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"Vejo muitos profissionais
de marketing com pouco conhecimento do uso de tecnologia e de matemática para
fazer a análise dos dados que as redes sociais e buscadores como o Google
trazem".
Doug Schust, presidente da empresa de marketing digital WSI, diz
que profissional precisa estar sempre à procura de alternativas novas para o
negócio
Quanto
vale para uma empresa uma "curtida" no Facebook? A complexidade dessa
pergunta passa pela capacitação do profissional designado para respondê-la. E
essa é a dificuldade enfrentada hoje pelo mercado, não só no Brasil, mas em
todo o mundo: a falta de pessoas qualificadas em marketing digital para dar as
respostas exigidas pelas companhias.
Se
considerarmos hipoteticamente alguém que tenha se especializado em marketing há
dez ou mesmo cinco anos e que tenha congelado seus conhecimentos, esse
indivíduo hoje dificilmente teria chance de obter uma colocação na área. Isso
porque os meios mudaram drasticamente - e, por consequência, as mensagens
também.
"As
empresas líderes já compreenderam muito bem o papel da internet e seus canais
de distribuição, venda e atendimento", avalia César Cesar,
diretor-executivo da unidade digital da Carvajal, consultoria de soluções de
informação via internet. "Não vejo mais a probabilidade de uma empresa
existir se não estiver trabalhando de forma plena esse meio. Cabe ao
profissional de marketing otimizá-lo."
Nos
últimos dois anos, a busca por gerentes na área cresceu 30% e a remuneração
dobrou, segundo recrutadores
Estar apto
a exercer esse papel requer um leque de competências mais amplo em relação ao
que estava acostumado o especialista em marketing, por assim dizer,
tradicional. Cesar identifica hoje dois perfis de profissional que ainda
precisam ser lapidados para produzir os resultados desejados. "Há os mais
seniores, diretores na faixa dos seus 50 anos, que aprenderam tudo sobre
distribuição, venda e mensagem publicitária, mas não conseguem colocar esses
conhecimentos a serviço de uma nova mídia", ressalta. "E há os analistas
de marketing mais jovens que têm o conhecimento do meio, mas não a experiência
necessária", diz.
O
diretor da Carvajal argumenta que é preciso fazer uma imersão nas mídias
digitais para captar todas as variáveis de seu potencial mercadológico - lição
de casa que não é cumprida por muitos profissionais. "Vejo colegas fazendo
campanhas no Facebook sem serem usuários da plataforma", exemplifica.
A
principal diferença entre o velho marketing e o novo está na maneira de se
relacionar com o cliente. "Não se trata mais de uma conversa de mão única,
mas de um diálogo", afirma Doug Schust, presidente da WSI, empresa
canadense de marketing digital com franquias em mais de 80 países. O segredo
para fazer a conversa fluir - e render frutos para as empresas - é engajar o
consumidor nessa interação.
Schust
esteve no Brasil em junho para ministrar palestras e cuidar da ampliação de seu
negócio no país, que começou com um franqueado há cinco anos e já soma 25 - a
meta é chegar a 200 em um período de três a cinco anos. O uso crescente de
smartphones pelo brasileiro, canal que tem se tornado a grande aposta de
contato das marcas com o público, é o maior deflagrador desse crescimento.
O
surgimento de novas plataformas indica outro aspecto fundamental no preparo da
mão de obra para enfrentar os desafios do marketing digital. "Seus
princípios estão sempre em movimento", define Marcelo Coutinho, professor
de comunicação e estratégia da Escola de Administração de Empresas de São Paulo
da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp) e diretor de inteligência de mercado do
portal Terra. "É um 'moving target'. Em 2002, falava-se em e-mail, banner,
website. Hoje o forte são as redes sociais e os aplicativos."
Essa
dinâmica pede uma busca constante por aprendizado. "É necessário ter
humildade e disponibilidade para estar constantemente se atualizando", diz
Coutinho. Isso significa estar aberto para ouvir pessoas que podem não ter um
conhecimento profundo de marketing, mas sabem muito de tecnologia ou são
bem-sucedidas em criar comunidades visitadas por milhões de usuários. "A
atualização envolve ainda cursos de uma natureza mais rápida e
estratégica". Escolas como a própria FGV e a Escola Superior de Propaganda
e Marketing (ESPM) oferecem esses programas.
A
predisposição para a procura incessante de conhecimento é o que Adilson
Batista, presidente da agência de comunicação digital Today, chama de espírito
empreendedor. Para ele, a única certeza desse novo ambiente é a mudança.
"O profissional tem de estar sempre atrás de novas alternativas de negócio,
do próximo movimento, da próxima tecnologia."
Tecnologia,
por sinal, é um termo chave para o marketing digital. "Vejo muitos
profissionais de marketing com pouco conhecimento do uso de tecnologia e de
matemática para fazer a análise dos dados que as redes sociais e buscadores
como o Google trazem", alerta Batista. "Eles deveriam saber ler essas
informações e, a partir delas, tomar decisões de relacionadas a ponto de
distribuição, preço e produto". A agilidade em processos decisórios
pressupõe ainda autonomia do profissional, que também precisa estar conectado
diretamente à alta gestão da companhia.
Tal é o
nível de integração requerido de técnicas de marketing com conhecimentos
matemáticos que o presidente da Today nomeia aquela que seria a área de formação
ideal para os novos tempos: matemarketing.
Assim,
empresas como a agência digital Jüssi buscam pessoas "que sejam analistas
de dados e que não apenas olhem números", define o sócio-fundador Henrique
Russowsky. "Não é um publicitário nem um engenheiro, é uma mistura dos
dois."
A
capacidade analítica é uma competência muito valorizada para o profissional de
marketing digital. Afinal, o acesso à informação está cada vez mais disponível,
mas faltam pessoas dentro das empresas que desenvolvam modelos para analisar os
dados e agir a partir disso. "A academia terá de oferecer algo mais
robusto nesse sentido", afirma Francisco Saraiva Junior, um dos
coordenadores do GVRedes, núcleo de estudos de redes sociais da FGV-Eaesp.
Batista,
da Today, afirma que apostar em cursos no exterior tem sido a solução
encontrada por quem acaba conseguindo as melhores colocações no mercado. Além
disso, na opinião de Saraiva, é importante que o profissional aprenda conceitos
de áreas como sociologia - "que estuda redes sociais há muito tempo"
- e antropologia.
Para
compensar as lacunas na capacitação acadêmica, as próprias empresas se veem
obrigadas a formar seus empregados. Isso ocorre, por exemplo, na Tricae, loja
virtual de produtos para crianças e gestantes. "Contrato muitos
engenheiros para a área de marketing", afirma um dos CEOs da startup,
Wilson Cimino. "Nós nos encarregamos de treiná-los nas partes mais
qualitativas e específicas de marketing e propaganda. Pouquíssimas pessoas de
marketing já migraram para o mundo on-line, e as que o fizeram têm deficiências
na questão analítica", justifica.
Se
faltam profissionais devidamente qualificados, é natural que os mais preparados
sejam bastante disputados - e, com isso, aumenta a remuneração média da
categoria no mercado de trabalho. "A busca por um gerente de marketing
digital cresceu de 30% a 40% nos últimos dois anos", estima Zuca
Palladino, gerente das divisões de marketing e varejo da empresa de
recrutamento Michael Page. "O acréscimo de escopo e de responsabilidade à
função fez com que o salário dobrasse. Em 2009, esse gerente ganhava na faixa
de R$ 7 mil a R$ 8 mil mensais", calcula. "Hoje, sua remuneração já
está em torno de R$ 14 mil a R$ 15 mil por mês."
Ressaltar
a carga de responsabilidade - e de predicados para atendê-la - inerente à
posição desse gestor contemporâneo é bastante pertinente para compreender a
pouca oferta de talentos. Afinal, não basta a ele ser fluente na linguagem do
meio virtual, mas continua sendo fundamental também dominar os velhos preceitos
mercadológicos. "O desafio é a liderança de uma gestão estratégica
integrada dos mundos on-line e off-line, sabendo as diferenças entre um e
outro", diz Palladino. "Trata-se de um executivo que consegue criar
estratégias de expansão e reconhecimento da marca em todos os canais de
interatividade com o consumidor."
Essa
multiplicidade de incumbências faz com que surjam cargos mais específicos na
seara do marketing digital. De acordo com o gerente da Michael Page, são novas
funções que trabalham particularidades da gestão. "É o caso do responsável
por 'costumer experience', que olha para as experiências de navegação e
relacionamento do cliente no mundo on-line. Outro é o gerente de 'business
performance', que foca o retorno do investimento", afirma Palladino.
"É
um mercado de especialistas", reforça Marina Wajnsztejn, diretora de
planejamento da agência Ogilvy. Para ela, existem muitas disciplinas para
começar a carreira, e é preciso que o profissional escolha uma. Isso porque
tudo o que é feito em marketing tradicional já encontra um paralelo no digital,
caso dos departamentos de compra de mídia e de conteúdo. "Há uma crença de
que o marketing digital é quase o oposto do tradicional, mas isso não é
verdade. Trata-se de uma grande fusão. Quanto mais caminham juntos, mais
interessante a comunicação se torna para o consumidor", afirma. Na opinião
de Marina, "nada morreu". "As pessoas usam tudo ao mesmo tempo,
e os profissionais de marketing têm de estar atentos a esse
comportamento."
Edson
Valente - jornalista jornal Valor.