Só 1% dos jovens declaram deixar escola por falta
de recursos para estudar
Jovens dizem que
os principais motivos de evasão são o trabalho ou o cuidado com a família
Diversas pesquisas com jovens fora da escola
investigaram e continuam investigando o motivo que, na opinião dos próprios
jovens, os levou a evadir.
O caso mais sistemático é a Pesquisa Nacional de
amostra por domicílio (PNADc), que, a partir de 2016 (exceto em 2020 e 2021),
incorporou esse tema como parte permanente de suas entrevistas.
Apesar das limitações inerentes a pesquisas que se
baseiam na explicação dada pelos próprios atores para ações que escolheram ou
foram levados a seguir, os resultados obtidos servem para eliminar algumas
possibilidades.
Por exemplo, em nenhuma das pesquisas, a falta de recursos para
arcar com os custos associados à educação mostra-se como o motivo que
levou uma parcela significativa a abandonar os estudos.
Em 2023, apenas 1% dos jovens alegaram ter deixado
a escola por ausência de recursos para pagar as despesas (como transporte,
material escolar, etc.).
Adicionalmente, déficits de aprendizado também não são
apontados (apenas 2%) como a principal justificativa para a evasão. Em
conjunto, esses resultados indicam que os jovens não se sentem nem impedidos
nem sem condições para aprender na escola.
Ao contrário, na opinião dos jovens, 90% abandonam
os estudos por falta de atratividade da escola ou devido a maior atratividade
de outras atividades que também demandam seu tempo, fundamentalmente o trabalho
e a atenção à família.
Entre os que evadiram, 62% declaram que abandonaram
os estudos porque precisaram ou preferiram trabalhar ou dar maior atenção a sua
família (incluídos os cuidados na gravidez). Nesse quesito, os homens
responsabilizam quase que exclusivamente o trabalho, e as mulheres se dividem
entre trabalho e cuidados com a família.
Com relação à falta de atratividade da escola, 28%
dos jovens declaram que a abandonaram por falta de interesse no que ela tem
para oferecer ou porque já haviam alcançado o nível educacional desejado,
embora ainda não tivessem concluído o ensino médio.
Vale ressaltar que esse
desinteresse representa uma parcela maior entre os mais jovens e declina entre
os maios velhos.
A porcentagem de jovens de 18 anos cujo motivo
alegado para o abandono foi o desinteresse pelos estudos é 10 pontos
percentuais maior que entre os jovens adultos de 29 anos.
É de enorme importância a visão dos próprios jovens
sobre os diferentes temas que os competem. Desses resultados autodeclarados,
uma hipótese possível de interpretação é que parte talvez não perceba o valor
da educação e acabe envolvida com outras
atividades econômicas e na família, que percebem como mais relevantes.
Essa parcela pode ser maior do que imaginamos.
Certamente uma parte da juventude evade para trabalhar porque precisa do
dinheiro imediatamente, mas é possível que grande parcela pudesse se manter na
escola mas percebe o trabalho como mais atrativo do que o ensino.
Uma vez
envolvidos com outras atividades, mais tarde, é difícil compatibilizá-las com a
volta à escola.
Ironicamente, há evidência de que o contato do
jovem com o trabalho faz com que ele passe a valorizar mais a educação.
Conforme estudo de Reynaldo Fernandes, entre os jovens que desejam voltar a
estudar, a principal razão é melhoria na empregabilidade, produtividade e
remuneração.
As implicações para a política pública são
imediatas. Uma vez que o Pé de Meia mitiga a necessidade imediata de renda,
urge uma educação de qualidade que comunique à juventude que estudar vale a pena,
bem como as implicações sociais e a renda futura.
Talvez os jovens não saibam o
valor da educação e o tamanho da perda que teremos caso não concluam o ensino
médio. Talvez o trabalho pareça ter mais valor para jovens de 15 anos.
O estudo "Consequências da violação do direito
à educação" aponta que o valor da perda da evasão é de R$ 395 mil ao longo
da vida toda por jovem evadido. Empregabilidade, remuneração e longevidade são
as dimensões mais afetadas. Será que comunicamos à juventude essas perdas.
LAURA MULLER MACHADO - mestre em Economia Aplicada pela USP, é
professora do Insper e foi secretária de Desenvolvimento Social do Estado de
São Paulo