Pais e mães das classes mais ricas
têm relatado pesadelo com ensino online.
Em meados de abril, o ex-presidente-executivo do Google Eric
Schmidt descreveu o fato de milhões de crianças estarem fazendo aulas online
durante a pandemia como “um experimento massivo de aprendizado remoto”. Bem,
esse experimento deu errado.
Pergunte
a qualquer pai ou mãe das classes mais ricas do Brasil como tem sido sua
experiência com crianças em casa tentando aprender pelo computador e você
ouvirá relatos próximos a um pesadelo.
Mais
do que isso, a ideia da escola “home office” é um vetor de aprofundamento de desigualdades. A pandemia
evidenciou como o acesso à internet é mal distribuído no Brasil.
Empresas
estabelecidas estão até agora com dificuldade de assegurar conexão, hardware e
software necessários para que seus funcionários trabalhem de casa de forma
adequada.
No
plano da escola, a situação é ainda mais dramática. Achar que a educação pode
ser massificada online, com a atual escassez de conectividade e acesso a
computadores e programas pela maioria absoluta da população no país, é devaneio
de solucionista tecnológico.
O
fardo que a educação online —que no Brasil vem sendo praticada só pelas escolas
mais ricas— impõe mesmo assim para pais, alunos e professores é insustentável
com os modelos atuais.
O
buraco no país é mais embaixo. Por exemplo, não há sequer banda larga de
qualidade na maioria das escolas públicas. Essa é uma luta que vem sendo
travada há anos e que até agora não se concretizou.
Se
nem na escola pública há internet de qualidade, o que esperar então da
qualidade de conexão na casa das pessoas?
Além
disso, o que fazer com alunos especiais, com deficiência, autismo e outras
condições? Na esfera doméstica, esses estudantes jamais terão o suporte de que
precisam.
Em
outras palavras, o “experimento massivo” que Schmidt mencionou tem uma
conclusão: como política pública, é preciso investir pesadamente no modelo de
escola que temos hoje. E guiar as inovações de forma incremental a partir dele.
No
Brasil, não será o Estado que irá liderar a transformação digital da escola,
como vem propondo o governador de Nova York, Andrew Cuomo. Mesmo lá a ambição
tem sido recebida com ceticismo.
Já
para o setor privado, essa é uma oportunidade enorme. Se o experimento massivo
da educação online falhou, é possível agora mensurar o que deu errado. Essa
falha é um chamado para desenvolver e aperfeiçoar tecnologias que funcionem de
verdade e possam eventualmente ser universalizadas.
Além
disso, se no ensino fundamental e médio a educação online é um desafio
(exemplificado pelo suplício de ver crianças de sete anos tentando aprender
online todos os dias
por Zoom), no ensino superior essa possibilidade é concreta. No ensino superior
é, sim, possível cogitar modelos eficazes online massificados, ou de educação
híbrida.
Em
suma, não é o caso de desistir da educação remota, mas de entender as situações
em que ela é adequada. Até isso acontecer, como política pública, o importante
é investir na escola tradicional e começar por, no mínimo, levar banda larga de
qualidade para TODAS as escolas públicas do país.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e
Sociedade do Rio de Janeiro.
Fonte: coluna jornal FSP