Já tive muito parceiros na vida profissional, o maior deles,
Guga Valente, com quem lancei as pedras fundamentais de um dos maiores grupos
de comunicação e marketing do mundo. Mas nunca imaginei que chegaria a vez dos
engenheiros.
Antigamente, a ideia da engenharia não combinava com a da
criatividade. Mas esse erro de programação foi corrigido, e os engenheiros hoje
podem ser mais criativos do que alguns criativos.
Jeff Bezos, o gênio empreendedor do comercio on-line, fundador
da Amazon, é engenheiro e criativo. Ele criou o maior site de compras dos
Estados Unidos, que faturou mais de US$ 70 bilhões em 2013. E comprou, no ano
passado, o "Washington Post", um dos melhores jornais do mundo,
aplicando US$ 250 milhões do próprio bolso. A cabeça de engenheiro (e o tino
comercial) de Bezos vai aos poucos testando caminhos no venerado jornal,
injetando uma criatividade diferente que logo saberemos no que vai dar.
A reforma que Bezos empreende no "Post" inclui
misturar jornalistas e engenheiros na mesma Redação. Uns produzirão notícias,
outros, softwares e apps para divulgá-las. A aproximação dessas cabeças vai
virar notícia.
E não é só no jornalismo que os engenheiros estão chegando. Na
propaganda, eles são cada vez mais parte da paisagem complexa e promissora, de
contornos ainda impressionistas.
Dispomos hoje de recursos incríveis que o mercado nunca teve. As
informações sobre os consumidores e as formas de engajá-los são ferramentas que
um homem de marketing só pode agradecer. Afinal, não podemos transformar
facilidades em dificuldades.
Por outro lado, é muito mais desafiador porque é muito mais
complexo. Até pouco tempo atrás, tínhamos televisão, rádio, jornal, revista,
cinema e outdoor. Perto das possibilidades atuais, aquilo era trivial.
Hoje é possível divulgar uma campanha por meio de uma oferta
crescente de canais digitais e redes sociais. Para uma empresa se tornar
anunciante, ela não precisa das mesmas ideias nem das mesmas verbas de uma
década atrás.
Essa generosidade de meios e informações para trabalhar uma
campanha empurra a publicidade para a inovação e para a criação.
A evolução da comunicação tirou todo mundo da zona de conforto.
O dever de casa para a mulher e o homem de marketing é o preparo. Não se requer
de um executivo de marketing nos dias de hoje apenas talento, criatividade e
garra. Ele precisa de muito mais.
Ele precisa ter cabeça aberta, informação relevante,
metodologia, consciência de ROI (Retorno sobre Investimentos), visão
empresarial. E ele ainda precisa ser inovador. Criatividade não basta.
Criatividade é fazer de maneira surpreendente as mesmas coisas, e inovação é
fazer de maneira surpreendente coisas absolutamente novas.
Nesse caminho, as agências de publicidade precisam ter nas suas
equipes engenheiros e recursos humanos de outras naturezas. Elas não podem mais
se restringir aos publicitários.
O foco, ou o gasto, da publicidade está caminhando cada vez mais
para o mundo digital tecnológico. Os números, como diriam os engenheiros,
falam. A publicidade digital já corresponde a mais de um quarto dos gastos
totais de publicidade no mundo. É um número que cresce aceleradamente, chegando
a US$ 150 bilhões por ano.
A massificação da mobilidade (via smartphones e tablets) e a
expansão das redes sociais estão mudando a forma como nos relacionamos e
consumimos. Sua evolução determinará em boa parte a evolução da publicidade.
Isso tudo não quer dizer que você deva abandonar a publicidade e
prestar vestibular para engenharia. Uma grande ideia ainda é a melhor ideia que
se pode ter para uma campanha. A criatividade tem um poder inestimável. É a
faculdade humana mais parecida com as faculdades divinas. Deus é criador, e o
criativo também. Ele só precisa atualizar sua equação para incluir novos
fatores e apresentar novos resultados. Ele só precisa de uma reengenharia.
Nizan Guanaes - publicitário e presidente
do Grupo ABC, colunista do jornal Folha de São Paulo
Fonte: jornal FSP