Superapps
permitem que empresas criem produtos e serviços dentro de um app já consolidado
Uma das tendências para 2020 foi inventada na China.
Trata-se dos superapps, os superaplicativos que permitem que empresas criem
produtos e serviços dentro de um aplicativo já consolidado.
O modelo lembra o filme “A Origem” (“Inception”, 2010).
Nele, os personagens sonham dentro de um sonho que estava dentro de outro
sonho. Nos superapps é assim. Todo celular tem uma loja de aplicativos. E agora
os próprios aplicativos vão ter suas lojas de apps também.
Os primeiros superapps foram chineses, como o WeChat, o
AliPay e a Meituan. O primeiro surgiu como aplicativo de mensagens. Depois incorporou a possibilidade de fazer pagamentos.
Hoje é possível pedir um táxi, paquerar, usar rede social, pedir comida, fazer
compras ou entregas, tudo sem sair do WeChat. É como se a internet tivesse
migrado para dentro dele.
A lição que pode ser aprendida é que a competição agora
não é mais por quem faz o aplicativo, mas sim por quem cria o ecossistema mais
abrangente e atraente. A regra agora é: ou você está criando seu próprio
ecossistema ou a sua empresa estará dentro de um ecossistema criado por alguém.
No mercado brasileiro, o primeiro aplicativo a se
posicionar como superapp é o colombiano Rappi.
Ele surgiu como um serviço de entrega. Agora inclui patinetes e em breve
serviços financeiros.
Sobre isso, é curioso ver que os bancos no Brasil deixaram passar a oportunidade de se tornar superapps, como
fez o AliPay. Para isso, a receita teria sido abrir suas plataformas e dados
para que desenvolvedores externos pudessem desenvolver serviços dentro de suas
plataformas. Não aconteceu. Ao contrário, a maioria dos bancos resistiu o
quanto pode a esse tipo de abertura.
Foi preciso o Banco Central iniciar um processo de abertura de dados (“open banking”) de cima para baixo. Em outras
palavras, poderiam ter criado um ecossistema a partir do seu alcance em
pagamentos. E agora correm o risco de precisarem se integrar ao ecossistema de
outros.
Os superapps são novidade, mas a forma é antiga. Vale
lembrar que o próprio Facebook cresceu abrindo sua plataforma para
desenvolvedores externos.
Muitos vão se lembrar da empresa Zynga, que fazia jogos
dentro do Facebook como “FarmVille” e “Mafia Wars”. Esses games foram por muito
tempo responsáveis por uma boa parte da receita da empresa, antes que ele
estruturasse sua plataforma de publicidade. Abrir o Facebook para terceiros foi
o que fez que a plataforma adquirisse ainda mais usuários.
Homem paquistanês usa aplicativo
para escanear QR code para pagar conta de restaurante em Islamabad
Considerando que um dos objetivos do Brasil deveria ser
se tornar um grande produtor de tecnologia e inovação —e não apenas um grande
consumidor como agora—, competir por ecossistemas passa a ser tarefa de
interesse nacional. Nessa competição, como o Rappi demonstra, já estamos
perdendo para a Colômbia.
Do ponto de vista geopolítico, o Brasil é um dos países
mais fechados do mundo. É curioso ver que essa mesma característica se reproduz
na forma como pensamos aplicações na internet. Para crescer globalmente, em
ambos os casos, é preciso se abrir.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e
Sociedade do Rio de Janeiro.
Fonte: coluna jornal FSP