Eu me atrevo a dizer que poucos investidores se dão ao trabalho
de ler o prospecto de um fundo de investimento antes de aderir.
Induzido a comprar por indicação do contato na instituição
financeira ou seduzido pela rentabilidade passada do produto, o investidor
deposita seu dinheiro em um fundo cuja política de investimento desconhece.
Você já teve a curiosidade de ler a bula de um medicamento que
você consome regularmente por indicação médica? Composição; precauções e
advertências; dose que pode ser ingerida; restrições de uso em idosos, crianças
e outros grupos de risco; efeitos colaterais. Se você estiver se automedicando,
é possível que desista de ingerir o remédio diante de tantos
"perigos".
Com a receita médica em mãos, vai ligar para o médico e
perguntar se é isso mesmo ou se existe outra forma de tratar um mal sem
provocar outro.
Acho a analogia de medicamentos com investimentos muito adequada
e permite que o investidor tenha o entendimento de tudo o que é preciso saber
antes de mergulhar de cabeça em uma aplicação financeira.
Quem lê o prospecto talvez não compre porque se dá conta de que
não está disposto a correr os riscos para tentar alcançar o objetivo proposto.
Quem decide comprar o faz ciente dos riscos aos quais está exposto e saberá que
a rentabilidade futura do investimento passa longe do que o passado
proporcionou.
COMPOSIÇÃO
Indica os ativos que podem compor a carteira do fundo de
investimento e, muitas vezes, o percentual mínimo e máximo do patrimônio que
pode ser alocado em cada tipo.
O prospecto explica se a política de investimento será
especulativa, buscando ganhar acima da taxa de juros básica da economia, ou se
a estratégia será de proteção ou de aderência a um determinado parâmetro de
referência.
Verifique se a política do fundo é compatível com o seu objetivo
de investimento. Não faz sentido, por exemplo, optar por um fundo multimercado,
de perfil agressivo e volátil, para aplicar o dinheiro da sua reserva
financeira. Mesmo que a rentabilidade dos últimos meses tenha sido muita boa.
POSOLOGIA
Verifique que dose desse investimento faz sentido para atingir
seu objetivo, no horizonte de tempo definido, e aderente ao seu perfil de
risco. Aceitar risco no mercado acionário, por exemplo, não significa que todo
o seu dinheiro pode estar nesse mercado; seria muito arriscado.
Investir em juros de taxa prefixada, outro exemplo, só faz
sentido em cenário de queda na taxa de juros.
Procure uma diversificação adequada, doses menores de dois ou
três tipos de fundos, para reduzir risco e atingir objetivos diferentes.
O dinheiro da viagem ao exterior estará em um fundo cambial, o
da aposentadoria fica bem em um fundo de inflação, assim como um fundo DI é o
recomendável para investir sua reserva financeira que aceita pouco risco e
precisa de liquidez diária.
RISCOS
Os efeitos colaterais, indesejados e imprevisíveis, são
decorrentes dos riscos inerentes aos ativos que compõem a carteira do fundo.
Títulos privados indicam que o investidor estará exposto ao
risco de crédito, possibilidade de o emissor não pagar juros ou deixar de
resgatar o título no vencimento.
Investimento em ações submete o investidor ao risco do mercado acionário que
reflete o risco sistemático da economia como um todo além do risco específico
dos setores das empresas cujas ações compõem a carteira.
Risco de juros e índices de inflação remete a uma carteira que,
embora denominada de "renda fixa", expõe o investidor a maior
flutuação de preços; quanto maior o prazo da carteira, maior a exposição a esse
risco.
Ativos cambiais, investimentos no exterior e derivativos
completam o cardápio de aplicações que podem fazer parte da carteira de um
fundo de investimento.
A ESCOLHA
Não existe o "melhor remédio". Cada um é adequado para
curar ou prevenir determinado mal. No mundo das aplicações financeiras, não é
diferente. Não pergunte para o gerente do banco qual é o "melhor
investimento". Costumo dizer que é uma pergunta irresponsável e a
resposta, se fornecida, mais irresponsável ainda. Pouco provável que a melhor
opção de investimento para mim seja, também, sua melhor opção. Ninguém melhor
do que você para saber o que mais lhe convém.
E lembre-se de que, ao aderir a um fundo de investimento, você
afirma ter lido e aceitar os termos previstos no prospecto.
Os riscos, que trazem ganhos e perdas, são exclusivamente seus;
o administrador não responde por eles, nem o FGC (Fundo Garantidor de
Créditos). Portanto, faça uma leitura atenta antes de aderir, evitando
surpresas desagradáveis e ter que admitir que "não sabia".
Marcia Dessen – sócia do BMI (Brazilian
Management Institute), diretora do IBCPF (Instituto Brasileiro de Certificação
de Profissionais Financeiros, autora do livro “Finanças Pessoais: o que fazer
com meu dinheiro”.
Fonte: coluna semanal no jornal FSP