitação precisa ser promovida e institucionalizada, como já aconteceu nas áreas de finanças, marketing e riscos. 

Muitas organizações precisam agregar sistemas plenamente desenvolvidos para o aprendizado contínuo por meio de aulas, treinamentos, e avaliações – e é preciso realizá-los de maneira mais eficaz e em maior escala do que jamais tentaram anteriormente. 

Enquanto alguns detalhes variam de empresa para empresa, alguns princípios norteadores estão surgindo nas  mais avançadas.

Em primeiro lugar, iniciar uma jornada de tamanha complexidade exige um roteiro que conecte as funções e as pessoas atualmente nas empresas às funções necessárias no futuro.  

As pessoas estão sujeitas a ser classificadas em várias categorias:  aquelas que precisam aprender algumas habilidades e tecnologia para permanecerem na função atual ou similar; aquelas que precisam de uma requalificação mais significativa para trocarem de função dentro da organização; e aquelas para as quais ainda não existe uma função imediata dentro da organização. 

Varejistas, por exemplo, precisarão de menos operadores de caixa e estoquistas, uma vez que caixas automatizados e scanners de estoques robóticos estão em amplo uso. 

No entanto, alguns colaboradores com essas funções já estão sendo treinados para andar pela loja e responder a perguntas, aprimorando o atendimento ao cliente; outros estão indo para os centros de atendimento ao cliente para controlar o e-commerce e os pedidos de entrega. 

Enquanto isso, os colaboradores nas lojas estão aprendendo a fazer manutenção e supervisionar os robôs que  carregam e descarregam os paletes. 

Novas funções também estão em alta – como os analistas de dados, que sabem como extrair uma grande quantidade de dados das compras e do comportamento do cliente, a fim de aprimorar as estratégias de marketing.

Fazer um levantamento detalhado das habilidades possibilita identificar funções e exigências que coincidem umas com as outras, apontando ações lógicas. 

As novas ferramentas baseadas em tecnologia possibilitam avaliar as habilidades que cada colaborador possui e como tais habilidades se sobrepõem às habilidades e funções necessárias no futuro. 

As empresas que têm vários cargos e estão localizadas em diferentes locais terão mais opções disponíveis para relocar as pessoas internamente. 

Uma vez identificados os caminhos a serem traçados, as empresas precisarão elaborar diferentes tipos de jornadas de aprendizagem para os colaboradores com base nas mudanças de sua função. 

Os colaboradores deverão se preparar para funções diferentes das quais eles foram inicialmente contratados para exercer.

Em segundo lugar, as empresas precisam decidir como realizar o treinamento. 

Isso pode ser feito de várias formas – desde cursos tradicionais em sala de aula e cursos online à modalidade de aprendizado híbrida, que combina trabalhos em sala de aula ou online, e o aprendizado experimental com  as novas formas de aprendizado, como bootcamps intensivos, aprendizado em equipe, gamification, e sessões de coaching em revezamento. 

A tecnologia aumenta de maneira exponencial as possibilidades de se chegar a muitos colaboradores de várias localidades, proporcionando-lhes a flexibilização de horários para o aprendizado, a avaliação de sua compreensão do conteúdo, o monitoramento do andamento do curso, e questionários para avaliar a eficácia. 

Os módulos online podem incluir multimídia, conteúdo interativo e novas abordagens – como a realidade virtual, que propicia experiências imersivas.

É provável que as empresas precisem de espaços físicos exclusivos e propícios ao aprendizado. 

A Amazon, por exemplo, está criando salas de aula em alguns de seus centros de atendimento ao cliente para que os funcionários dos depósitos tenham como participar de programas de certificação que os capacitem para funções como técnicos de dados. 

A CVS montou centros de aprendizado, cada um contendo salas de aula e uma farmácia-escola completa. 

Essas instalações funcionam como centros, não somente para acolher os novos colaboradores, como também para treinar milhares dos colaboradores atuais todos os anos a fim de auxiliá-los a adquirir novas competências e se manterem atualizados.

Nem todo treinamento é eficaz. 

Existe uma arte para  equilibrar a teoria e a prática, elaborando-se materiais educacionais na medida certa, estabelecendo o ritmo adequado e tornando a experiência toda envolvente.  

Envolver alguns colaboradores na elaboração dos programas de aprendizado ajuda a encontrar o equilíbrio certo. 

As empresas podem recorrer a parceiros de fora que tenham expertise em educação ou capacitação para a elaboração dos programas. 

Alguns facilitadores online, como a Coursera e a Udacity, estão trabalhando em conjunto com as empresas para elaborar programas de treinamento personalizados. 

Uma outra opção é fazer parcerias com instituições educacionais – sejam escolas técnicas, faculdades, ou universidades – para desenvolver cronogramas relevantes, conceder diplomas ou certificados para criar uma cadeia local de futuros talentos. 

A Arizona State University, a University of Florida e a Georgia Tech são algumas das universidades tradicionais que estão trabalhando junto com empresas para oferecer cursos online e programas com certificação.

Em terceiro lugar , as empresas precisarão de uma liderança dedicada a fim de manter a iniciativa. 

Para algumas, isso pode envolver a criação de um novo cargo no grupo dos executivos de alto nível: o cargo de Chief Skills and Learning Officer (CSLO). 

Da mesma maneira que a função do Diretor Técnico de Informática (CTO, em inglês) se tornou lugar comum ao longo das últimas duas décadas, o cargo do CSLO pode se tornar mais comum nas décadas futuras, uma vez que as organizações precisam retreinar, redefinir e realocar os funcionários. 

Uma liderança dedicada em requalificação pode também significar ter um hub de talentos formalizado e consolidado, que elabore e ofereça sessões individuais de aprendizado e ajude na gestão de pessoas ao longo do treinamento e da transição para outras funções.

Por fim, os CEOs precisam ser realistas quanto aos resultados e ao tempo necessário para a criação dessa função. 

Os colaboradores que tiveram poucas chances de aprender, crescer e serem exigidos podem aparecer. 

Nem todos irão querer assumir uma nova função ou são adequados para ela. Porém, uma grande parcela deles pode ter mais êxito do que pensam. 

Oferecer oportunidades de aprendizado e o caminho claro em direção à nova função pode reduzir atritos – um custo relevante e uma dor de cabeça recorrente em vários setores.

Há anos as empresas vêm debatendo o assunto sobre como  treinar funcionários que podem adquirir um  novo conhecimento e deixar a empresa. 

Atualmente, no entanto, um crescente número de grandes empregadores nos Estados Unidos não só investe nos seus próprios programas de treinamento, como também oferece cursos com subsídios – dos quais, alguns permitem que os participantes busquem uma graduação ou treinamento em qualquer área. 

Esses programas não só preparam os colaboradores para assumirem funções mais desafiadoras, como também oferecem uma maneira de as empresas fazerem a sua parte, criando  caminhos para a mobilidade ascendente , e lidando  com as questões sociais de maior porte que a automação apresenta.

De nossas conversas com executivos, percebemos que os Estados Unidos estão em um momento decisivo. 

A polarização existente entre as cidades com alto índice de crescimento e as áreas rurais em dificuldades, e entre trabalhadores com altos salários e os outros – está começando a ficar insustentável. 

O recente pronunciamento  feito por aproximadamente 200 CEOs da Business Rountable, comprometidos em análises que vão além do valor atribuído pelos shareholders, reflete um crescente reconhecimento da necessidade de se investir em pessoas.

Além das necessidades da sua própria força de trabalho, os empregadores têm como função  principal preparar os americanos para os empregos do futuro. 

Muitos estão se juntando a coalisões com instituições de educação e organizações sem fins lucrativos para expandir os programas de treinamento e definir os planos de carreira em seus setores e regiões. 

Ao trabalhar com educadores locais e líderes do governo, eles têm como ajudar a revitalizar as comunidades e garantir que a prosperidade seja distribuída de maneira mais ampla entre os cidadãos  e os locais americanos.


André Dua é sócio sênior na McKinsey & Company.


Liz Hilton Segel é sócia-gerente na McKinsey para a América do Norte.


Susan Lund é sócia na McKinsey Global Institute.

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