A atuação do estado na gestão da longevidade nos fundos de pensão


Desde o final da década de 90, quando os planos de contribuição definida começaram a ganhar espaço no mercado previdenciário brasileiro, os participantes dos fundos de pensão passaram a ter que lidar com uma nova realidade. A coletividade e mutualismo dos planos de benefício definido deram lugar à individualidade dos planos de contribuição definida e, com isso, as rendas vitalícias cederam espaço às rendas temporárias, vinculadas ao saldo de conta constituído durante o período laborativo.

O tempo decorrido desde que os primeiros planos de contribuição definida foram implantados não nos permite, ainda, uma análise precisa do efeito dessas rendas não vitalícias. Embora já tenhamos um grande universo de assistidos recebendo benefícios em contribuição definida, essas rendas começaram a ser pagas há pouco tempo e, por isso, em geral, ainda continuam sendo pagas.

Estudos revelam que, em planos de contribuição definida, os participantes tendem a solicitar seus benefícios em formas que lhes proporcionem uma maior renda, ainda que esta tenha uma expectativa de se exaurir em tempo inferior à expectativa de sobrevida do assistido.

Por outro lado, os planos de benefício definido já, há algum tempo, sentem os efeitos da elevação da longevidade. Alterações das tábuas de mortalidade dos planos BD fizeram com que as obrigações perante os participantes e assistidos se elevassem. O gráfico a seguir demonstra a elevação média nas provisões matemáticas de um assistido de um plano BD, aos 60 anos, em face de alterações de tábuas de mortalidade mais utilizadas no Brasil nas últimas décadas.



Fonte: elaboração do autor

Nota: considerando-se taxa de juros fixa de 5% ao ano e tábuas masculinas.

Observa-se, no gráfico apresentado, que, apenas em trocas de tábuas de mortalidade, o passivo atuarial de um assistido aos 60 anos teve uma elevação acumulada de 25%, num movimento de atualizações de expectativas de sobrevida que foi realizado pelas entidades fechadas de previdência complementar em um período médio de aproximadamente 20 anos. Isso representa o peso do aumento da longevidade nos fundos de pensão, o que, por um lado, é um comemorável ganho social, mas, por outro, representa um grande desafio.

Tanto para os planos BD quanto para os planos CD (assim como nas modalidades intermediárias), o aumento da longevidade, se não bem gerido, pode trazer consequências que podem ser danosas aos participantes e assistidos. E é fato que o brasileiro possui uma cultura de buscar a tutela estatal quando se vê necessitado. Isso faz com que o estado deva estar muito atento a essa discussão e formule políticas de proteção e fomento à gestão do risco de longevidade.

A recente publicação da Resolução CNPC nº 17, de 30 de março de 2015, foi um marco para a gestão da longevidade dos fundos de pensão. Trata-se de uma norma autorizativa, que dá aos fundos de pensão grande liberdade para contratar produtos de seguradoras, dentre eles os que fornecem proteção à longevidade, aplicáveis às diversas modalidades de planos.

Referida Resolução revogou aquela editada pelo então CGPC, de nº 10, que vigorou por exatos 11 anos, tendo sido publicada em 30 de março de 2004. Vale recordar que à época, após a publicação dessa Resolução do então Conselho de Gestão da Previdência Complementar, o Conselho Nacional de Seguros Privados editou uma norma complementar. Trata-se da Resolução CNPS nº 119, de 22 de dezembro de 2004.

Considerando o escopo mais ampliado da Resolução CNPC nº 17,  quando comparada com sua antecessora, observa-se uma necessidade de se realizar uma atualização normativa também a nível de CNSP/Susep, compatibilizando as normas aplicáveis às seguradoras ao novo aparato normativo dos fundos de pensão. Neste particular, é de grande importância que Previc e Susep trabalhem juntas na construção de uma Instrução Normativa, de modo a detalhar a forma na qual tais operações de seguro devem se desenvolver.

Essa sinergia entre os órgãos reguladores – CNPC e CNSP –, assim como entre os órgãos fiscalizadores – Previc e Susep – mostra-se essencial, mas não suficiente, para que a atuação estatal possa se dar seguindo seu objetivo, de oferecer proteção aos participantes e assistidos, e, ao mesmo tempo, acompanhar as necessidades mercadológicas inerentes à nova realidade enfrentada pelos fundos de pensão.

Além de aperfeiçoar a legislação, a atuação do estado pode se dar, também, de maneira proativa. Sabendo-se da grande importância dos fundos de pensão para a economia nacional e do grande número de participantes e assistidos envolvidos neste sistema, os quais estão sujeitos ao risco de longevidade, o governo pode atuar, também, por meio de suas empresas públicas, sociedades de economia mista, e outras empresas por ele controladas, direta ou indiretamente, exercendo um papel de vanguarda neste novo segmento securitário que se solidifica, que é o de soluções para a longevidade focando nas necessidades dos fundos de pensão.

O mundo nos mostra que há uma série de produtos securitários, desde anuidades a swaps, que podem ser desenvolvidos para que seja possível gerir melhor o risco de longevidade pelos fundos de pensão. Isso demonstra que o amadurecimento deste segmento no Brasil é questão de vontade e tempo. Este assunto será melhor abordado no próximo artigo desta série especial que aborda o tema principal do 5º Evento GAMA de Previdência Complementar: “Longevidade: oportunidades e desafios”.

Em conclusão, espera-se, do estado, uma atuação bastante atenta na formulação de políticas voltadas à gestão da longevidade dos fundos de pensão, integrando os órgãos de governo reguladores e fiscalizadores dos fundos de pensão e das seguradoras; permitindo a realização de operações que proporcionem maior proteção aos participantes e assistidos; e, quando assim julgar pertinente, atuando de forma direta no oferecimento de produtos voltados aos fundos de pensão, dada a importância deste segmento para a seguridade social e economia nacional.

Antônio Fernando Gazzoni - atuário,  Administrador de Empresas, especializado em Fundos de Pensão e Gestão de Investimentos Alternativos, pela The Wharton School, certificado pelo Instituto de Certificação dos Profissionais de Seguridade Social – ICSS, é diretor presidente da GAMA Consultores Associados |

João Marcelo Barros Leal M. Carvalho - Atuário, com MBA em Finanças e graduando em Direito, é Diretor de Operações e Previdência da GAMA Consultores Associados.

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