Opções para quem não bebe são poucas, quase
inexistentes, em cardápios
Não beber não é só
dizer 'não', é lidar com o peso de uma cultura que insiste em associar o álcool
ao prazer
Viver sem álcool em uma sociedade que o enaltece é
um exercício constante. Para quem, como eu, é alcoólatra em recuperação, cada ida a um
restaurante pode ser uma experiência desconfortável.
Não tanto pelo risco de
recaída, embora ele exista, mas por constatar, repetidamente, como o álcool
ocupa um espaço privilegiado em quase todos os cardápios. E as opções para quem
não bebe são, na maioria das vezes, modestas, desinteressantes e quase
inexistentes.
As opções de bebidas de grande parte dos
restaurantes são uma celebração ao álcool. Já notaram? Há uma carta de vinhos
extensa, muitas vezes classificados por país, tipo de uva, harmonização com
pratos.
Cervejas artesanais de todas as origens, destilados especiais etc. Já
as bebidas sem álcool quase sempre se
resumem a refrigerantes, sucos prontos (em geral de caixinha), chá gelado
industrializado ou a tradicional limonada. É muito raro aparecer alguma coisa
diferente.
É frustrante. O espaço social do álcool é
avassalador, ele não poupa nenhum ambiente. Está presente nos brindes, nas
promoções, na decoração, nas sugestões dos garçons, nos eventos sazonais.
Não
beber não é só dizer "não", é também lidar com o peso de uma cultura
que insiste em associar o álcool ao prazer. Como se a alegria fosse,
obrigatoriamente, etílica.
Mais do que desconfortável, essa limitação é
excludente. É como se não levassem em conta quem decidiu, por qualquer razão,
viver sem álcool.
Os cardápios, na maioria dos casos, parecem desenhados
exclusivamente para quem bebe. E a ausência de bebidas sem álcool reforça essa
sensação: quem não bebe que se contente com o mínimo.
Acho uma chatice. Folhear páginas e mais páginas
dedicadas a vinhos, cervejas e drinques, enquanto a seção "sem
álcool" ocupa uma linha, se tanto, só comprova que esse país não foi feito
para quem está ou quer ficar sóbrio.
Mesmo depois de muito tempo longe da
bebida, essa constatação me cansa. Me entristece, às vezes. E, sim, me revolta.
Vale dizer: não estou defendendo cardápios sem
álcool, longe disso. É um chamado.
Assim como há menus para pessoas com
restrições alimentares —vegetarianas, veganas, com algum tipo de intolerância,
por que não oferecer opções interessantes para quem não bebe álcool?
Por que
não valorizar bebidas com ingredientes frescos, combinações inusitadas,
apresentações charmosas? É só pensar na variedade de frutas que temos: seria
muito fácil incrementar as opções de sucos.
Porque
nós existimos e somos muitos. Pessoas em recuperação do alcoolismo. Ou que não
gostam de álcool, ou que estão tomando algum medicamento. Mulheres grávidas.
Adolescentes. Gente que simplesmente quer ter o direito de sair, se divertir,
comer bem e beber algo bom, sem álcool.
ALICE S. – blog Vida de
Alcoólatra