Há uma conspiração entre as novas máquinas, alheia à maioria de
seus usuários. Discretamente, software e hardware estão trocando uma ideia, por
meio de aparelhos que combinam tecnologias de comunicação, computação e
baterias minúsculas para permitir a interação remota entre máquinas e processos
biológicos, físicos e químicos.
Pequenos sensores capturam temperaturas, localizações, níveis de
estoque, sinais biométricos, luminosidade, movimento, altitude, velocidade e
praticamente tudo que puder ser medido por uma máquina. Munidos de antenas ou
chips de telefonia, transmitem os dados para um servidor, onde são traduzidos e
analisados, gerando novas ações.
Chamada de machine-to-machine communication (M2M), essa conversa
entre máquinas faz parte do cotidiano há mais de 30 anos, na forma de códigos
de barras, sensores de segurança e uma infinidade de interfaces transparentes.
Alguns chamam essa nova revolução industrial de "internet
das coisas", outros de "cidade inteligente". O princípio de
sensores e comunicação é o mesmo, e seu funcionamento é uma tarefa bem mais
complicada do que pode sugerir a compra de brinquedinhos eletrônicos.
Os sensores são a faceta mais visível de um enorme sistema de
integração tecnológica, que envolve roteadores, servidores, aplicativos,
armazenamento na nuvem e "big data". Está mais para uma nova forma de
pensar a tecnologia do que para uma técnica, e seu impacto pode ser maior do
que o da internet.
Como toda obra de infraestrutura, sua instalação demanda
regulamentações e protocolos de segurança, a começar pelas redes de
comunicação. As atuais redes de telefonia móvel estão sobrecarregadas com
chamadas telefônicas, tráfego de dados e vídeo. Não é viável agregar a essa
rede os 50 bilhões de novos dispositivos que se imagina estarem conectados no
mundo até 2020, gerando cerca de 4 milhões de novos terabytes de tráfego.
Por isso muitos pensam em novas redes, usando frequências de
rádio inexploradas. Não se pode esquecer que um servidor com 99,5% de
confiabilidade ainda pode ficar quase dois dias fora do ar por ano.
Outro desafio é a integração. Os sensores de hoje usam
diferentes padrões, alguns usados simultaneamente. Essa Babel precisa ser
decodificada. Ninguém duvida que será.
Quando estiver em ação, essa integração de máquinas e inteligência
poderá ajudar a resolver boa parte dos grandes problemas de megalópoles como
São Paulo. Empresas de eletricidade, saneamento e abastecimento podem usar
sensores para evitar desperdícios e sobrecargas. A condição das ruas,
transporte público e trânsito pode ser monitorada e corrigida rapidamente.
Várias ações de governança, planejamento urbano e impacto ambiental poderão ter
ajuda de máquinas.
É claro que isso envolve perda de autonomia. No melhor estilo
ficção científica, a comunicação entre máquinas, associada a sistemas de
inteligência artificial, deverá ser programada para aprender novas soluções a
cada desafio, criando uma complexidade inimaginável.
Com o tempo, será inevitável que sua conversa desenvolva uma
gramática própria, incompreensível para nós. Ao se comunicarem, as máquinas
evoluem e se transformam em uma espécie social. Como nós.
Luli Radfahrer - professor-doutor de Comunicação Digital
da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP há 19 anos, trabalha com
internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das maiores agências de
publicidade do país, é hoje é consultor em inovação digital, com clientes no
Brasil, EUA, Europa e Oriente Médio. Autor do livro 'Enciclopédia da Nuvem', em que analisa 550 ferramentas e
serviços digitais para empresas.
Fonte: blog www.luli.com.br