Precisamos entender a importância que temos para os bancos"


Sabemos como é desigual o jogo de forças entre nós e os bancos. Depois de tantas fusões, a quantidade de bancos diminuiu muito e parece que estamos cada vez mais reféns das grandes instituições financeiras, que ditam as regras.

Contando com o apoio do Banco Central do Brasil, órgão regulador e fiscalizador desse mercado, nós, consumidores, precisamos entender a importância que temos para os bancos, caso contrário, seremos tratados apenas como os chatos dos clientes que estão sempre reclamando.

Você já parou para pensar que somos nós os principais responsáveis pela geração de receita dos bancos? Sozinhos, somos um grão de areia e nossa importância é perto de zero, mas, em conjunto, somos o motor que o banco precisa para ser a empresa lucrativa que é.

Na época de inflação elevadíssima, os bancos ganhavam muito dinheiro com o que era chamado de "float". Todo o dinheiro depositado em conta-corrente, sem custo para o banco, era aplicado no "overnight", que chegou a pagar 2% ao dia. Aplicavam o dinheiro dos cidadãos que pagavam suas contas e seus impostos antes de recolher aos favorecidos finais muitos dias depois.

O ganho com a inflação era tão alto que os bancos não cobravam pelos serviços bancários, quase todos eram isentos de tarifas.

A partir do Plano Real, com a inflação reduzida, os bancos foram forçados a encontrar outro jeito de ganhar dinheiro e passaram a cobrar por todo e qualquer serviço que prestam.

Emprestar dinheiro e cobrar juros é, ou pelo menos deveria ser, a principal fonte de receita dos bancos. O lucro vem do "spread", diferença entre os juros que pagam aos investidores e os juros pagos pelos devedores. Juntos, tarifas e "spread" substituíram o ganho com o "float" do passado.

Sabe quem paga juros e tarifas? Nós, eu, você e todas as pessoas e empresas que usam os serviços bancários. Nós, correntistas, investidores ou tomadores de empréstimos, geramos a maior parte da receita dos bancos.

Você já calculou sua contribuição para o enriquecimento dos bancos? Suponha o custo mensal de R$ 60 de uma conta-corrente, R$ 720 por ano. Três DOCs ou TEDs por mês, mais R$ 360 no ano. A anuidade de um cartão de crédito, outros R$ 90 por mês, R$ 1.080 por ano. Saldo devedor de R$ 5.000 no cheque especial por 60 dias coloca mais R$ 940 no caixa do banco. Financiou a fatura do cartão de crédito de R$ 3.000 por três meses? Acabou de transferir mais R$ 1.500 para o já recheado caixa dele. Total das suas despesas, receita do banco, R$ 4.600 no ano. Mantido esse padrão, em cinco anos, R$ 23.000.

Ah, você é investidor, não paga o pacote de tarifa da conta-corrente porque tem uma boa carteira de investimento, não precisa de empréstimo e odeia pagar juros?

O banco também adora você, sabia?

Suponha um investimento de R$ 100 mil na poupança que não cobra tarifa nem corretagem. O banco remunera seu capital com juros próximos a 7% ao ano e cobra juros de
7% ao mês (exemplo bonzinho) quando empresta. Em um ano, ganhou quase R$ 120 mil de "spread".

Você investe R$ 200 mil em fundos de investimento e paga taxa de administração média de 2% ao ano. O banco ganha R$ 4.000 por ano para aplicar o seu dinheiro. Em cinco anos, R$ 20 mil. Em dez anos, R$ 40 mil. Sem correr nenhum risco.

Você tem um plano de previdência em que investiu R$ 300 mil. Pagou taxa de carregamento de 2% (R$ 6.000) e taxa de administração de 2,5% ao ano (R$ 7.500). Só no primeiro ano gerou receita de R$ 13.500.

Nem vou te contar quanto o banco ganha sobre os títulos de capitalização que você compra para ajudar o gerente. Mas posso garantir que é muito, muito dinheiro.

Viu quanta riqueza nossa transferimos para o banco? Não é para ficar com raiva nem chamar o banco de ladrão, mas nos conscientizarmos da importância que temos para os bancos.
Cientes do poder que temos e do valor que agregamos, o jogo fica mais equilibrado nas negociações. E, se o jogo estiver muito desigual, buscar outra instituição que reconheça nosso valor, disposta a estabelecer relacionamento mais justo, favorável a ambas as partes.

Marcia Dessen - planejadora financeira pessoal, diretora do Planejar e autora do livro 'Finanças Pessoais: o que Fazer com Meu Dinheiro'

Fonte: coluna jornal FSP

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