Hospital dá conforto aos desenganados


Sentado num leito de hospital, um homem de 75 anos com esclerose lateral amiotrófica, ou doença de Lou Gehrig, precisa tomar uma decisão dificílima. Deve continuar lutando até que a doença o mate, dependendo de aparelhos para respirar, alimentar-se ou se mover? Ou escolher um dia e hora para que o respirador seja desligado e ele morra?

O homem, que pediu para não ser identificado, era paciente do Hospital for Special Care (Hospital de Atendimento Especial) em New Britain, Connecticut, um dos 400 hospitais de tratamento agudo de longo prazo nos Estados Unidos. Pacientes em estado crítico, alguns dos quais em coma ou sem reagir a estímulos, podem viver aqui durante meses ou até anos, mantidos vivos por respiradores e tubos alimentares.

Alguns acabam tendo alta, especialmente os que estão se recuperando de acidentes. "As pessoas não querem pensar em nós", disse o chefe de medicina do hospital, Paul Scalise. "Eu também não quero."

Mas mais especialistas e políticos terão que começar a pensar neles. O custo do atendimento médico agudo de longo prazo é substancial, chegando a US$ 26 bilhões (R$ 58 bi) ao ano nos Estados Unidos, e, de acordo com uma estimativa, o número de pacientes nesses hospitais mais que triplicou nos últimos dez anos, chegando hoje a 380 mil.

As razões disso são duas, segundo a médica Judith Nelson, especialista em medicina crítica no hospital Mount Sinai, em Nova York. A população está envelhecendo, elevando a incidência de doenças catastróficas, que levam os pacientes a esses hospitais. E os médicos estão conseguindo manter mais pessoas vivas em unidades de tratamento intensivo. O resultado é um aumento no número de pacientes altamente dependentes. O atendimento agudo de longo prazo é "onde você vai quando sobrevive, mas não se recupera", disse Nelson.

No entanto, este hospital no Connecticut não é um lugar de sofrimento implacável. O terreno do hospital é arborizado e verde; as janelas são grandes, deixando a luz do sol entrar. Recentemente dois pacientes com distrofia muscular, ambos em cadeira de rodas, se casaram no pátio do hospital.

"É surpreendente", comentou o executivo-chefe do hospital, John Votto. "A pessoa respira por aparelhos, não consegue se mexer, não consegue andar, não consegue respirar. Você ou eu diríamos 'meu Deus, sua qualidade de vida deve ser terrível'. Mas não é, realmente. Para falar a verdade, muitos dos pacientes são até felizes."

O caminho que leva a um hospital de atendimento agudo de longo prazo muitas vezes começa quando um médico sugere inserir um tubo na garganta de um paciente para que ele possa ser ligado a um respirador. "A partir desse momento, será uma intervenção após a outra. Respirador, tubo de alimentação permanente, acesso intravenoso permanente", comentou Judith Nelson.

O médico Christopher Cox, especialista em atendimento crítico na Escola de Medicina da Universidade Duke, na Carolina do Norte, e seus colegas constataram que metade dos pacientes internados nestes hospitais morrem em até um ano, e a maioria dos outros continua a precisar de atendimento de enfermeiros. Apenas 10% a 15% retornam à vida independente.

No hospital do Connecticut, cem pacientes, incluindo crianças, precisam de respiradores. De acordo com Scalise, 75 desses pacientes nunca vão poder viver sem estar ligados a um respirador.

Muitos desses pacientes talvez se encontrem num meio-termo assustador entre a morte e a vida que conheciam antes, mas é possível que alguns encontrem a felicidade. Os dois pacientes que se casaram recentemente, Chris Plum, 38, e Margaret Lavigne, 43, dividem um quarto, com assistência permanente, e trocam beijos de boa noite antes de serem acomodados em seus leitos separados. "Todo o mundo quer encontrar 'a pessoa de sua vida'", comentou Lavigne. "Eu não imaginava conhecê-la aqui."

Outros pacientes enfrentam escolhas mais difíceis. O homem com a doença de Lou Gehrig sabe que nunca mais poderá comer e que os poucos movimentos musculares que ainda lhe restam vão desaparecer em pouco tempo.

O dr. Scalise visita o paciente, que mostra com sinais e movimentos da boca que não quer mais viver assim. Mas Scalise quer se certificar de que o paciente tem certeza. Pede a um psicólogo, um psiquiatra e outro médico que conversem com ele sobre o que ele quer fazer.

O paciente espera uma semana, pensando em como será difícil deixar sua família, incluindo seus quatro filhos, dois ainda na faculdade. Então pede aos médicos que desliguem o respirador.

Às 20h de 17 de fevereiro, enfermeiras começaram a aplicar os sedativos. Na manhã seguinte, desligaram o respirador. A família do paciente estava à sua volta. O óbito se deu em 20 minutos. "Foi muito duro perdê-lo", disse sua mulher. "Acho que foi preciso muita coragem."

Gina Kolata – jornalista do New York Times

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