A
minha primeira parcela de morte aconteceu quando acreditei que existiam vidas
mais importantes e preciosas do que a minha.
O
mais estranho é que eu chamava isso de humildade. Nunca pensei na possibilidade
do auto abandono.
Morri
mais um pouquinho no dia em que acreditei em vida ideal, estável, segura e
confortável.
Passei
a não saber lidar com as mudanças.
Elas
me aterrorizavam.
Depois
vieram outras mortes.
Recordo-me
que comecei a perder gotículas de vida diária, desde que passei a consultar os
meus medos ao invés do meu coração.
Daí em diante comecei a agonizar mais
rápido e a ser possuída por uma sucessão de pequenas mortes.
Morri
no dia em que meus lábios disseram, não. Enquanto o meu coração gritava, sim!
Morri
no dia em que abandonei um projeto pela metade por pura falta de disciplina.
Morri
no dia em que me entreguei à preguiça.
No
dia em que decidir ser ignorante, bulímica, cruel, egoísta e desumana comigo
mesma.
Você
pensa que não decide essas coisas?
Lamento.
Decide sim!
Sempre
que você troca uma vida saudável por vícios, gulodice, sedentarismo, drogas e
alienação intelectual, emocional, espiritual, cultural ou financeira, você está
fazendo uma escolha entre viver e morrer.
Morri
no dia em que decidi ficar em um relacionamento ruim, apenas para não ficar só.
Mais
tarde percebi que troquei afeto por comodismo e amor por amargura.
Morri
outra vez, no dia em que abri mão dos meus sonhos por um suposto amor.
Confundi
relacionamento com posse e ciúme com zelo.
Morri
no dia em que acreditei na crítica de pessoas cruéis.
A
pior delas? Eu mesma.
Morri
no dia em que me tornei escrava das minhas indecisões.
No
dia em que prestei mais atenção às minhas rugas do que aos meus sorrisos.
Morri
no dia que invejei , fofoquei e difamei.
Sequer
percebi o quanto havia me tornado uma vampira da felicidade alheia.
Morri
no dia que acreditei que preço era mais importante do que valor.
Morri
no dia em que me tornei competitiva e fiquei cega para a beleza da
singularidade humana.
Morri
no dia em que troquei o hoje pelo amanhã.
Quer
saber o mais estranho? O amanhã não chegou.
Ficou
vazio… Sem história, música ou cor.
Não
morri de causas naturais.
Fui
assassinada todos os dias.
As
razões desses abandonos foram uma sucessão de desculpas e equívocos.
Mas
ainda assim foram decisões.
O
mais irônico de tudo isso?
As
pessoas que vivem bem não tem medo da morte real.
As que vivem mal é que padecem
desse sofrimento, embora já estejam mortas.
É
dessas que me despeço.
Assinado:
A Coragem
Texto
de Lígia Guerra