O
casamento acabou. E chegou a hora de ter aquela conversa que nenhum casal
gostaria de ter, para falar como serão repartidos os bens que acumularam
durante o relacionamento. E não estou falando de discos, livros, fotos e
pequenas lembranças compradas nas muitas viagens que fizeram juntos.
E
o pior é que o momento não é nada bom para ter essa conversa. Os sentimentos
estão à flor da pele, muita mágoa, culpa, ressentimentos, tristeza, sensação de
fracasso, de perda, enfim, sem cabeça para pensar, racionalmente, na partilha
de bens.
Como
todo bom casal apaixonado, o mais provável é que não tiveram essa conversa
antes do casamento. Nada a ver falar de separação antes de casar, não é? Então,
mas essa é uma conversa mais do que necessária. Embora pouco romântica, pode
poupar muito desgaste futuro. Vale a pena combinar tudo antes de o jogo
começar, principalmente se já houver bens individuais, que pertencem a ele, a
ela ou que foram comprados para os dois, embora ainda solteiros.
A REGRA
Se
o casal deixar que decidam por ele, o regime de comunhão de bens será o de
comunhão parcial de bens. E, nesse caso, o Código Civil diz o seguinte: o que é
dele ou dela antes do casamento assim permanece. Somente os bens adquiridos e
pagos durante o período do casamento serão de ambos.
Vale
lembrar que os bens individuais provenientes de doação ou herança não se
comunicam, ou seja, não compõem os bens do casal. Se uma pessoa casada vender
um bem incomunicável e adquirir outro, ocorrerá a substituição (sub-rogação).
Assim, o novo bem adquirido tem a característica da incomunicabilidade que
pertencia ao bem anterior.
Recomendável
documentar tudo para que não seja necessária a prova documental quando do
divórcio ou do inventário. Na substituição de um imóvel, por exemplo, a
escritura deve ter cláusula de sub-rogação que indica ter sido o novo bem
adquirido com o dinheiro do antigo e permanece incomunicável. A escritura de
compra deve ser assinada pelo cônjuge para atestar a veracidade dos fatos.
Detalhe
importante e interessante: o bem é incomunicável, mas os frutos do bem não são!
Significa que os aluguéis provenientes dos imóveis dele ou dela serão de ambos.
Os dividendos de uma empresa que pertence a ele ou a ela serão de ambos.
Considera-se "fruto" um rendimento que, ao ser pago, não diminui o
valor do bem principal.
CUIDADO
Uma
amiga minha deixou de ganhar cerca de R$ 500 mil na separação
"amigável" que acaba de ser formalizada. Conto a história dela para
que o exemplo sirva de alerta aos casais que estão seguindo pelo mesmo caminho.
Ela
e o namorado, poucos meses antes do casamento, decidiram comprar um imóvel que
viria a ser a residência do casal. O imóvel seria o primeiro bem do patrimônio
comum constituído por ambos durante o casamento. Pelo menos foi isso que ela
pensou.
Premeditadamente
ou não, ele comprou, em nome dele, o apartamento financiado. Ele deu a entrada
para a compra do imóvel; ela assumiu outras despesas relativas ao casamento,
festa, vestido, enxoval, decoração do imóvel etc.
Na
cabeça dela o apartamento era dos dois, meio a meio, porque, embora estivesse
somente no nome dele, foi pago pelos dois na constância do casamento. Mas a
data da compra deu a ele uma vantagem que ele soube aproveitar muito bem na
hora da separação, mais de dez anos depois.
Ele
se intitulou dono de 70% do imóvel. Ela, preocupada em proteger a si mesma, a
filha e o relacionamento futuro de ambos, que será necessariamente mantido em
razão da filha, não optou por uma separação litigiosa e acabou concordando com
a proposta dele.
Faltou
conversar sobre o assunto antes, na hora da compra, antes do casamento. E
documentar a decisão. Esse pequeno cuidado teria evitado grandes dissabores e,
no caso dela, importante perda financeira. Que ela há de recuperar em uma nova
e mais experiente fase da vida.
Marcia Dessen - Planejadora financeira
pessoal, diretora do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais
Financeiros e autora de 'Finanças Pessoais: o que fazer com meu dinheiro'.
Fonte: coluna jornal FSP