Estamos cansados de ouvir falar sobre os efeitos nocivos da corrupção. Quando a corrupção escancarou a porta da Petrobras e influenciou decisões de investimento, pagamos um custo gigantesco em termos de perda de produtividade, mas não é essa a causa direta da baixa qualidade dos serviços. Se de um dia para o outro erradicarmos a corrupção, vamos gastar menos recursos desnecessariamente e melhorar os serviços na margem, mas ainda assim não seria suficiente. Para provar este ponto, basta seguir o dia a dia do noticiário: nos últimos anos, corruptos e corruptores têm sido presos, mas não vemos uma melhora visível nos serviços públicos como consequência.
Também se fala muito sobre a falta de recursos. Diz-se que o Estado brasileiro não tem poder de arrecadar e financiar os serviços demandados pela população. É um argumento que faz sentido à primeira vista, mas não corresponde à realidade. O Estado brasileiro arrecada uma parcela significativa do PIB, mais do que os demais países de renda média. Somos de renda média, mas nossos coletores de impostos são de Primeiro Mundo!
Por que então um Estado que arrecada tão eficazmente fracassa em oferecer serviços de qualidade?
A resposta é que aquela arrecadação coletada de forma eficaz é mal gasta. O dinheiro não chega ao usuário final do serviço público. O Estado brasileiro se tornou uma máquina arrecadatória cujo objetivo é pagar aposentadorias e pensões polpudas para servidores idosos e não tão idosos assim.
A crise fiscal é mais evidente em alguns estados. No Rio Grande do Sul, para cada 100 servidores ativos (em tese, produzindo serviços), há 162 inativos (recebendo pensões e aposentadorias). Na metade dos estados, há mais de 80 aposentados para cada 100 servidores ativos.
O inchaço da folha de pagamentos de inativos não era inevitável. Foi o resultado de uma escolha que fizemos de presentear os servidores públicos com aposentadorias precoces –muitas vezes, eles se retiram do serviço público mais de dez anos mais cedo do que seus colegas do setor.
Existe ainda uma complicação extra. Diferentemente de qualquer outro país do mundo, os inativos do setor público no Brasil custam mais caro que os ativos. Isso acontece porque a aposentaria com rendimentos integrais não existe em quase lugar algum do mundo. A norma mais comum é repor aproximadamente dois terços da renda. Para o trabalhador médio americano, a taxa de reposição é de 60%. Assim, os trabalhadores que quiserem manter o mesmo padrão de consumo até o fim da vida são forçados a poupar parte de sua renda para sua aposentadoria.
Quanto mais os trabalhadores poupam voluntariamente, maior o desenvolvimento dos mercados de capitais e mais barato o custo de financiamento do investimento (por exemplo, para levar o esgoto às casas dos mais pobres).
O desafio da reforma da Previdência é mudar a trajetória das contas públicas. Para isso, é necessário que servidores públicos aposentem mais tarde e recebam benefícios menores. Assim, o Estado pode focar em oferecer serviços de saúde, segurança e educação em vez de gastar a fatia do leão de sua arrecadação com os inativos.
O resultado concreto de uma reforma bem-sucedida da Previdência é fortalecer o Estado. Sem ela, nossas escolas, hospitais e ruas somente piorarão. Quem quer melhores serviços públicos deve ser a favor da reforma da Previdência.
Fonte: coluna “porque?”, jornal FSP