A educação sexual num mundo dominado pelo Pornhub


Sites de pornografia são tão sofisticados quanto o Facebook, e invariavelmente vão chegar aos seus filhos e filhas.


A atriz pornô Stormy Daniels -

 

As pessoas geralmente não falam sobre pornografia, mas os celulares delas, sim. Com a explosão da internet móvel também cresceu exponencialmente o consumo de vídeos de sexo. Hoje, a MindGeek, empresa que controla o PornHub, o maior site sobre o gênero no mundo, consome mais dados que o Facebook e a Amazon. Em média, 125 milhões de pessoas consomem algum vídeo da empresa por dia.

Parte disso, claro, tem relação com o desejo ancestral pelos serviços que a MindGeek oferece. A outra parte é explicada por tecnologia. As empresas investem em vídeos rápidos e fáceis de carregar. Além disso, estão usando uma poderosa ciência de dados para definir exatamente que tipo de cenas seus usuários querem —da cor da roupa da atriz à quantidade de pessoas que devem caber num banheiro. O índice de acerto é digno de Netflix, com efeitos semelhantes. Assim como nas séries, as pessoas fazem maratona de pornô. 

Bem, por que estou escrevendo sobre isso numa coluna de educação? Porque tem tudo a ver com a escola, com as famílias e com a educação de crianças e adolescentes. No passado recente, o acesso era mais difícil.

Revistas, vídeos, boa parte desse consumo era mediado por alguém e circulava, ao menos entre menores de 18 anos, por uma rede clandestina nas escolas (mesmo entre os filhos de famílias religiosas). Hoje, isso desapareceu. O soft porn está até numa conta do Instagram. Por mais zelosos que sejam pais e mestres, eles não conseguem controlar tudo o que seus filhos e estudantes assistem o tempo inteiro.

Os efeitos do pornô em massa ainda são desconhecidos. Embora os resultados da pornografia sejam disputados entre adultos (há prós e contras), ainda se sabe pouco sobre a relação de crianças e adolescentes com esse tipo de conteúdo.

Alguns especialistas, porém, já levantam a hipótese de que algo está acontecendo no imaginário dos jovens: o pornô está virando a única referência sexual de milhares de adolescentes prestes a entrar na vida adulta. Faz sentido, dado o papel central que as telas ocupam nas nossas vidas. Do tipo de desempenho aos movimentos, o pornô tem influenciado o que as pessoas esperam das relações sexuais. E isso, sim, é um problema. Afinal, como todo adulto sabe, sexo em filmes e sexo na vida real são universos muito distantes.

Há vários meios de lidar com o assunto com crianças e adolescentes. A Inglaterra está atuando em duas frentes. Em uma, tenta regular a indústria, dificultando o acesso. Na outra, tem instituído campanhas de educação sexual, produzindo material para professores, pais e estudantes. Em outros países, como o Japão, o assunto é mais controverso, embora existam aulas de educação sexual por lá.

Os caminhos variam de país a país, mas raramente alguém ignora o assunto, faz de conta que ele não existe ou deixa a responsabilidade apenas para a família. Se a escola é o lugar em que as pessoas descobrem seu lugar no mundo por meio do conhecimento, faz sentido educar os estudantes nesse aspecto tão importante da vida.

Isso significa passar filmes pornôs para crianças de 8 anos ou para adolescentes de 16? Claro que não. Há muito trabalho sério, feito por gente responsável e sensível à diversidade religiosa e de convicções no Brasil. Essas pessoas têm dedicado a vida a estudar e a recomendar a melhor forma de tratar desses assuntos. O que não dá é fingir que o problema não existe e jogar a responsabilidade toda sobre a família. Isso é irresponsabilidade coletiva.

No passado, a educação sexual tinha um caráter preventivo, que continua válido. Tratava de doenças e gravidez precoce, por exemplo. Com o tempo, foi evoluindo para a identificação de abusos (muitas pessoas descobrem que sofreram violência sexual quando aprendem sobre o tema nas escolas). Já o futuro aponta para a educação sobre expectativas sexuais e tem tudo a ver com noções de conhecimento para a vida. Educação sexual não é apenas o lugar em que você fala de pênis e vagina. É uma oportunidade, por exemplo, para falar de empatia, responsabilidade e respeito por si e pelos outros.

Se escolas e famílias se omitirem, o Pornhub fará as vezes de sala de aula. Mais tarde, será inútil fingir que não sabia de nada.

 

Leandro Beguoci - diretor editorial de Nova Escola (novaescola.org.br). Ele explica sobre o que funciona (e o que não funciona) na educação brasileira.

Fonte: jornal FSP 

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