Desafios da saúde, que se arrastam por anos e afligem populações, não se resolvem somente com inovação e novas tecnologias Por trás dos altos custos e baixa produtividade está a desorganização dos processos, um nó mais difícil de desatar. Os danos podem ser medidos pelos prejuízos sofridos pelo sistema. Segundo estudos do Banco Mundial e da Organização Mundial da Saúde, o desperdício na saúde no país fica entre R$ 10 bilhões e R$ 15 bilhões ao ano.
Paciente, médico e, sobretudo, a burocracia do sistema contribuem, cada um à sua maneira, para esse desperdício. “O paciente hoje faz um exame aqui, amanhã faz outro em outro lugar. Ele já tem o resultado nas mãos, mas não leva ao médico. O exame se perde e o médico pede outro. Se nós pensarmos nesses desperdícios do sistema, já será uma grande evolução”, afirma o secretário de atenção especializada à saúde do Ministério da Saúde, Francisco Figueiredo.
O secretário cita um recurso que permite a ele, a partir de gráficos e painéis em sua sala, acompanhar indicadores de 60 hospitais. Um dos indicadores é a ocupação de urgência, o outro, a média de permanência nessa urgência. “Com esses dados, em três meses, a gente esvazia uma urgência desses hospitais, apenas mudando os processos”, afirmou. O secretário prometeu mais. “Provavelmente já em novembro, o sistema dirá ao gestor, com três horas de antecedência, se sua urgência estará superlotada. Um aviso dirá ao gestor que coloque mais uma enfermeira, agora, na sua classificação de risco, do contrário terá um problema de fila. E que coloque mais um médico para atender, senão terá sérias dificuldades. Vamos avisar três horas antes”, garantiu.
A urgência é apenas uma das frentes em que os processos emperram a máquina da saúde. A burocracia e o desperdício aparecem no serviço de imunização, onde o paciente recebe vacina em dobro porque perdeu a carteira e o posto não tem registro. Ou na assistência farmacêutica, em que o paciente vai a um médico, sai com a receita, retira o remédio, mas em vez de tomá-lo, vai a um segundo médico, que faz nova prescrição. O primeiro medicamento é jogado fora. Um prontuário único é, há muito tempo, apontado como solução. “Nós já estamos prontos, com um conjunto de dados interligados. Todas essas questões, a partir do momento em que tivermos um prontuário único, tendem a ser resolvidas.”
Para o secretário, não se melhora o processo sem decisão, e não há tomada de decisão sem informação. Por exemplo, são 43 mil Unidades Básicas de Saúde no país e mais de 300 mil agentes comunitários. Mas só 30% das UBSs estão informatizadas. “Como se toma uma decisão sem ter um melhor nível de informação?”, pergunta. Já há alguns casos que deram certo. A implantação do serviço Regula+Brasil, por exemplo, que facilita a comunicação entre médicos dos diferentes níveis de atenção, reduziu em 40% o número de encaminhamentos da atenção primária para a secundária. A pesquisa foi feita em cinco capitais. Nas consultas de especialidades, 47% dos pacientes não comparecem às consultas. “O paciente agenda e não vai. A espera para outra consulta é longa”, disse o secretário.
A saúde suplementar, que é o outro lado da moeda da saúde pública no país, também se debate com a necessidade de renovação nos processos. “O que vem sendo tratado como inovação no setor privado, na verdade, já se discute há décadas. A questão da atenção primária não é novidade, é apenas uma mudança de processo de trabalho”, diz Leandro Fonseca, diretor da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Fonte: Valor Econômico