É possível ensinar empreendedorismo
em sala de aula.
No início de abril, um aluno tailandês da nossa
turma de empreendedorismo notou uma escassez de álcool em gel de baixo custo
por toda a Tailândia.
Para apoiar o auxílio emergencial devido à Covid e gerar
receita, ele rapidamente mudou a produção de suprimentos médicos da empresa da
família para a produção de álcool em gel.
Mais próximo de casa, quando a
Dollaride – empresa incubada pela Future Labs da NYU – constatou que a pandemia
havia eliminado a demanda pelo seu negócio – vans compartilhadas que fazem trajetos
em Nova York – ela reformulou seu modelo de negócio para utilizar as vans
existentes, a tecnologia e as rotas, para suportar a crescente demanda por
entregas de encomendas.
Nenhum empreendedor seguiu a típica proposta de uma
escola de negócios ao decidir fazer seu negócio girar: não fizeram uma longa
análise de mercado, não desenvolveram um plano de negócios, tampouco avaliaram
abordagens alternativas.
Na verdade, se tivessem feito essas análises, teriam
chegado à conclusão de que os ganhos em curto prazo não justificariam o gasto
com adaptações, ou ficariam travados ao tentar estimar a duração da pandemia ou
a rapidez com a qual a produção global deve retomar.
Em vez disso, eles
simplesmente tomaram atitudes com base nos recursos de que dispunham.
Essa atitude para com o empreendedorismo chama-se
“effectuation”, ou seja, tirar proveito daquilo que sabemos, de quem conhecemos
e de quem somos para, então, agir.
Em geral, as escolas de negócios não ensinam
essa abordagem, uma vez que tendem a focar mais nos cálculos de risco e retorno
em longo prazo.
No entanto, à medida que enfrentamos um futuro cada vez mais
incerto e complexo, as escolas precisam adotar novas filosofias destinadas a
moldar líderes ágeis e empreendedores.
As escolas de negócios sabem ensinar
empreendedorismo?
Enquanto modernos programas de MBA oferecem uma
série de cursos de empreendedorismo – desde cursos formais a concorrências
entre startups e incubadoras -, existe um alto nível de
ceticismo acerca da ideia de que o empreendedorismo pode ser ensinado numa sala
de aula.
Inúmeros empreendedores de sucesso jamais frequentaram uma escola de
negócios – e muitos não têm formação superior.
Além disso, desenvolver uma
predileção pela imaginação, ruptura e uma atitude contraditória exigida para um
empreendedorismo eficaz, em geral, não se encaixa na grade curricular de uma
típica escola de negócios, definida por modelos analíticos abstratos e cálculos
precisos.
Entretanto, muitas escolas acham que ainda há
espaço no mundo do empreendedorismo para a educação formal, e tomaram medidas
para atualizar suas contribuições a fim de atenderem às necessidades dos alunos
de atualmente.
Em um estudo recente, analisamos três renomados programas de MBA
na América do Norte para entendermos melhor como estão lidando com esse
desafio.
Em um setor onde os programas tendem a imitar uns aos outros,
descobrimos que esses programas quebraram o molde e desenvolveram suas próprias
filosofias para ensinar empreendedorismo.
A primeira abordagem que observamos concentrava-se
em incutir o valor da experiência real de uma “sala de operações” montada num
cenário de sala de aula.
A Rotman School of Management da University of Toronto
converteu a aula de empreendedorismo em uma sala de operações semelhante à da
faculdade de Medicina, onde os alunos se sentam num grande auditório e assistem
a um professor fazer uma cirurgia, não em um corpo humano, mas numa startup.
No
Creative Destruction Lab da Rotman, um painel composto de empreendedores se
junta aos professores , atiçando e cutucando as startups, ajudando
os alunos a absorver a ideia de que as habilidades do empreendedorismo somente
podem ser desenvolvidas por meio da experiência.
Outras escolas de
negócios adotaram programas similares – como o Endless Frontier Labs da Stern
da NYU, que compartilha o foco no aprendizado através da experiência.
A segunda abordagem que observamos concentrava-se
em reprogramar os alunos para a ação, em vez de cair na paralisação da análise.
Todos nós temos uma voz em nossa mente, que diz “E se der errado?” ou “Como
gerencio o risco?” Imagine o poder de uma educação que ajude a calar essa voz
e, ao contrário, disser “E se der certo?”
A Darden School of Business da The
University of Virginia é o local de origem do empreendedorismo “efectual”, uma
abordagem que convida os alunos a reconhecerem seus recursos existentes para o
empreendedorismo e a aceitarem um certo número de riscos.
Essa mentalidade é
antiética para uma abordagem mais convencional de uma escola de negócios que
enfatiza minimizar os riscos.
Além disso, enquanto o mundo dos negócios é em
geral reconhecido por sua natureza degoladora e fortemente competitiva, o
programa da Darden incute nos alunos o prazer pelo poder da inovação
colaborativa ao incentivá-los a, abertamente, compartilhar ideias com seus
colegas e tirar proveito dos vários insights e perspectivas
para cocriar aventuras empreendedoras.
O último programa que observamos adotou uma
abordagem mais tradicional.
Nossa pesquisa sugere que a Wharton School, da
University of Pennsylvania, ainda enfatiza os tipos de abordagens para a
otimização de recursos e riscos, que são mais características das escolas de
negócios do resto do mundo.
Essa abordagem é fundamentada na ideia de que as
escolas de negócios deveriam ensinar empreendedorismo de forma similar à
maneira como ensinam outras matérias – dando aos alunos modelos analíticos e
ferramentas provenientes de pesquisas acadêmicas já publicadas sobre a abertura
de uma nova empresa.
Enquanto essa filosofia possa ser útil para startups mais
maduras, ou para ajudar os fundadores a evitar as armadilhas comuns de
uma startup – como escolher errado o cofundador, concordar com
os más cláusulas financeiras, ou decidir sobre produtos medíocres – é pouco
útil para os empreendedores lidar com tamanha incerteza.
Ensine os alunos de MBA a abraçar o futuro
desconhecido
A pandemia atual ilustra a importância de preparar
os empreendedores para enfrentar um mundo cada vez mais complexo e incerto.
Precisamos ensinar esses futuros líderes a ver a incerteza de um futuro
desconhecido, não como um problema a ser solucionado, mas como uma realidade a
ser aceita.
Afinal de contas, em um futuro desconhecido, todos
os líderes precisarão ser empreendedores: visionários que conseguem imaginar,
adaptar-se e agir rapidamente para lidar com qualquer tipo de desafio que possa
surgir.
As escolas de negócios não podem demorar a adotar as novas filosofias
de ensino que empoderam a próxima geração de empreendedores e líderes para
enfrentarem esses desafios.
Ashish K. Bhatia - professor adjunto de Gestão e Empreendedorismo e Diretor
Acadêmico da Escola de Negócios dos programas de negócios, tecnologia e
empreendedorismo da NYU Stern School of Business.
Natalia Levina - Professora de Ciências da Informação da Toyota Motors
Corporation, da Stern School of Business da NYU e diretora do Fubon Center for
Technology, Business and Innovation.
Fonte: Harvard Business Review