Qual é a promessa das criptomoedas?
DeFi,
ou finanças descentralizadas, pode transformar o mercado.
Quem andava desanimado com as cotações das
criptomoedas pode comemorar.
Na sexta-feira (8), o preço de um bitcoin chegou a R$ 300 mil, um ether, a
R$ 20 mil, e um hathor, criptomoeda brasileira, chegou a R$ 4.
Claro que
a alta do dólar ajudou nessa valorização no
Brasil, mas o principal impulso foi global.
Muita gente olha para as criptomoedas e enxerga um potencial esquema de pirâmide em que os tubarões
antigos devoram as sardinhas recém-chegadas.
Várias partes do mercado são isso mesmo. No
entanto, a promessa das criptomoedas é mais ambiciosa, especialmente por conta
do conceito de DeFi, que significa “finanças descentralizadas”.
Trata-se de pensar a infraestrutura dos serviços
financeiros de uma forma que não dependa de agentes centralizados, ao menos no
início.
Uma boa analogia é pensar no que aconteceu nos anos
1990 com os serviços de voz sobre protocolo de internet (VoiP).
Naquela época,
os serviços de telecomunicações eram prestados por empresas que controlavam
vastos segmentos da infraestrutura que utilizavam. A chegada do VoiP mudou
tudo.
Empresa minúsculas, que não detinham nenhuma
infraestrutura, podiam de repente oferecer serviços de voz semelhantes aos da
telefonia.
Para isso, elas usavam a internet, infraestrutura aberta e
descentralizada. Em vez da voz seguir por canais já existentes, seguia por
múltiplas infraestruturas diferentes.
Para o usuário final a diferença era
pouca e, surpreendentemente, a qualidade da ligação podia ser até melhor.
A reação ao VoiP foi violenta. Entidades
governamentais rapidamente se mobilizaram para tentar coibir a prática. Houve
empresas fechadas e até pessoas processadas por prestação ilegal de
telecomunicações.
No entanto, progressivamente, as próprias empresas de telefonia
foram assimilando a internet.
Hoje, muitas chamadas de voz feitas pelas
próprias empresas de telecomunicação usam mais a internet do que
infraestruturas típicas da década de 1990.
Com as
finanças algo similar acontece. O dinheiro está se tornando cada vez mais um
conteúdo.
Criptomoedas e blockchains são uma infraestrutura parecida com a internet:
abertas, descentralizadas e ninguém precisa de permissão para utilizá-las.
Conseguem armazenar valor sem intermediários, na forma de informação consensual
e auditável universalmente.
A promessa do DeFi é justamente que uma de duas
coisas pode acontecer: essas novas tecnologias serão assimiladas pelo
próprio sistema financeiro, como a internet acabou sendo pelas empresas de
telecomunicação.
Ou, se isso não acontecer, um caminho se abrirá para uma série
de novas empresas financeiras que serão mais competitivas justamente por usarem
essa nova tecnologia, tornando o que existe hoje tão antiquado quanto as redes
dos anos 1990.
É difícil saber se essa promessa irá se
concretizar.
Mas há sinais da junção das finanças com cripto em vários
lugares. Bancos centrais emitindo suas próprias moedas digitais.
Parcerias entre bandeiras de cartão de crédito e blockchains.
E até um
relatório de um grande banco de investimento que aponta que hoje há mais de 200
milhões de usuários de cripto e que no final da década haverá ao menos 1
bilhão.
Quem viver verá.
RONALDO
LEMOS - Advogado,
diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.