A Bíblia já ensinava finanças muito antes dos MBAs
- Os
princípios que guiavam o dinheiro há milênios continuam válidos
- O desafio nunca foi saber, mas
praticar e criar o hábito
Sêneca
escreveu: "Não é o homem que tem pouco, mas o que deseja mais que é
pobre".
A frase, dita há quase 2.000 anos, poderia abrir qualquer manual
moderno de finanças comportamentais.
No fundo, o dilema humano pouco mudou: a
dificuldade não está em ganhar, mas em lidar com o que se tem e com o que se
deseja.
Ontem
eram sacas de trigo armazenadas em celeiros; hoje são planilhas, aplicativos e
fundos. Mudaram as ferramentas, mas os hábitos e os tropeços continuam
parecidos.
A história financeira da humanidade parece um disco arranhado: as
mesmas recomendações atravessam os séculos e, ainda assim, insistimos nas
mesmas armadilhas.
A
Bíblia, um dos textos mais antigos e influentes do mundo, fala de dinheiro sem
tecnicismos, mas com clareza de princípios.
Em vez de jargões, oferece imagens
que atravessam gerações. É curioso notar como orientações centrais da educação
financeira —poupar, evitar dívidas, diversificar, alinhar valores e escolhas—
já estavam registradas há milênios.
Em
Gênesis, José aconselha o faraó a reservar parte da colheita nos anos de
fartura para enfrentar a escassez posterior.
O raciocínio é simples: usar o
auge para amortecer o vale. É a lógica da reserva de emergência. Sete anos bons
custearam sete anos ruins e salvaram uma região inteira do colapso (Gênesis
41).
Em
Provérbios, a prudência aparece em frases diretas. "Quem toma emprestado é
escravo de quem empresta" alerta contra dívidas que aprisionam o futuro
(Provérbios 22:7).
"Os planos bem elaborados levam à fartura; o apressado
sempre acaba na miséria" lembra que investimentos consistentes exigem
método, tempo e serenidade (Provérbios 21:5).
Eclesiastes
sugere repartir o que se tem em várias partes, como prudência diante das
incertezas: "Reparte o que tens com sete, e ainda com oito, pois não sabes
que desgraça poderá cair sobre a terra" (Eclesiastes 11:2).
Essa ideia,
que pode se aplicar tanto à generosidade quanto à diversificação de esforços,
antecipa em séculos o princípio moderno de não concentrar todos os recursos em
um só lugar.
Nos
Evangelhos, Jesus aborda temas profundamente ligados
ao comportamento financeiro: valores, preocupações e planejamento.
"Onde
estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração" (Mateus 6:21) é uma
afirmação direta sobre prioridades. O uso do dinheiro revela, mais do que
palavras, o que realmente valorizamos.
Em
seguida, ele aconselha: "Portanto, não se preocupem com o amanhã, pois o
amanhã trará as suas próprias preocupações" (Mateus 6:34).
Não se trata de
negligenciar o futuro, mas de evitar que a ansiedade financeira paralise
decisões responsáveis no presente.
Por fim, ao dizer "quem de vocês,
querendo construir uma torre, primeiro não se assenta para calcular o
custo...?" (Lucas 14:28), Jesus destaca a importância de planejar antes de
agir, em uma das imagens mais claras de orçamento e preparo financeiro da literatura
antiga.
Se
atualizarmos o vocabulário, o espírito é o mesmo: poupar nos tempos bons,
evitar dívidas que acorrentam, diversificar para enfrentar tempestades, alinhar
escolhas com valores e planejar antes de agir.
A lição central dessas páginas
antigas continua atual. O tempo passou. As lições, não.
MICHAEL VIRIATO - professor e
assessor da Casa do Investidor e autor do blog De Grão em Grão, na Folha.