Habilidade para dizer mais não do que sim
Aparente
inabilidade de colocar em prática nossas resoluções de ano novo está
relacionada à nossa incapacidade de nos colocar em primeiro lugar.
Eu nunca vi um fim de ano com tanta retrospectiva.
Sem medo de entregar a idade, admito que sou da época em que só tinha uma,
aquela clássica que saia da televisão e ocupava a sala de casa, virando pano de
fundo de reuniões de fim de ano e combustível para as conversas em família e
entre amigos ali naquelas horas que antecedem o início de um novo ano.
Agora, para onde se olha, tem gente
olhando para trás.
Nos podcasts, nas redes sociais, no noticiário, nas páginas
de fofoca: memes que marcaram o ano, pessoas que mais se destacaram,
celebridades que se divorciaram, os piores desastres naturais. Tem retrospectiva
para todo gosto.
Talvez tenha sido meu ano —que, confesso, não irá
entrar para o top 5 anos da minha vida— mas eu relutei em adotar essa trend.
Decidi logo no início de dezembro que usaria a virada do ano para olhar para
frente, ao invés de pelo retrovisor, mas falhei miseravelmente.
Há pouco mais de uma semana, enquanto fazia uma
limpa no celular, dei de cara com um arquivo intitulado 2024.
Tratava-se
da lista ambiciosa de resoluções que
compilei a poucos dias de adentrar o ano que se encerra agora.
- Me exercitar
- Comer melhor
- Ficar menos no celular
- Ler mais
- Guardar dinheiro
- Meditar
- Procrastinar menos
- Lançar os projetos profissionais que estão engavetados
- Ter mais momentos de casal
- Dormir cedo
Ao final da lista, me aguardava a constatação de
que, para 2025, nem precisava me dar ao trabalho de criar uma lista nova.
Bastava atualizar o título, alterando o último dígito do ano.
As metas para
2025 seguiam as mesmas, tamanho foi o fracasso em realizar qualquer uma delas
no ano que passou.
Olho ao redor e vejo tantas mulheres sofrendo com
essa mesma frustração. Entra ano e sai ano sem que consigamos cumprir o que nos
prometemos. Sendo obrigadas a olhar para trás com culpa diante da nossa própria
retrospectiva.
Mais um ano que se passa e não conseguimos chegar lá naquele
Olimpo onde gostaríamos de estar. E repetimos para nós mesmas: "esse ano
vai!" mesmo sabendo que é bem provável que aquele lugar esteja agora um
pouquinho mais longe do que estava na virada do ano que passou.
E a pergunta que resta é: para onde foram esses 365
dias? O que fizemos nesse tempo que parece tanto, mas que não foi o suficiente
para comportar nossos planos? Foi conversando com outras mulheres que
me caiu essa ficha.
Nossa aparente inabilidade de colocar em prática nossas
resoluções está diretamente relacionada à nossa incapacidade de nos colocar em
primeiro lugar.
Passamos o ano colocando as metas dos outros na frente das
nossas, priorizando o bem-estar, o sucesso, os sonhos dos outros e não os
nossos, dizendo sim para os outros e não para nós.
Resolvi, portanto, deletar a lista. Para 2025,
minha única meta é me colocar um pouco mais em primeiro lugar.
Semana passada, ouvindo música enquanto arrumava a
mala para a nossa viagem de fim de ano, tocou aquela do Lulu Santos que diz:
"Eu vejo um novo começo de era
De gente fina, elegante e sincera
Com habilidade pra dizer
Mais sim do que não, não, não"
Lulu claramente não é mulher e, portanto, me
autorizo a discordar de seus versos. Para 2025, desejo para todas nós a
habilidade de dizer mais não do que sim. Ou, pelo menos, mais não para os
outros e mais sim para nós mesmas.
JOANNA MOURA - publicitária, escritora e
produtora de conteúdo. Autora de "E Se Eu Parasse de Comprar? O Ano Que
Fiquei Fora da Moda". Escreve sobre moda, consumo consciente e maternidade