Processo administrativo sancionador e responsabilidade de dirigentes


A responsabilidade dos conselheiros e dirigentes das entidades fechadas de previdência complementar não é absoluta, como podem entender.

O que a determinará será a avaliação, por critérios objetivos, da conduta desses gestores de poupança de terceiros, participantes e assistidos, na medida em que, para exercício das suas funções, devem observar a lei, o estatuto, o regulamento dos planos de benefícios, além de regras e princípios de governança que repousam na transparência, na diligência e na ética.

É a conduta no cargo e não o cargo em si que vai determinar ou não se há responsabilidade pelo resultado, pois é certo que estamos diante de atividade de meios e não de fim. Meios legal e estatutariamente adequados para traçar a política e os rumos da entidade e dos planos de benefícios, geri-los e fiscalizá-los, como funções do conselho deliberativo, da diretoria e do conselho fiscal, respectivamente.
Assim, a responsabilidade poderá se caracterizar diante do descumprimento da legislação e das normas internas, por ação ou omissão que contrariem as boas práticas, pelos atos ou pela falta deles que tenham concorrido para o resultado tipificado como infração pelo instrumento legal constitucionalmente adequado, ou seja, pela lei ordinária.

É a conduta de cada um dos conselheiros e dirigentes, individualmente, ou do colegiado, coletivamente, que deverá ser avaliada pelo agente público encarregado da fiscalização e enquadrada também por ele no tipo descrito na lei como infração administrativa. E sendo a conduta que deverá ser considerada – e não o resultado isoladamente –, estamos aqui invocando o princípio da responsabilidade subjetiva, acrescentando que ele se aplicará no sentido de se apurar se os meios utilizados e refletidos na conduta do conselheiro ou do dirigente foram legal e estatutariamente adequados à época dos fatos objeto de fiscalização, ou se, inadequados, foram determinantes para o resultado danoso.

De outro lado, a regra geral é a de que não há responsabilidade sem o resultado que o Estado, através do exercício do poder de polícia, quer evitar ou punir, de acordo com critérios e princípios do Direito Penal construído à época em que os riscos dos mecanismos modernos de captação e aplicação de reservas no mercado de capitais não estavam presentes ou não eram, sequer, pensados.

Atualmente, o Estado atua preventivamente para evitar riscos de toda ordem (ambiental, genética humana e alimentar, econômica e financeira, entre outras). Assim é que, no âmbito do processo administrativo sancionador, se o Estado pratica a supervisão baseada em riscos, de outro lado é absolutamente necessária a gestão baseada em riscos que devem ser, permanentemente identificados, avaliados, monitorados para a adoção de medidas preventivas e corretivas.

Com isso, penso que deve ser repensada a hipótese de dano ou prejuízo abstrato no âmbito do regime fechado de previdência complementar, não podendo ser desprezada também a ideia da presunção de culpa, adotada pela teoria da responsabilidade objetiva decorrentes da falta de utilização de meios adequados de avaliação de riscos ou da utilização de critérios de avaliação inconsistentes, por negligência, imprudência ou imperícia.

Por esse entendimento, a prova da ilicitude caberá ao órgão de fiscalização através dos seus agentes (motivação do ato administrativo), que deverão:
1. Identificar e descrever o ilícito por:
1.1. Infração à lei;
1.2. Infração ao estatuto;
1.3. Infração ao regulamento dos planos de benefícios;
1.4. Desatendimento de regras e princípios de práticas de governança; e
1.5. Grau de exposição a riscos como consequência da ação ou omissão culposas.
2. Individualizar a autoria:
2.1. Quem praticou ou deixou de praticar materialmente o fato tipificado na lei como infração; e
2.2. Se houve coautoria.
3. Indicar se a decisão foi compartilhada:
3.1. Apontar o colegiado e os membros presentes à reunião, bem como a qualidade (ou falta dela) do processo decisório.

Por fim, em análise curta e resumida, a responsabilidade de conselheiros e dirigentes de entidades fechadas de previdência complementar, como regra geral, estará legal e adequadamente fiscalizada se o agente público atender, além da motivação, os princípios de segurança jurídica, legalidade, tipicidade, igualdade, razoabilidade e ampla defesa. Lembro, todavia, que o Decreto nº 4.942/2003 não tipifica a exposição a riscos como infração; ao contrário, permite a correção de rumo se a manobra arriscada não tiver causado dano ou prejuízo ao plano de benefícios ou à entidade fechada de previdência complementar.

Aparecida Pagliarini – advogada, consultora em entidades fechadas de previdência complementar, membros das Comissões Técnicas Jurídicas Nacional e Regional Sudeste da Abrapp, sócia fundadora do Escritório Pagliarini Morales Advogados Associados.

Fonte: blog Investidor Institucional
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