Com vacinação em queda, Saúde terá o menor orçamento desde 2014.
O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumirá o
governo em janeiro de 2023 tendo a saúde pública como um dos principais
desafios e com o menor orçamento para a pasta desde 2014 caso não haja
modificações.
A saúde foi apontada por brasileiros como uma das principais
preocupações, segundo o Datafolha.
O novo governo terá que lidar com situações alarmantes na área,
como baixa cobertura vacinal de crianças, a covid-19, a demanda reprimida por
procedimentos durante o período mais agudo da crise sanitária, falta de
medicamentos e a alta da taxa de mortalidade materna, segundo especialistas
ouvidos pelo UOL
Orçamento menor. A proposta orçamentária do Ministério da Saúde
para 2023 representa o menor nível em dez anos e está fixada em R$ 149,9
bilhões.
Se mantido pelo Congresso, representa uma redução de R$ 22,7 bilhões quando
comparado a 2022, descontados os gastos com covid-19.
Segundo o CNS (Conselho Nacional de Saúde), as perdas podem
chegar a R$ 60 bilhões se considerado o teto de gastos, regra fiscal que limita
o gasto público.
Ela determina que o gasto máximo que o governo pode ter é
equivalente ao Orçamento do ano anterior, corrigido apenas pela inflação.
Ainda conforme o conselho, os principais cortes atingem ações de
imunização, cujo orçamento caiu de R$ 13,6 bilhões em 2022 para R$ 8,6 bilhões,
e a Saúde Indígena, que teve seu orçamento reduzido de R$ 1,4 bilhão para R$
609 milhões, queda de 60%.
O corte também deverá atingir o piso de atenção primária, a
atenção à saúde da população para prevenção, o controle e o tratamento de
HIV/Aids e as demais ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), além de
hepatites virais e tuberculose.
O CNS encaminhou no fim de outubro uma carta para a Relatoria da
Saúde da ONU (Organização das Nações Unidas) denunciando a retirada de recursos
do SUS (Sistema Único de Saúde)
Procurado, o Ministério da Economia disse que "a elaboração
do projeto de lei orçamentária de 2023 ocorreu em um contexto desafiador, em
meio ao elevado nível de indexação e rigidez alocativa das despesas, o que
obrigou a uma alocação de recursos conservadora".
"O valor disponibilizado na Reserva para Emendas de Relator
no Ministério da Saúde, no total de R$ 10,42 bilhões, pode ser alocado para
atendimento das demandas dessa pasta durante a tramitação do Orçamento 2023 no
Congresso Nacional, o ambiente legítimo e sensível aos anseios e escolhas da
sociedade em torno das políticas públicas consideradas mais relevantes",
informou a pasta.
Queda significativa em programas do SUS.
O corte de verbas da Saúde,
promovido pelo governo Jair Bolsonaro (PL), atingiu 12 programas da pasta — se
somadas, as perdas chegam a R$ 3,3 bilhões.
Boletim de Monitoramento do Orçamento da Saúde, publicado pelo
IEPS (Instituto de Estudos para Políticas de Saúde), e da Umane, associação
civil sem fins lucrativos, mostra que o custeio de bolsas para residentes em
medicina Pró-Residência Médica e em Área Multiprofissional teve uma queda de R$
922 milhões.
Já o impacto no programa para implementação de Políticas de
Promoção à Saúde e Atenção a Doenças Crônicas Não Transmissíveis, como diabetes
e câncer, foi de R$ 3,8 milhões.
Vacinação em baixa. Especialistas apontam a vacinação como uma
das questões mais urgentes na saúde brasileira.
Segundo a vice-presidente da
SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Isabella Ballalai, as coberturas
vacinais vêm caindo gradualmente desde 2015, mas na pandemia
"despencaram".
O Brasil é um dos países sul-americanos que correm um
"risco muito alto" de reintrodução da poliomielite, segundo alerta
feito em setembro pela Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), braço da OMS
(Organização Mundial da Saúde).
De acordo com dados do Ministério da Saúde, há seis anos, 98,2%
do público-alvo recebeu as doses.
Em 2021, a imunização contra a doença foi de
apenas 67,1%.
Atualmente, segundo dados do Sistema de Informações do Programa
Nacional de Imunizações, obtidos pela plataforma DataSUS, a cobertura está em
61%, o que significa que os 39% restantes não estão completamente protegidos
contra a pólio.
O Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) informou em
julho que foi a registrada a maior queda contínua nas vacinações infantis em
aproximadamente 30 anos.
Embora seja um fenômeno observado em todo o mundo,
Isabella avalia que o governo falhou em garantir uma comunicação adequada, que
combatesse notícias falsas contra vacinas.
"É preciso investir numa comunicação empática, não dá para
ser uma chamada.
O Zé Gotinha nasceu nisso, mostrar para a população que a
gente está preocupado com ela, não com a cobertura, uma coisa leva à
outra", diz a médica.
Ela também destaca que a confiança nas autoridades públicas é um
dos fatores fundamentais para que as pessoas se sintam seguras em tomar vacinas
e que é necessário reconquistar isso. "A gente viu a vacinação se tornar
uma coisa politizada. Vacinação é saúde".
Pandemia não acabou. O novo governo também terá que lidar com a
ocorrência de surtos da covid-19.
O surgimento de uma nova subvariante e a
pouca adesão às doses de reforço das vacinas dispararam a taxa de transmissão
(Rt), aumentando internações e o risco de uma nova onda.
Em entrevista ao UOL, a microbiologista Natalia Pasternak
afirmou que a doença nunca foi embora e "veio para ficar".
A especialista declarou que o Ministério da Saúde terá um grande
desafio para aumentar a vacinação e precisa recuperar o PNI (Programa Nacional
de Imunizações).
Um dos principais problemas que o novo governo vai enfrentar é
vacinação.
E vacinação não só para covid. Vacinação como um todo, especialmente
infantil. A gente tem observado uma queda na taxa de vacinação muito fora do
normal.
Ter 65% de vacinação contra poliomielite não é condizente com a cultura
vacinal do Brasil - Natália Pasternak.
STELLA BORGES – jornalista UOL