Hora de dizer adeus às senhas.
De
solução, login e senha hoje viraram problema.
No início da década 1960, o físico Fernando José
Corbató tinha um problema nas mãos.
Como permitir que pessoas diferentes
pudessem compartilhar uma mesma rede de computadores, identificando cada
pessoa?
Corbató teve então uma ideia que revolucionaria
nossas vidas. Ele inventou o sistema de login e senha, que rapidamente se
tornou a principal forma de autenticação da internet.
Corte para 2022. A invenção de Corbató tornou-se
completamente infernal no mundo de hoje. Logins e senhas atazanam a vida de
todas as pessoas conectadas no planeta.
Para piorar, a maioria das pessoas
adota a mesma senha para vários sites diferentes. Ou, ainda, usa senhas
fracas, fáceis de serem adivinhadas ou quebradas.
Isso sem contar os frequentes vazamentos que revelam senhas publicamente. Por
exemplo, na semana passada, circulou um arquivo na internet com o login e a
senha de mais de 1.500 emails do governo federal.
Uma vergonha, e uma
ferramenta perfeita para falsários aplicarem golpes e outros tipos de ataque.
Em outras palavras, boa parte da segurança do mundo
digital de 2022 depende de uma tecnologia inventada quando os Beatles
não tinham sequer lançado o primeiro álbum.
Em razão disso está se formando um consenso de que
está na hora de acabar com o modelo de login e senha e criar uma nova forma de autenticação digital.
Há muitas alternativas para isso surgindo no
horizonte. Hoje já é comum, por exemplo, que vários sites e aplicativos exijam
apenas a biometria da pessoa para permitir o acesso no dia a dia.
Seja a
identificação da impressão digital no celular, seja o reconhecimento facial.
Além disso, os aplicativos de autenticação começam
a se popularizar. Ao entrar em um determinado serviço, o usuário tem de
confirmar o acesso por meio do app, ou ainda digitar um código único gerado por
ele na hora.
Mas o golpe mais forte contra as senhas está sendo
construído por meio da coalizão da indústria de tecnologia chamada Aliança Fido
(Fast Identity Online, ou identidade online rápida).
Essa coalizão lançou neste
ano um projeto técnico de substituir login e senha exclusivamente pelo telefone
celular.
Se a pessoa tiver seu celular em mãos, poderá ser autenticada por
biometria e com isso acessar qualquer site online sem a necessidade de digitar
senhas.
O sistema prevê o uso de uma "chave
mestra" que fica guardada no aparelho de forma segura.
Essa chave abriria
então as portas para qualquer serviço online, sem a necessidade de lembrar
senhas ou nomes de login.
Considerando que a Aliança Fido tem como membros
empresas como Google, Microsoft, Meta, Amazon e várias
outras, a mudança pode ser abrangente.
A previsão é que já em 2023 esse novo sistema
comece a se tornar comum. É claro que ele também traz questões.
E se o celular
for roubado? Ou perdido? Ou esquecido aberto em algum lugar?
Essas perguntas fazem lembrar que a questão da
identidade digital é uma das mais importantes desta década.
Há vários modelos
competindo entre si, muitos inclusive usando blockchains e tecnologias
descentralizadas.
Nesse sentido, uma solução definitiva ainda vai demorar a
acontecer.
Apesar disso, é bom aproveitar 2022 para dizer
adeus. Pode ser que este seja um dos últimos anos em que a invenção de Corbató
continuará a infernizar nossas vidas.
RONALDO LEMOS - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e
Sociedade do Rio de Janeiro