Crise na imprensa e os novos de paradigmas econômicos


Um livro que está sendo lançado em abril pelo economista Jeremy Rifkin tem a chave para que se possa entender, de forma estrutural , os dilemas enfrentados pelos jornais e revistas impressos . As novas tecnologias digitais permitiram ler o livro antes de ele chegar às livrarias e verificar como a questão do curso marginal zero é a responsável pela crise da imprensa escrita na maior parte do mundo.

Custo marginal é o custo econômico para reproduzir um bem, serviço ou ideia, descontados os gastos com a produção da primeira versão deste mesmo item. No caso do jornalismo, o custo de produção de uma reportagem inclui os investimentos em salários de jornalistas envolvidos no projeto, locomoção dos profissionais, produção de imagens e edição final do texto, áudio ou vídeo. Custo marginal são as despesas com a reprodução desta edição final em versões impressas ou audiovisuais.

No livro The Zero Marginal Cost Society: The Internet of Things,the Collaborative Commons, and the Eclipse of Capitalism (A sociedade do custo marginal zero: a internet das coisas, as comunidades colaborativas e o eclipse do capitalismo), Jeremy Rifkin mostra como a digitalização e a internet reduziram a quase zero o custo de reprodução de informações, afetando a disseminação das chamadas notícias duras, que se tornaram virtualmente gratuitas.

Este processo já era conhecido, mas o que poucos autores mencionaram foi como a redução do custo marginal é um fenômeno estrutural no capitalismo e como a crise do modelo de negócios da imprensa não é apenas o resultado de má gestão ou equívocos na aplicação de princípios teóricos da administração. Seguindo o raciocínio de Rifkin, a queda da rentabilidade dos jornais é uma das consequências da mudança de paradigmas econômicos em escala planetária.

A notícia, uma área especifica do campo da informação, foi drasticamente atingida pelo fenômeno da digitalização porque a sua representação em bytes cria condições para a transmissão eletrônica de um texto de forma quase instantânea. Também permite a recombinação dos bytes para formar outros textos com uma rapidez muito maior do que se fossemos reescrever este mesmo texto usando uma máquina de datilografia.

A rapidez e versatilidade do texto eletrônico estão na origem da tendência ao custo marginal zero no segmento da comunicação jornalística. Este é um processo que veio para ficar e não tem mais volta. Logo, o dilema das empresas jornalísticas é buscar um novo paradigma econômico porque o que vigorou até agora não tem mais sustentabilidade prática e nem muito menos justificativa teórica.

Isto não significa que o texto impresso vá desaparecer. Ele continuará porque a redução do custo marginal não será idêntica para todos os tipos de notícias e informações. Os consumidores interessados em textos analíticos ou reportagens investigativas, obviamente pagarão pelo acesso exclusivo a este material cujo custo marginal será alto. Em compensação, as chamadas notícias duras (hard news) tenderão a ser gratuitas porque podem ser disseminadas rapidamente com um custo marginal próximo a zero.

Mas Rifkin, a exemplo do que fizeram outros teóricos do capitalismo como o polonês Oskar Lange, John Maynard Keynes e o ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos Lawrence Summers, adverte para um paradoxo insolúvel no capitalismo. Quando o custo marginal se aproxima do zero, desaparece o estímulo ao investimento em inovação porque a margem de lucro é mínima. Em compensação, quando empresas elevam o custo marginal por práticas monopolistas ou por protecionismo, o lucro cresce mas a inovação também sofre pela ausência do livre fluxo de dados e informações.

O autor do livro The Zero Marginal Cost Society afirma que essa contradição impede o capitalismo de continuar sendo o paradigma econômico hegemônico na sociedade digital e prevê o surgimento de outros paradigmas, como o da produção colaborativa comunitária para determinados tipos de produtos informativos, onde o interesse social passa a ser um motor de inovação mais atrativo do que o lucro financeiro. Exemplos desse possível modelo de produção informativa são a enciclopédia virtual Wikpédia e sistemas de classificação de notícias pela sua popularidade como o Reddit , todos baseados no processo colaborativo – ou crowdsouring.

Tudo isso ainda é muito novo e desafiador em matéria de esforços teóricos para tentar entender como as coisas estão mudando, em especial no segmento das empresas jornalísticas. Elas não devem desaparecer porque há nichos informativos especializados onde há demanda para produtos pagos. Mas é obvio que a posição hegemônica usufruída até agora pelos grandes conglomerados empresariais na área da comunicação jornalística se tornou insustentável.

A lucratividade das empresas estará mais na produção de conteúdos jornalísticos do que na sua distribuição, a grande fonte de receita da era analógica. Isto muda o foco das estratégias editoriais para os nichos em vez da produção em massa, onde as empresas obtinham lucros enormes mesmo com um custo marginal declinante. Este modelo foi quebrado pelas novas tecnologias que tornaram a distribuição quase gratuita.

A ascensão do modelo comunitário colaborativo em segmentos específicos do campo da informação jornalística deve gerar uma diversidade de paradigmas. O segmento não comercial do jornalismo tem como principal motor da inovação a produção de conhecimento por meio da recombinação de notícias visando a geração de capital social. O próprio Banco Mundial já reconheceu que o modelo comunitário colaborativo pode ser tão atraente quanto o modelo lucrativo. Tudo vai depender das circunstâncias em que cada um deles for aplicado.

Carlos Castilho – jornalista, professor, autor.

Fonte: site Observatório da Imprensa
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