O trabalhador está atravessando tempos difíceis.
Para os mais jovens, talvez a experiência da primeira crise econômica. Para os
adultos, mais uma de muitas crises pelas quais atravessou. Esta, com fortes
contornos políticos e expondo a corrupção e corruptores como nunca foi feito.
Quem vivenciou o confisco do Plano Collor em 1990 e
os inúmeros planos econômicos malsucedidos na tentativa de controlar a inflação
não se surpreende com mais nada. A criatividade dos governantes e a caixinha de
maldades usadas contra a população tiveram dias de glória que dificilmente
serão superados.
A crise atual ceifou milhões de postos de trabalho
e muitos vivenciam a experiência do desemprego. Os recém-formados, a
experiência de não conseguir emprego ou se submeter a posições muito aquém de
suas qualificações acadêmicas.
Não bastasse o desemprego, o brasileiro se prepara
agora para aceitar alterações nas regras da aposentadoria. Estamos vivendo
mais; se o período da vida laboral não se estender, como quer o governo, a
conta não fecha. A Previdência não terá recursos para pagar os benefícios de
aposentadoria no futuro.
Ao impingir tantas perdas aos cidadãos, por que não
oferecer algo em troca? Por que não aproveitar o ciclo de mudanças e alterar
regras em benefício da população?
POUPANÇA
Em maio de 2012 o governo teve a coragem de mudar a
regra da remuneração da poupança, templo sagrado onde milhões de brasileiros
confiam suas suadas economias. Mas fez isso quando o produto levava vantagem em
relação a outros produtos de investimento. A taxa básica de juros na época
chegou a 7,25% ao ano, e a remuneração de TR mais 6,17% ao ano da poupança,
isenta do Imposto de Renda, era boa demais pra ser verdade.
O que o governo fez? Para impedir esse
"desequilíbrio", baixou um decreto dizendo que sempre que a taxa
Selic atingir patamar igual ou inferior a 8,5% ao ano, a remuneração da
poupança deixa de ser fixa e passa a ser variável, de 70% da taxa Selic
vigente.
Ora, que seja essa a regra qualquer que seja o
patamar da Selic. O povo que investe na poupança deixaria de perder uma
montanha de dinheiro em períodos de taxa de juros elevada como a atual.
Considerando a Selic de 14,25% ao ano, a remuneração da poupança seria de
9,97%, muito superior à atual, de TR mais 6,17% ao ano. Um incentivo e tanto para
o esforço de poupar, de acumular uma reserva financeira. Além de atrair mais
dinheiro para financiar projetos habitacionais.
FGTS
Se a remuneração da poupança é baixa, o que dizer
do FGTS que recebe inacreditáveis juros de apenas 3% ao ano? O tal conceito de
"desequilíbrio" não se aplica quando é contra o cidadão? Tem
desequilíbrio maior do que pagar juros entre 200% e 400% ao ano na hora de
tomar empréstimo e receber apenas 4% ao ano na hora de remunerar o saldo do
FGTS? A TR, que muitos acreditam deveria repor perdas inflacionárias, nunca
teve esse papel.
QUEM PAGA A CONTA
No caso da poupança, os bancos teriam sua polpuda
margem de lucro reduzida no tocante à captação de dinheiro via depósitos em
poupança. Ao governo caberia avaliar a alteração da taxa dos financiamentos
imobiliários que recebe boa parcela do dinheiro captado via poupança. Para
manter o desejado equilíbrio, as duas pontas da transação –poupança e
financiamento– teriam a cotação definida em determinado percentual da taxa
Selic.
No caso do FGTS, mais fácil ainda. É a maior fonte
de financiamento em saneamento, habitação e infraestrutura do país. O custo dos
projetos beneficiados por essa fonte de dinheiro seria ajustado ao novo custo,
ainda barato, porém mais justo.
Outra moeda de troca, no caso da aposentadoria,
seria a adoção de regras igualitárias, com a eliminação de algumas distorções
importantes, presentes no sistema atual, como a diferença entre a previdência
do setor público e a do privado.
Se subsídios forem indispensáveis, que sejam
concedidos pelo governo, e não diretamente pelos trabalhadores e pelos
poupadores do país. No final das contas, pagamos pelos subsídios também, mas
essa é uma outra história...
Marcia Dessen - planejadora financeira
pessoal, diretora do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais
Financeiros e autora de 'Finanças Pessoais: o que fazer com meu dinheiro'.
Fonte: coluna jornal FSP