Uma economia em
processo de envelhecimento pode ser mais lenta e desigual – a não ser que as
políticas públicas comecem a mudar.
Warren
Buffett, que no dia três de maio/2014, foi o anfitrião da extravagante reunião
anual de acionistas da Berkshire Hathaway, é um ícone do capitalismo americano.
Aos 83 anos, ele é o exemplo de uma impactante tendência demográfica:
indivíduos qualificados que continuam trabalhando durante o que um dia foi
considerado a terceira idade. No universo dos mais ricos, pessoas com alto grau
de escolaridade trabalham por cada vez mais tempo se comparadas às menos
escolarizadas. Aproximadamente 65% dos homens americanos com idades entre 62 e
74 anos e nível superior estão no mercado de trabalho, em comparação com 32%
dos homens que possuem apenas o nível médio. Na União Europeia as estatísticas
são similares.
Essa
diferença é parte do abismo que afeta todas as faixas etárias e separa os
indivíduos diplomados e abonados dos mais pobres e com menor grau de instrução.
O acelerado ritmo de inovação têm aumentado a renda dos mais qualificados ao
mesmo tempo em que diminui substancialmente a dos menos capacitados. A cada
ano, os mais ricos trabalham e vivem mais do que os mais pobres e menos
instruídos. As consequências, tanto para os indivíduos quanto para a sociedade,
são profundas.
Mais velhos, mais
sábios e em maior número
O
mundo vivencia um aumento assustador do número de pessoas idosas - que viverão
mais tempo do que nunca. Nos próximos vinte anos, a população global com idade
acima de 65 anos irá praticamente dobrar, passando de 600 milhões para 1,1
bilhão. A experiência do século XX, em que a maior longevidade se traduziu em
períodos mais longos de aposentadoria e não de trabalho, fez com que diversos
analistas considerassem a possibilidade de crescimento mais lento da economia.
O crescente número de aposentados também poderia levar muitos governos à
falência.
Entretanto,
a perspectiva de mundos diferentes, isto é, de jovens trabalhando e idosos
ociosos, ignora o surgimento de uma nova tendência: o crescente hiato entre os
qualificados e os não qualificados. As taxas de emprego estão caindo entre os
jovens inexperientes, ao passo que indivíduos mais velhos e capacitados estão
trabalhando por mais tempo. Tal hiato é mais agudo nos Estados Unidos, onde os baby-boomers
com alto nível de escolaridade estão adiando a data de aposentadoria enquanto
indivíduos mais jovens e menos escolarizados estão deixando o mercado de
trabalho.
O que
vem sendo observado se deve, em parte, às políticas públicas. Muitos governos
europeus abandonaram os incentivos para que as pessoas se aposentassem mais
cedo. O aumento da expectativa de vida combinado à substituição dos planos de
Benefício Definido por planos de Contribuição Definida faz com que até os mais
abonados precisem trabalhar por mais tempo a fim de terem conforto na
aposentadoria. Mas as constantes mudanças na natureza das ocupações têm um
papel importante a desempenhar. Os salários dos indivíduos mais escolarizados
aumentaram substancialmente e eles continuam sendo bem remunerados na idade
avançada por serem mais produtivos do que seus predecessores. Outras mudanças
também podem dar força a esse movimento: habilidades que complementam as
funções desempenhadas pelos computadores, que variam desde conhecimentos do
processo gerencial à criatividade, não diminuem, necessariamente, com a idade.
Essa
tendência não beneficiará apenas os idosos mais afortunados, mas, de certa
maneira, a sociedade como um todo. O crescimento sofrerá uma desaceleração mais
lenta do que a esperada e os orçamentos públicos serão menos ‘castigados’, já
que os indivíduos mais bem remunerados pagarão impostos por mais tempo. Países
ricos com muitos cidadãos escolarizados não terão tanta dificuldade para
envelhecer como a China, por exemplo, onde metade da população com idades entre
50 e 64 anos não possui o Ensino Fundamental completo.
Na
outra ponta da escala social, porém, a realidade é cruel. A realização de
trabalhos manuais fica mais difícil à medida que o indivíduo envelhece e as
pensões pagas pelos sistemas públicos costumam ser mais atrativas para os que
ganham pouco ou estão desempregados. A conhecida figura da mulher que não
trabalha e se reproduz às custas do Estado, que a sustenta com a receita de
impostos, pode vir a ser substituída pela figura do vovô preguiçoso que vive
com recursos do governo enquanto seus contemporâneos mais inclinados ao trabalho
lutam para ter uma condição financeira decente.
Nem
todos os efeitos do envelhecimento sobre a economia são positivos. Os idosos
ricos acumularão uma poupança mais robusta, enfraquecendo a demanda. A
desigualdade crescerá e grande parte da riqueza será eventualmente transferida
para a próxima geração por meio de herança, fazendo aumentar ainda mais o
espaço que separa vencedores e perdedores. Uma reação provável a esse movimento
seria a maior tributação das heranças. Se impostos dessa natureza substituírem
outros tributos menos justos, a solução pode até funcionar. Por outro lado, a
medida poderia incentivar os idosos a gastar seu dinheiro ao invés de poupá-lo.
De qualquer maneira, as autoridades não devem focar na distribuição, mas na
geração de mais renda por meio de mudanças na aposentadoria e na educação.
A
idade não deve servir como um determinante para o fim da vida laboral. Idades
de aposentadoria compulsória e outras regras que desencorajam as pessoas a
permanecer no mercado devem ser abolidas. A Previdência Social deve refletir as
crescentes oportunidades que estão se abrindo aos indivíduos mais qualificados.
As pensões devem ser mais progressivas (menos generosas para os ricos). Ao
mesmo tempo, é preciso aumentar os investimentos públicos em educação para
todas as idades a fim de que mais pessoas adquiram as habilidades necessárias
para atender ao mercado de trabalho atual. Hoje, muitos governos ainda relutam
- o que é compreensível - em gastar dinheiro para treinar pessoas mais velhas
que se aposentarão num futuro próximo. Mas se as pessoas trabalharem por mais
tempo, tal investimento passa a fazer sentido. Idosos com 60 anos provavelmente
não se tornarão cientistas da computação, mas poderiam adquirir habilidades
úteis como dispensar cuidados à crescente população de indivíduos com idade
muito avançada.
O poder dos mais
velhos
Qual
a probabilidade dos governos realizarem essas mudanças? Ao observar os países
ricos hoje, é difícil ser otimista. O crescimento do número de eleitores idosos
e sua enorme disposição em exercer o direito ao voto têm feito com que os
políticos fiquem mais inclinados a satisfazê-los do que implementar reformas
controversas. A Alemanha, apesar ser o país que envelhece mais rapidamente na
Europa, planeja diminuir a idade oficial de aposentadoria em alguns casos. Nos
Estados Unidos, a Previdência Social (planos públicos) e o crescente sistema de
pagamento de benefícios de invalidez continuam intactos. É preciso que os
políticos convençam os eleitores mais velhos e menos capacitados que é do seu
próprio interesse manter-se no mercado de trabalho. Trata-se de um desafio
substancial. Porém, a outra opção – estagnação econômica e desigualdade ainda
maior – parece bem pior.
Fonte: The Economist