Na internet, os nervosinhos se sentem em casa


Não são necessários muitos cliques para encontrar indignação na internet. Conecte-se a uma rede social e você verá gente se sentindo ultrajada por celebridades e pessoas comuns. É aí que o jogo começa para valer: tribunais, movimentos sociais, meios de comunicação, corporações e governos atraem todo tipo de indignação.

Como diz uma surrada piada no Twitter: "Do que estamos com raiva hoje?".

Comentários agressivos fazem parte da cultura da internet há muito tempo, como mostram qualquer seção de comentários. Mas nos últimos anos essa raiva tem proliferado nas mídias sociais, onde as pessoas proclamam sua indignação ética.

Um estudo de 2013 da Universidade Beihang, de Pequim, sobre o Weibo, espécie de Twitter chinês, revelou que a raiva é a emoção que se espalha mais facilmente nas redes sociais. A alegria ficou num distante segundo lugar. Ryan Martin, que estuda a raiva e é professor de psicologia da Universidade de Wisconsin, em Green Bay, disse que a principal diferença é que, enquanto nos inclinamos por compartilhar a felicidade apenas com as pessoas mais próximas, estamos dispostos a aderir à raiva de estranhos.

As pessoas propensas à indignação na internet estão em busca de validação, disse Martin. "Elas querem escutar que os outros a compartilham", disse, "porque sentem que estão legitimados e um pouco menos solitários e isolados em suas crenças".

A indignação na internet normalmente diz mais sobre quem faz o comentário do que sobre a causa, e seu desdobramento pode fazer mais mal do que bem.

Em outro estudo de 2013, Martin percebeu que as pessoas suscetíveis à indignação na internet tendem a ser mais raivosas. "As pessoas que esbravejam on-line de qualquer maneira tendem a se envolver mais em agressões físicas e verbais", disse.

A indignação carrega um sabor diferente da raiva pura; sugere uma afronta ao sistema de valores de alguém.

O indignado pode estar legitimando um mecanismo de defesa reforçado pela própria cultura da ira na internet. Expressar indignação é se proteger das críticas. Mas tais reações podem ofuscar ou diminuir a complexidade de um assunto, mais do que iniciar um debate profundo.

Além disso, comentários indignados às vezes são mais ofensivos do que a má conduta inicial.

As multidões produzem um senso de anonimato e, em meio à tendência de indignação no Twitter, Martin disse que "você pode se sentir anônimo, mesmo se de fato não estiver".

Em última análise, a indignação na internet é uma maneira de protestar com toques e cliques em vez de boicotes e passeatas. É uma atitude nobre se indignar por uma causa e correr o risco de ser preso sem reconhecimento. Menos honroso é participar de um ataque digital como um meio de sustentar o próprio ego.

Talvez o verdadeiro problema, sugeriu Martin, não seja a nossa raiva, e sim a nossa imprudência e o relacionamento dela com os nossos aparelhos facilmente acessíveis. "A internet aumenta os problemas de controle dos impulsos", disse. "Você fica bravo e pode contar isso ao mundo em instantes antes de ter a chance de se acalmar e analisar as coisas."

Patrick Leger – jornalista do New York Times

Fonte: suplemento NYT do jornal Folha de São Paulo

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