Quer uma vida longa? É só não morrer


Quer uma vida longa? É só não morrer

A finitude da vida é o que nos salva dela

Qual é a fórmula para se chegar aos 100 anos

Seu João, mineiro de Alterosa, revelou o seu segredo de longevidade quando completou um século de vida: "É só não morrer". 

A resposta do centenário dada em uma entrevista de 2019 que virou meme, embora pareça ser singela, é a mais sofisticada das filosofias e nos faz questionar: o que fazemos nas nossas vidas para "não morrer"?

Eu responderia: é só não morrer antes de morrer.

É só não adiar a vida para amanhã. É só buscar significado todos os dias. 

É só escolher em quais brigas entrar e pelo que vale lutar.

É só procurar motivos pelos quais a vida continua valer a pena. 

É só ficar no meio de pessoas que nos fazem bem. 

É só ter amigos. 

É só ter amores. É conseguir "só" tudo isso.

Mas será que a vida é curta demais para tanto, ou somos nós que a tornamos breve? Essa é a provocação de Sêneca em seu ensaio De Brevitate Vitae (Sobre a Brevidade da Vida). 

O filósofo nos alerta: os homens são mesquinhos com a sua fortuna, mas quando se trata do tempo o desperdiçam com extravagância. E acrescenta: devemos ser "miseráveis" (palavras dele) com o tempo e saber como usá-lo sem desperdícios.

Desperdiçamos nosso tempo quando agimos como imortais – e, assim, acabamos estreitando a vida. 

É esse o grande paradoxo: sabemos que teremos um fim, mas vivemos como se fosse para sempre, como se o tempo fosse uma fonte inesgotável. 

É a fórmula automática que encontramos para nos defender da ideia, que humanamente parece terrível, de que somos mortais.

Entretanto, o que se apresenta como uma limitação é o que mais liberta. A finitude da vida é o que nos salva dela. 

A vida é preciosa justamente por não ser eterna, é isso que nos impele a viver com plenitude e a não deixar que a vida seja breve.

Viver com indiferença, é tornar a vida breve. Desperdiçar a vida tentando ser igual aos outros, fazer todos os dias a mesma coisa, trilhar sempre o mesmo caminho é encurtar o percurso. 

Não aceitar as rugas, as marcas do tempo e condenar o próprio corpo é desonrar o tempo que vivemos. Acorrentar a felicidade, não se permitir momentos de tristeza, se levar a sério demais, ter medo de errar é tornar a vida chata. 

Pretender ser produtivo o tempo todo e privar-se de momentos de diversão é roubar a graça da vida. "Não há nada com que o homem ocupado esteja menos ocupado do que viver", escreveu Sêneca.

Mas as perguntas insistem. Lutamos tanto por anos extras pelas razões certas? Por que –e para que– queremos viver tanto?

Temos bastante tempo para encontrar as respostas, porque o sonho de viver até os 120 está mais perto do que nunca. Inauguramos a chamada revolução da longevidade

Nas próximas décadas, estima-se que a metade das crianças que têm hoje cinco anos vivam, e bem, até os 100. Muitos de nós, que já passamos do que seria a metade da vida, com sorte, viveremos muito mais do que nossos pais e avós.

Morremos e renascemos todos os dias. Quem não aceita morrer um pouco para se reciclar, envelhece antes do tempo, mantém células mortas sobre um corpo vivo. 

É essa a finalidade do tempo: ele flui para que as pessoas se renovem, para que ideias circulem, para que nós não fiquemos estáticos durante o longo –ou curto– tempo que temos.

O segredo da longevidade é saber viver bem, para não morrermos antes do nosso fim.

BECKY S. KORICH - advogada, escritora e dramaturga, é autora de 'Caos e Amor'

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