Depois de quatro meses de altas
seguidas e uma valorização de mais de 40% desde março deste ano, o principal
índice da Bolsa de Valores brasileira B3 (Ibovespa) emenda o segundo mês de
queda. Depois de cair 3,44% em agosto, o Ibovespa chega na metade de setembro
caindo mais de 1%.
Você provavelmente já ouviu aquele
ditado: gato escaldado tem medo de água fria. Investidores começam a se
perguntar se o mercado estaria estressado, com medo do que ocorreu em março
deste ano.
Mas será que as quedas recentes do
Ibovespa estariam fora do padrão de oscilação de mercado? Por exemplo, se o
Ibovespa cai 1,5% em um dia qualquer isso foge do normal? E a queda do mês
passado de 3,44% seria um desvio das oscilações naturais de mercados de risco?
Quanto você acha que seria a
probabilidade de em um dia qualquer o Ibovespa ter uma oscilação que esteja no
intervalo de -1,80% a +1,80%?
a) 28%
b) 38%
c) 48%
d) 58%
e) 68%
De fato, o que foi diferente do
padrão foram fortes as altas nos quatro meses subsequentes entre abril e julho.
Nos últimos vinte anos, apenas em dois outros momentos ocorreram altas de mais
de 3% ao mês em quatro meses seguidos. Elas ocorreram em 2003 e 2007.
Nos últimos vinte anos, somente
nesse ano de 2020 tivemos altas de mais de 8% ao mês seguidas por quatro meses.
Portanto, se engana quem acha que a queda foi fora do normal, mas as altas
recentes é que fugiram do padrão.
Desvalorizações maiores que 20%
como as que ocorreram em março deste ano e que assustaram a todos os
investidores possuem uma probabilidade baixíssima de ocorrência. Só ocorreram
duas nos últimos vinte anos, sendo a outra na última crise financeira de 2008.
Respondendo à pergunta acima,
considerando que os retornos seguem uma distribuição Normal, há cerca de 68% de
probabilidade de o retorno do Ibovespa em um dia qualquer estar entre -1,8% e
+1,8%. Isso pode ser observado no gráfico abaixo.
O gráfico abaixo mostra a
distribuição dos retornos diários do Ibovespa nos últimos vinte anos. Cada
barra mostra quantos dias nas últimas duas décadas estiveram no intervalo de
variação mostrado no eixo inferior. As barras vermelhas mostram o intervalo
entre -1,8% e +1,8% ao dia. Perceba que elas formam a grande maioria.
Gráfico
de dispersão de frequência dos retornos diários. O retorno médio diário do
Ibovespa desde 2000 é pouco acima de zero e o desvio padrão (dispersão dos
retornos em relação à esta média) é de 1,8% ao dia, neste período. Em
vermelho, há o intervalo de retornos com 68% de probabilidade de ocorrência.
Quando consideramos retornos
mensais, há a mesma probabilidade de 68% do retorno do Ibovespa estar entre -6%
e +8% em um mês qualquer. Isso pode ser observado no gráfico a seguir. Este
intervalo é destacado na cor verde.
Gráfico
de dispersão de frequência dos retornos mensais do Ibovespa. O retorno médio
mensal do Ibovespa desde 2000 é de 1% e o desvio padrão (dispersão dos retornos
em relação à esta média) é de 7% ao mês. Em verde, há o intervalo de retornos
com 68% de probabilidade de ocorrência.
Logo, as quedas recentes do
Ibovespa estão dentro do intervalo normal de oscilação.
A dispersão dos retornos em relação
à média representa o risco, ou seja, a incerteza sobre os retornos futuros.
Quanto maior esta dispersão dos
retornos, maior é a incerteza, pois maior é este intervalo em que o retorno
pode se encontrar no futuro. Por exemplo, ações individuais, usualmente, têm
uma dispersão de retorno maior que a do Ibovespa, pois este é diversificado.
Veja abaixo uma tabela com o
intervalo em que um retorno mensal pode ocorrer com 68% de probabilidade para
algumas ações que formam o Ibovespa. Veja que o Ibovespa é o que possui a
menor dispersão, logo, o menor risco.
Intervalo
de oscilação mensal de algumas ações que formam a carteira do Ibovespa.
Considerando retornos normalmente distribuídos, há 68% de probabilidade de o
retorno mensal de uma ação estar no respectivo intervalo.
Não basta investir em ações
diferentes para ter diversificação. É preciso escolher ações considerando
menores correlações entre retornos.
É muito importante que o investidor
entenda que não é porque se investe em um ativo de risco que se obtém maior
retorno. Perceba que se fosse verdade que investir em ativo de risco
necessariamente produzisse maior retorno, então ele não seria mais um ativo de
risco.
A possibilidade e não a certeza de
se ganhar mais é justamente a compensação por se correr o risco de se perder.
Portanto, tenha na sua carteira o montante adequado de risco e de preferência
em produtos diversificados como fundos de investimento, pois o risco é
controlado pelo gestor.
Michael Viriato - professor de finanças do Insper e
sócio fundador da Casa do Investidor.